Ocupação artística Praça Kantuta Expandida fica até 4 de agosto na Vila Itororó, promovendo aproximação cultural do público com uma das maiores comunidades migrantes em São Paulo
Por Amanda Louise
Em São Paulo (SP)
A feira que toma a Praça Kantuta aos domingos na região do Pari, em São Paulo, é símbolo da comunidade boliviana na capital, com atrações musicais, gastronômicas e artesanais. E até o dia 4 de agosto a essência dessa feira será levada até o bairro da Bela Vista, tomando uma das casas da Vila Itororó com o projeto Praça Kantuta Expandida. Com visitação gratuita, o projeto consiste em uma ocupação artística que visa contribuir com a visibilidade da população boliviana na cidade, promovendo reflexões por meio de atividades interativas e exposições.
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Foi pensando nos bolivianos que vivem em São Paulo e na pouca aproximação da cultura dessa parcela da população, que o professor da FAU-USP (Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de São Paulo), Sérgio Régis Martins, se uniu à jornalista e pesquisadora Adriana Marcolini para idealizar e promover a instalação que teve início no último sábado (14), contando mais sobre o que é a Bolívia e as formas como eles vêm sendo retratados na imprensa escrita.
Um dos pontos da ocupação é justamente um clipping dessas narrativas. Reportagens são apresentadas ao longo de dois varais que cortam a casa ocupada, trazendo contrapontos das abordagens na mídia – inclusive com trabalhos realizados pelos bolivianos na capital paulista. “A grande maioria dos paulistanos não sabe nada, então esse panorama que a gente fez, chamado ‘painel da mídia’, mostra várias reportagens (…), é interessante fazer”, ressalta o professor Sérgio sobre a compilação das matérias.
Dados da SPTuris apontam que São Paulo tem pelo menos 60 mil bolivianos vivendo em situação regular, fazendo dela a segunda maior nacionalidade migrante na cidade – atrás apenas dos portugueses. Dados extraoficiais, no entanto, que englobam também pessoas ainda sem documentação, mostram cifras bem maiores.
Sementes para a diversidade
Como pontapé inicial da programação, na tarde do sábado (14), a boliviana e fundadora da Equipe de Base Warmis-Convergência das Culturas, Jobana Moya, e a brasileira bacharelada em Direito pela Universidade Presbiteriana Mackenzie, Carla Daniele, narraram histórias infantis dos dois povos para as crianças presentes no evento. Uma degustação de alfajores e das famosas salteñas bolivianas encerrou as atividades do primeiro dia.
Jobana levou uma lenda e um conto tradicional da Bolívia para partilhar com as crianças, dando continuidade à prática cultural que herdou de seus pais e avós. E ficou feliz com a resultado, ao notar a grande atenção com a qual as histórias eram acompanahdas.
“Durante a contação de histórias foi lindo ver as crianças curiosas e atentas durante a atividade e também aos objetos que tinha levado (instrumentos musicais, enfeites, tecidos). Senti que consegui deixar uma semente neles de abertura para a diversidade cultural e isso é muito gratificante, porque acredito que também ajuda na formação de pessoas solidárias, com uma visão ampla de mundo e que valorizam a diversidade neles e nos outros”.
Já Carla Daniele teve sua primeira experiência como contadora de histórias. Assim como Jobana, ela elogiou o evento e vê os pequenos como sementinhas que podem ser regadas com informação e distribuir o conhecimento entre pais, avós e tios.
“Além de concordar que os brasileiros devem saber e entender mais sobre a vida dos imigrantes que aqui chegam, é um meio de também deixar as crianças imigrantes mais confortáveis ao ouvir histórias sobre a sua cultura de origem. Acho que mais trabalhos como estes devem ser feitos”.
Oscilando entre o crítico e o poético, as atividades que serão realizadas aos sábados abrem espaço para o aprendizado dos costumes do país homenageado e contribuem com a integração das duas nações. Uma experiência que terá continuidade em ações como a projeção fotográfica da comunidade boliviana de São Paulo, do sociólogo e fotojornalista Eduardo Schwartzberg; com o quebra-cabeça que brinca com a sonoridade das palavras das línguas oficiais dos dois países; e apreciando a apresentação musical das Lakitas Sinchi Warmis, grupo formado por mulheres migrantes de diferentes origens e brasileiras filhas de migrantes (veja a programação ao final do texto).
Vila Cultural
Construída em meados dos anos 1920, a Vila Itororó serviu como moradia por longos anos. Abandonada e em processo de deterioração, desde os anos 70 a implementação de um centro cultural no local vinha sendo debatida por conta das pessoas que viviam ali. Foi desapropriada para fins culturais, hoje é reconhecida como patrimônio histórico e de utilidade pública e passa por um processo de reparos por intermédio da Lei Rouanet.
A casa 8 foi reformada pelo projeto Goethe na Vila, parceria firmada entre a prefeitura de São Paulo e o Instituto Goethe, e agora é espaço para atividades culturais. A ocupação Praça Kantuta Expandida acontece no âmbito desse projeto.
Adriana Marcolini frisa que as visitas às quintas, sextas e sábados são guiadas por um funcionário da Secretaria Municipal de Cultura. O tour se encerra na casa 8, onde os visitantes podem aproveitar para bater um papo com os idealizadores da ocupação.
A mostra sobre a Kantuta não é o primeiro evento relacionado com uma comunidade migrante a acontecer na Vila Itororó. Em 2016, o local serviu de cenário para a peça Cidade Vodu, que contava a saga dos haitianos no país natal e sua migração para o Brasil.
Programação
14 de julho
15h-17h – Contando histórias infantis
Narração de histórias infantis para crianças do Brasil e da Bolívia pelas contadoras de histórias Jobana Moya (Bolívia) e Carla Daniele (Brasil). Serão narradas duas histórias bolivianas e duas brasileiras. Um lanche brasileiro-boliviano será servido para as crianças após o evento.
21 de julho
10h-13h – Oficina: Introdução ao recorte a laser e impressão 3D
Oficina introdutória ao recorte a laser e impressão 3D, a ser ministrada por Igor Vac, responsável pelo FabLab da Vila Itororó. A Kantuta, flor do altiplano que representa a Bolívia, será utilizada nas amostragens técnicas.
Para esta oficina será necessário fazer inscrição prévia (máximo de 15 participantes). Interessados devem enviar e-mail para fablab.itororó@itsbrasil.org.br
15h-16h – Passeio fotográfico pela comunidade boliviana de São Paulo
O sociólogo e fotojornalista Eduardo Schwartzberg fará uma projeção comentada de seu trabalho fotográfico sobre a comunidade boliviana de São Paulo, fruto de pesquisa de mestrado concluída na USP Leste.
16h-17h – Quebra-cabeça de palavras
O quebra-cabeça linguístico começará com a redação, em uma lousa fixada em um tripé, de uma lista de palavras aimarás, quéchuas e espanholas – os três principais idiomas da Bolívia – e da língua portuguesa. Os participantes receberão folhas de papel sulfite e caneta esferográfica. Serão convidados a escreverem as palavras que mais gostarem e a sugerir novas. Em seguida, vão passar adiante sua própria lista. Ao final, dois deles lerão as listas na frente de todos. Um dos autores do projeto escreverá na lousa as palavras escolhidas, com seus respectivos significados.
4 de agosto
15h30-17h30 – Lakitas Sinchi Warmis
A ocupação será encerrada com uma apresentação do Lakitas Sinchi Warmis, grupo musical andino formado por mulheres imigrantes e filhas de imigrantes. Em seguida serão servidos quitutes bolivianos.
Serviço:
Ocupação Cultural Praça Kantuta Expandida
Data: de 14 de julho a 4 de agosto (vide horários na programação)
Local: Vila Itororó – Rua Pedroso, 238 – Bela Vista, São Paulo (próxima ao metrô São Joaquim)
Entrada: gratuita
Recomendações: chegar 10 minutos antes do evento e uso de sapato fechado
Ficha técnica
Concepção e coordenação: Sérgio Régis Martins
Concepção e assistência de produção: Adriana Marcolini
Narração de histórias infantis (Bolívia): Jobana Moya
Narração de histórias infantis (Brasil): Carla Daniele de Oliveira
Coordenadora e responsável pelo grupo musical Lakitas Sinchi Warmis: Mariela Loreto Pizarro Sippa
Projeção comentada de fotos: Ismael Eduardo Schwartzberg Arteaga
Instrutor oficina FabLab: Igor Vac
[…] Por Amanda Louise, no Migramundo […]