Em uma coluna publicada no jornal O Estado de S.Paulo em 9 de janeiro deste ano, o escritor e jornalista Gilles Lapouge se referiu à época atual como “era da pós-cerca de arame farpado” ou “era do muro“. Infelizmente, considerando apenas os exemplos abaixo, ele tem argumentos e fatos de sobra para embasar a afirmação.
Parece irônico, mas o mesmo mundo que festejou a queda do Muro de Berlim, em 9 novembro de 1989, cada vez mais se fecha atrás de “cortinas de concreto” – enfeitadas com arame farpado, cercas elétricas e guardadas por militares armados até os dentes. Em comum, todas elas têm como um dos objetivos principais coibir a imigração irregular.
O mais novo membro do clube vem da Grécia, que está construindo uma barreira de 12 km ao longo da fronteira terrestre com a Turquia – local considerado porta de entrada de estrangeiros ilegais para a Europa. A obra, chamada de Operação Escudo, faz parte de um projeto ainda maior, a Xemios Zeus, que inclui a expulsão de todos os imigrantes irregulares no país. Além do muro, a Grécia também adotou a polêmica medida de criar centros de detenção destinados somente para esse grupo, que vem levando parte da culpa pela crise aguda que o país enfrenta nos últimos anos.
Organizações humanitárias dentro e fora da Europa temem que o muro ajude a criar uma crise humanitária na região, em especial devido ao aumento de refugiados provocado pela guerra civil na Síria, que também tem a Turquia como país vizinho.
Tanto as prisões quanto o muro são alvo de críticas dentro e fora da Grécia. A ONG Stop Evros Wall, em referência ao rio que serve de fronteira entre gregos e turcos, é uma dessas vozes discordantes. “O que farão quando atravessarem pela Bulgária? Vão continuar a construir a muralha e torno de toda a Europa?”, questiona Panaiotis Samuridis, integrante da ONG, em entrevista ao jornal Folha de S.Paulo.
As barreiras de concreto anti-imigrantes não se restringem à Europa. Os EUA, por exemplo, entre os trechos fortemente guardados por patrulhas ao longo da fronteira com o México, conta com um chamado de Fronteira de Aço – em referência às com placas vindas do front norte-americano no Vietnã e usadas no muro –, entre San Diego e Tijuana. Israel também levantou o seu contra o povo palestino– com direito a avanço sobre terras da Cisjordânia; a China, na fronteira com Coreia do Norte; a Arábia Saudita, junto ao Iêmen…
E esses muros, de fato funcionam? A Muralha da China, mais famosa barreira feita pelo homem e ponto turístico do país, fracassou em seu intuito de barrar as invasões vindas do norte; mexicanos conseguem entrar nos EUA, mesmo com topo o aparato policial armado; e mesmo o Muro de Berlim, que contava ainda com obstáculos adicionais em cada um dos lados e era fortemente vigiado, também era burlado.
Logo, o muro grego pouco adiantará no seu objetivo imediato e público de coibir os imigrantes no país. Mas fica o efeito simbólico, com a mensagem implícita de “forasteiro, você não é bem vindo aqui”. Parece frase de filme norte-americano de faroeste, mas mostra bem o tamanho do retrocesso humanitário, social e político que a situação representa: em vez de iniciativas globais e abrangentes para resolver questões ligadas a imigrantes e refugiados, os governos preferem se esconder atrás de muros.
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