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terça-feira, abril 30, 2024

Assassinato de artista venezuelana no Amazonas mobiliza migrantes e instituições

Caso foi lembrado como exemplo dos riscos diários vivenciados por mulheres migrantes; coletivos e instituições expressam condolências e cobram providências

Atualizado às 10h30 de 9.jan.2024

Por onde passava, sobretudo de bicicleta, a artista venezuelana Julieta Inés Hernández, de 38 anos, levava riso e alegria por meio de sua personagem, a palhaça Miss Jujuba. Uma trajetória que foi abreviada por um crime cometido no final de 2023 e que só veio à tona nos primeiros dias de 2024. E o fato tem unido a comunidade venezuelana no Brasil.

Nascida em Ciudad Guayana, Julieta Inés Hernández residia desde 2015 no Brasil e integrava o coletivo de artistas e cicloviajantes “Pé Vermêi”. Vivendo como nômade, ela pedalava por diversos estados do país fazendo apresentações circenses. Por meio das redes sociais é possível ver os locais por onde passou, que incluem estados como Pernambuco, Rio de Janeiro, Pará, Goiás e Espírito Santo.

Além de artista circense, Miss Jujuba também trabalhava como bonequeira, confeccionando réplicas de pessoas em miniatura.

O assassinato de Julieta revoltou a comunidade migrante venezuelana no Brasil, que exigiu providências por parte das autoridades. As manifestações também lembraram que o crime que tirou a vida da artista é ilustrativo dos riscos vividos no cotidiano por mulheres e pessoas migrantes.

O crime

No dia 22 de dezembro, Julieta partiu de Presidente Figueiredo, no Amazonas, em direção à Venezuela, usando sua bicicleta. O último contato com o coletivo Pé Vermêi foi já no começo da madrugada de 23 de dezembro. A próxima parada prevista era na cidade de Rorainópolis, já no sul de Roraima.

Diante da falta de informações nos dias seguintes, um Boletim de Ocorrência online sobre o desaparecimento de Julieta foi registrado na quarta-feira (03), segundo o jornal Folha de Boa Vista. Também foi feito um registro no sistema de Sinal Desaparecido da Polícia Rodoviária Federal (PRF). Além disso, as demais integrantes do coletivo Pé Vermêi ainda fizeram apelos nas redes sociais em busca do paradeiro da amiga.

Segundo investigações da Polícia Civil, Julieta teria sido morta já no próprio dia 23 de dezembro. O corpo da artista foi encontrado somente na última sexta-feira (5), com a ajuda de cães farejadores, nas proximidades do município amazonense, assim como parte de sua bicicleta.

A identificação foi realizada por meio de necropapiloscopia, realizado em conjunto por peritos do Instituto Médico Legal (IML) e do Instituto de Identificação do Amazonas.

Um casal foi preso suspeito de cometer o crime. De acordo com informações do portal G1, ambos deram declarações contraditórias à Polícia Civil. A mulher disse que matou a artista após uma crise de ciúmes. Isso porque ela teria prenunciado o companheiro estuprando a vítima depois de roubar os pertences dela. Já o homem afirmou que Julieta e ele usavam drogas quando a companheira ficou com ciúme, jogou álcool nos dois e ateou fogo.

O casal vai responder por homicídio qualificado e ocultação de cadáver.

Repercussão: comoção e revolta

Em nota divulgada nas redes sociais, a Associação Venezuela Global exigiu que as autoridades competentes conduzam uma investigação minuciosa para determinar os responsáveis pelo crime.

“A perda de Julieta não é apenas irreparável, mas também é um lembrete sobre os perigos enfrentados por mulheres, meninas e adolescentes migrantes e refugiadas durante seus procesos de deslocamento no Brasil e outras partes do mundo. Esse trágico episódio de violência é uma alerta aos Estados, para tomar medidas mais enérgicas para garantir a proteção de pessoas migrantes e refugiadas em trânsito por seus territórios, e com enfoque de gênero”.

A artista circence e cicloativista venezuelana Julieta Hernández, conhecida como Miss Jujuba, durante apresentação. (Foto: Divulgação/Redes Sociais)

A Coordenação dos Povos Originários Venezuelanos no Brasil pediu que a sociedade brasileira como um todo se mobilize diante do episódio. E que a memória de Julieta seja inspiradora dessa mudança. “É imperativo que a sociedade, em seu conjunto, se una para repudiar toda e qualquer forma de violência de gênero e trabalhar incansavelmente para criar um ambiente mais justo e seguro para todas as mulheres”.

“Nossa total solidariedade à família de Julieta Hernández, mulher migrante venezuelana, artista, trabalhadora, uma filha que a mãe foi ceifada de um reencontro. Que barbaridade, que tristeza ao ponto que se chega o ser humano. Nossa oração e gratidão pelo bem que você semeou na terra, como Julieta ou como palhaça Jujuba”, expressou a Pastoral do Migrante do Acre, também por meio das redes sociais.

A Fundação Nacional de Artes (Funarte) também divulgou nota em que lamenta a morte da artista. A entidade ainda disse estar acompanhando os desdobramentos das investigações junto ao governo amazonense e prestandp apoio à família.

“É com tristeza e indignação que recebemos a notícia da morte da bonequeira, palhaça, artista e cicloviajante, Julieta Hernandez. Com toda alegria e irreverência, Julieta viajava com sua arte conduzindo crianças e adultos ao mundo circense e por isso, sempre será lembrada. Inquieta em relação à desigualdade de gênero, sua busca por equidade é uma inspiração para todas nós”, declara a presidente da Fundação, Maria Marighella.

Outra entidade que se manifestou diante do ocorrido foi o ACNUR (Alto Comissariado da ONU para Refugiados). “Assim como muitas mulheres refugiadas e migrantes, Julieta levava sua arte, cultura e conhecimentos a diferentes comunidades no Brasil. Nossos sentimentos estão com amigos e familiares de Julieta, especialmente aqueles que esperavam por seu retorno seguro ao país de origem”.

Ao agradecer os seguidores pela mobilização em torno de Julieta, o coletivo Pé Verméi foi direto nas respostas a comentários sobre o porquê da artista estar viajando sozinha quando foi assassinada.

“Quero agradecer a essa rede todinha que está se mobilizando, foi graças a todo esse movimento coletivo que ela foi encontrada. E quero também dizer pra cada pessoa que está se coçando pra comentar “mas também mulher viajando sozinha” que desejo que vcs engulam esse tipo de comentário bosta e se engasguem com ele. Não temos condições de estar aqui respondendo as mensagens, apesar de querermos muito dar um abraço e cada pessoa querida que a ama. Mas ainda temos muito o que fazer por aqui”.

Próximas mobilizações

Além das manifestações de pesar, o assassinato de Julieta Hernández tem motivado manifestações presenciais em diferentes locais do Brasil. A primeira delas ocorreu em Boa Vista, já no último domingo (7).

Na sexta-feira (12), há dois atos previstos para Florianópolis e São Paulo. Na capital catarinense, será promovida uma bicicletada entre a pista de skate da Trindade e o Largo da Alfândega, às 19h. Para quem estiver em São Paulo, o ato terá início às 18h30 com concentração no vão livre do MASP (Museu de Arte de São Paulo) e saída prevista para as 20h.

Com informações de Agência Brasil, G1 e Folha de Boa Vista

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