Por Carolina Guagliano
Independentemente da localização geográfica, a realidade encontrada em campos de refugiados é a mesma. Com condições precárias de saúde e higiene, impossibilidade de um isolamento social, são ambiente perfeito para uma disseminação veloz do novo coronavírus, com potencial explosivo para vítimas fatais.
No norte da França, faltam comida e acomodações; na Grécia, facilidades para migrantes já foram fechadas; em Gaza, 70% dos leitos de UTI já estão ocupados; e na África, campos de dezenas de milhares de migrantes começam a ter seus primeiros casos suspeitos.
Para Jan Egeland, secretário-geral do Conselho Norueguês de Refugiados, a ameaça é grande.
“Quando o vírus atingir assentamentos superlotados em lugares como Irã, Bangladesh, Afeganistão e Grécia, as consequências serão devastadoras”.
Europa
Na França, voluntários também mostram preocupação com a situação enfrentada nos campos do norte do país. No começo de abril, autoridades locais começaram a deslocar pessoas de campos informais em Calais e Dunkirk para centros de acomodação. Mas as ONGs afirmam que a capacidade desses centros é baixa, cerca de 400 vagas para 1.500 moradores de campos informais da região, onde tem ocorrido um rápido alastro do vírus.
A Organização Care4Calais chama atenção para a velocidade de contaminação nesse cenário. Segundo a Organização, em três dias, o número de pessoas apresentando sintomas de COVID-19 passou de dois para nove. Segundo a organização Utopia 56, em campos informais, 1.200 pessoas compartilham um único ponto de água a uma hora e meia de distância de alguns acampamentos.
Além disso, Clare Moseley, fundadora da Care4Calais, afirma que não é possível realizar medidas de precaução nos campos como o distanciamento social — e, por isso, a doença pode se alastrar rapidamente, contaminando metade dessa população em quatro semanas.
De acordo com grupos de ajuda, o Governo francês tem limitado o fornecimento de água a assentamentos informais e apenas mandado pão e queijo diariamente, o que configura a única alimentação do dia, uma vez que imigrantes não regularizados não podem ir até o mercado por conta das regras da quarentena em vigor.
O cenário é ainda mais preocupante quando pensamos que “os refugiados que vivem no norte da França já enfraqueceram a imunidade contra o estresse crônico e as condições deploráveis em que são forçados a viver”, como relatado por Sarah Story, cofundadora e diretora da Refugee Info Bus.
Já na Grécia, após 23 imigrantes testarem positivo para o novo coronavírus, autoridades gregas colocaram Ritsona, localizado a nordeste de Atenas, em quarentena por 14 dias. Ritsona abriga 2.700 pessoas e é uma das 30 acomodações gregas, nas quais vivem mais de 25.000 pessoas.
Também nas ilhas gregas está localizado Moria, o maior campo de refugiados da Europa atualmente, com capacidade para 3.000 imigrantes — mas está servindo de moradia para 20.000.
Preocupados com o que poderia acontecer com esses mais de 40.000 requerentes de asilo em campos de refugiados superlotados no país, o governo impôs o confinamento geral para estes locais quatro dias antes da medida entrar em vigor para o resto do país. Organizações humanitárias descrevem estas instalações como “bombas-relógio de saúde”.
África
Com a chegada da COVID-19 no continente africano, muitas agências internacionais também demonstraram sua preocupação.
Vale lembrar que a África abriga quatro dos seis maiores campos de refugiados do mundo — em Uganda, Quênia, Tanzânia e Etiópia — e mais de 25,2 milhões de refugiados e pessoas deslocadas internamente.
Os campos de Kakuma e Dadaab no Quênia acomodam juntos 411 mil refugiados, respectivamente 194.000 e 217.000, o que torna impossível o isolamento social.
Em resposta ao COVID-19 o movimento entre Kakuma, Dadaab e Nairóbi, capital do Quênia, foi suspenso. Atualmente, quatro pessoas de Kakuma estão isoladas como medida de prevenção a uma possível exposição.
Oriente Médio
O medo e a realidade enfrentados no oriente Médio são os mesmos. No Iraque, grupos humanitários dizem temer o que pode acontecer caso o COVID-19 chegue aos 1,5 milhão de civis deslocados pela guerra contra o Estado Islâmico, os quais vivem apertados e usam a única água limpa que tem para cozinhar.
No Iêmen, a grande maioria dos 3,6 milhões de deslocados vivem em campos improvisados com instalações escassas ou em bairros superlotados.
Além de Gaza sofrer diariamente com apagões e com falta de acesso à água potável, a região conta com apenas 60 camas de terapia intensiva, das quais 70% estão em uso.
No Líbano, os refugiados sírios são inelegíveis para os serviços de saúde do governo, o que significa que estes estariam desprotegidos em um surto de COVID-19.
Segundo Hedinn Halldorsson, representante da OMS em Gaziantep, Turquia, a OMS está “extremamente preocupada” com o impacto que o Coronavírus terá nas populações deslocadas na fronteira da Síria com a Turquia. Por conta da situação em que vivem, estas pessoas são “vulneráveis a infecções respiratórias, condições de vida superlotadas, estresse físico e mental e privação devido à falta de moradia, comida e água limpa”.
O que dizem as agências
A Agência da ONU para Refugiados (ACNUR), juntamente com outras agências das Nações Unidas e organizações parceiras, afirmam acompanhar de perto a situação da pandemia da COVID-19. Também informam trabalhos diários para mitigar os possíveis impactos do coronavírus nos refugiados, pessoas forçadas a se deslocar e comunidades que as acolhem.
Entre as ações divulgadas pelo ACNUR junto a campos de refugiados estão campanhas de conscientização e de informação em locais como Uganda e Jordânia, além da distribuição de sabão em Cox’s Bazar (Bangladesh) — o local é considerado atualmente o maior campo de refugiados do mundo.
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