Maioria dos países da UE declaram apoio ao líder da oposição no Parlamento venezuelano; mídia mostra um Maduro incompetente, que se apega em Chávez, e uma Venezuela faminta sob a mira dos EUA, Rússia e China.
Por Victória Brotto
De
Estrasburgo (França)
Desde que a situação na Venezuela se agravou, com o descontentamento da população e a auto-proclamação de Juan Guaidó como presidente interino, a Europa, sob a voz de seus líderes de Estado, bateu o martelo à favor do opositor, mas com cautela.
Tanto nas falas dos chefes de governo como de Estado e na imprensa, o embate político entre Guaidó e Maduro ganhou muito mais destaque do que os deslocamentos de venezuelanos para países vizinhos, assim como a pressão feita pelos EUA, Europa e Rússia sobre um país em um grave caos social, político e econômico.
O número atual de refugiados e migrantes da Venezuela em todo o mundo é de 3,4 milhões, segundo a Agência da ONU para Refugiados (ACNUR) e a Organização Internacional para as Migrações (OIM). A Colômbia abriga o maior número (mais de 1,1 milhão), seguido por Peru (506 mil), Chile (288 mil), Equador (221 mil) e Argentina (130 mil). O Brasil é o sexto da lista, com 96 mil.
Até o momento, as fronteiras venezuelanas com Colômbia e Brasil seguem fechadas – quem consegue passar para o outro lado o fez por meio de rotas alternativas, que envolvem maiores riscos do que os caminhos oficiais.
Posição dos líderes europeus
O presidente francês, Emmanuel Macron, timoneiro da União Europeia, anunciou, no Twitter, o seu apoio a Guaidó, reconhecendo-o como presidente interino ”que irá guiar a Venezuela para um novo processo eleitoral:”
Ele, Angela Merkel (Alemanha) e Pedro Sánchez (Espanha) tentam, assim, dar sinal aos membros do bloco europeu de que a Europa deve estar com o jovem político que faz ferrenha oposição a Nicolas Maduro, que, para eles, já está tempo demais no poder.
Assim, 19 dos 28 países membros já se pronunciaram a favor de Guaidó. O primeiro ministro da Espanha, Pedro Sanchez, afirmou que a Venezuela “deve ser dona do seu próprio destino.” Theresa May, primeira-ministra do Reino Unido, através de seu porta-voz, afirmou que o país deve dar passos à frente e cogitou o uso de sanções, sem especificar quais.
Mas há discordâncias, mais fortes ou menos fortes: como é o caso de Grécia e Irlanda, que defendem novas eleições mas param por ai, sem legitimar Guaidó. A Itália, dividida, ainda não tomou partido. A única voz ouvida foi a de alguns líderes do partido de centro, Cinco Estrelas, que afirmaram que ”a UE não pode dizer à Itália o que deve ou não ser feito .”
Já os russos, no Kremlin, veem com maus olhos o posicionamento da Europa, principalmente quando ela deu um ultimato a Maduro para convocar novas eleições. Em declaração oficial, o Kremlin falou em ”ingerência dos europeus”. “Nós estamos vendo tentativas de legitimar a usurpação do poder como uma ingerência direta e indireta nos assuntos internos da Venezuela”, afirmou o porta voz do Kremlin, Dmitri Peskov à imprensa. Vladimir Putin têm dado apoio militar, econômico e político a Nicolas Maduro.
Cobertura midiática
Para o sempre ponderado Correio Internacional (uma espécie de Revista Piauí dos franceses), Maduro é o homem em cima de uma torre de petróleo, com um cofre de dinheiro nas costas e com um mini Hugo Chávez nas mãos enquanto aviões europeus, norte-americanos e russos o circundam.
É essa a capa da edição de fevereiro de umas das revistas mais influentes da Europa, em termos de geopolítica. ”Venezuela, a hora da verdade”, anuncia a capa. ”Depois de vinte anos de chavismo, a crise do regime ficou conhecida por todo o planeta. Cada potência mundial teve que escolher um lado, depois que o jovem líder do Parlamento, Juan Guaidó, desafiou abertamente o presidente Nicolás Maduro.”
Com seis artigos de páginas inteiras, a revista mostra uma Venezuela submergida em um descontentamento popular por causa da precariedade social vivida, um líder extremamente desgastado e ”incompetente”, uma revolução bolivariana que já se desgastou de tanto ser evocada por Maduro e um líder jovem, que traz esperança a um povo cansado e com fome.
A influência dos Estados Unidos, os investimentos bilionários da China e a vontade de alargar o império dos russos não passam fora do scanner da revista, que publicou artigos de jornalistas dos principais jornais da Venezuela e do mundo.
O jornal italiano Corriere de la Siera enfatizou o bloqueio do governo à ajuda humanitária e a ida de Guaidó para a Colômbia, país com o qual Maduro rompeu relações diplomáticas. O britânico The Independent mostra o caos social no país, com repressão do governo, bloqueio de fronteiras e aumento do número de refugiados venezuelanos.
Já o jornal espanhol El País falou do apoio do presidente brasileiro Jair Bolsonaro a Guaidó: ”Bolsonaro dá a Guaidó apoio político com recepção informal em Brasília.”
Europeus no Conselho de Seguranca
Os países europeus membros do Conselho de Segurança pediram na tarde desta quinta-feira um escrutínio presidencial na Venezuela para resolver a crise política. Reino Unido, Alemanha, Belgica, França e Polônia recusaram a sugestão norte-americana para intervir militarmente no país evocada face à repressão violenta do governo de Maduro.
”Precisamos evitar uma intervenção militar”, afirmou a porta-voz da diplomata chefe da União Europeia, Federica Mogherini. ”Os europeus se opoem firmemente à repressão, mas também são igualmente engajados a procurar uma solução política”, acrescentou uma fonte diplomática ao jornal francês Le Figaro.
Para o antigo deputado europeu, Jean-Luc Mélenchon, ”não se deve reconhecer um aventureiro que se auto-proclama presidente da República”. Mélenchon concorreu duas vezes à presidência da República francesa, onde teve 19% dos votos. Um dos ícones da esquerda popular do país, em 2016, ele criou o movimento La France Insoumise.
Outra figura politica que foi contra o que foi dito por seu líder de Estado foi a ministra de Assuntos Estrangeiros do Reino Unido, Emily Thornberry. Thornberry afirmou que ” é errado reconhecer Juan Guaidó como presidente da Venezuela”. Para ela, impor uma ruptura não é o que ela vê de mais correto a ser feito, mas sim ajudar a Venezuela a ser realista e prática para assegurar novas eleições.