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quinta-feira, maio 2, 2024

De bicicletadas a sarau, atos por Julieta se espalham pelo mundo e cobram mudanças

Ao menos 167 cidades no Brasil e em outros países registraram atos em homenagem à artista e cicloativista venezuelana, morta no Amazonas

A dor e a revolta geradas pelo assassinato da venezuelana Julieta Hernandez no Amazonas desencadearam uma série de ações no Brasil e em outros países em homenagem à artista.

Ao menos 167 cidades no Brasil e no exterior registraram manifestações por Julieta na última sexta-feira (12). Elas foram organizadas tanto por cicloativistas quanto por coletivos diversos, incluindo migrantes.

Mesmo sob uma chuva forte, a homenagem em São Paulo ocupou o vão livre do MASP, ponto tradicional de manifestações na capital paulista. No ato, chamado de “Bicicletada Julieta Presente”, foram cantadas músicas em homenagem à artista e distribuídos narizes de palhaço em referência a uma de suas atividades.

“Essa manifestação é para dizer que a gente é livre e que nós queremos vivas umas às outras. Parem de nos matar. Nós temos o direito de andar como quisermos, para onde quisermos, sem sermos mortas”, disse a também cicloviajante, artista de rua, malabarista e palhaça, Kimberlin Portes, à Agência Brasil.

Projeção global

Em Florianópolis, uma bicicletada foi da pista de skate da Trindade ao Largo da Alfândega, mobilizando centenas de pessoas. Entre elas estava a jornalista e produtora cultural venezuelana Ani Castrellón Castillo, que destacou o caráter internacional que a mobilização assumiu.

“Estamos abaladas com a partida da “Jujuba”, um ser humano que saiu do seu país, Venezuela, como muitas de nós, acreditando na cultura e nas artes como ferramentas poderosas para mudar os flagelos da nossa sociedade. Foram quase 170 atos produzidos coletivamente, por mulheres, na América Latina e na Europa. E obviamente continuarão acontecendo em prol de levar a mensagem onde for possível”, disse ela ao MigraMundo.

Ani comentou ainda que está sendo articulado um projeto de lei, inicialmente em âmbito estadual, que ampare mulheres, artistas cicloviajantes em nome de Julieta Hernandez. “Não descansaremos até conseguir o que merecemos”, acrescenta ela.

Também na sexta-feira, Julieta foi velada e sepultada na cidade de Puerto Ordaz, no estado venezuelano de Bolívar. O local seria o destino final da viagem de bicicleta da artista, que foi interrompida pelo crime.

Além das bicicletadas, um sarau em homenagem a Julieta foi promovido no Rio de Janeiro, no último sábado (13). Há a expectativa de novos atos para os próximos dias.

Exemplo de uma triste realidade

O assassinato de Julieta Hernández representa a violência que as mulheres sofrem no Brasil, realidade também, vivenciada pelas venezuelanas que estão fora do país. Segundo dados divulgados em 2023 pelo Monitor da Violência e do Fórum Brasileiro de Segurança Pública (FBSP), ocorre um feminicídio a cada 6 horas no país. Além disso, 1 em cada 3 brasileiras com mais de 16 anos já sofreu violência física e sexual por pessoas próximas.

Já de acordo com o Monitor de Feminicídios feito pela Organização Venezuelana Utópica, de janeiro a novembro de 2023, 14 mulheres foram assassinadas, sendo 8 na Colômbia e 3 no Equador; Peru, México e Trindad e Tobago registraram uma ocorrência cada.

“A perda de Julieta não é apenas irreparável, mas também é um lembrete sobre os perigos enfrentados por mulheres, meninas e adolescentes migrantes e refugiadas durante seus procesos de deslocamento no Brasil e outras partes do mundo. Esse trágico episódio de violência é uma alerta aos Estados, para tomar medidas mais enérgicas para garantir a proteção de pessoas migrantes e refugiadas em trânsito por seus territórios, e com enfoque de gênero”, disse a Associação Venezuela Global, entidade que reúne venezuelanos no Brasil, em nota sobre o caso.

A Coordenação dos Povos Originários Venezuelanos no Brasil pediu que a sociedade brasileira como um todo se mobilize diante do episódio. E que a memória de Julieta seja inspiradora dessa mudança. “É imperativo que a sociedade, em seu conjunto, se una para repudiar toda e qualquer forma de violência de gênero e trabalhar incansavelmente para criar um ambiente mais justo e seguro para todas as mulheres”.

“#JulietaPresente e um movimento mundial que nasceu o dia que acabaram com a vida e os sonhos da nossa artista, e acenderam a chama de milhões de mulheres que já estão trabalhando organizadamente pelos nossos direitos, paz e liberdade. Não aceitamos mais violências nem mais mortes, estamos juntas e fortes”, reforçou Ani.

A artista circence e cicloativista venezuelana Julieta Hernández, ao lado da bicicleta com a qual viajou por todo o Brasil. (Foto: Divulgação/Redes Sociais)

Entenda o crime

No dia 22 de dezembro, Julieta partiu de Presidente Figueiredo, no Amazonas, em direção à Venezuela, usando sua bicicleta. O último contato com o coletivo Pé Vermêi, do qual fazia parte, foi já no começo da madrugada de 23 de dezembro. A próxima parada prevista era na cidade de Rorainópolis, já no sul de Roraima.

Diante da falta de informações nos dias seguintes, um Boletim de Ocorrência online sobre o desaparecimento de Julieta foi registrado na quarta-feira (03). Também foi feito um registro no sistema de Sinal Desaparecido da Polícia Rodoviária Federal (PRF). Além disso, as demais integrantes do coletivo Pé Vermêi ainda fizeram apelos nas redes sociais em busca do paradeiro da amiga.

Segundo investigações da Polícia Civil, Julieta teria sido morta já no próprio dia 23 de dezembro. O corpo da artista foi encontrado somente na última sexta-feira (5), com a ajuda de cães farejadores, nas proximidades do município amazonense, assim como parte de sua bicicleta.

Um casal foi preso e confessou o crime, que teria sido motivado inicialmente por reação ao roubo de celular e de sua bicicleta, mas que também incluiu estupro. A dupla vai responder por latrocínio (roubo seguido de morte), ocultação de cadáver e estupro e está detida em presídios em Manaus (AM).

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