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segunda-feira, dezembro 23, 2024

É impossível pensar São Paulo sem os fluxos migratórios, diz nova secretária municipal de Direitos Humanos

Patricia Bezerra promete manter diálogo aberto com a sociedade civil e a manter e aperfeiçoar ações desenvolvidas na gestão Haddad. Ela anuncia ainda que a atual CPMig vai mudar seu nome para Coordenação de Políticas para Imigrantes e Refugiados

Por Rodrigo Borges Delfim

A vereadora reeleita Patricia Bezerra (PSDB-SP), nova secretária de Direitos Humanos e Cidadania de São Paulo, promete dar continuidade e aperfeiçoar programas iniciados na gestão Haddad voltados às comunidades migrantes na cidade.

“Como muitos outros polos urbanos, a cidade de São Paulo atrai uma considerável população de migrantes e refugiados. Chega a ser impossível pensar a cidade sem a forte influência desses fluxos migratórios”, ressalta a nova secretária.

Em entrevista exclusiva para o MigraMundo, Patrícia disse que, entre outras medidas, vai manter o apoio a manifestações culturais migrantes como a Alasitas (que acontece sempre no mês de janeiro) e manter a cadeira especial para imigrantes nos Conselhos Participativos Municipais. Ela pretende ainda aproximar a Secretaria dos órgãos de combate ao trabalho escravo – uma das principais áreas de atuação como vereadora.

Entre o que pretende mudar, ela anunciou a mudança do nome da atual CPMig (Coordenação de Políticas para Migrantes) para Coordenação de Políticas para Imigrantes e Refugiados e criação de uma nova coordenação, a de combate ao trabalho escravo e tráfico de pessoas. “Nossa proposta é aprimorar os serviços prestados à população migrante, incluir a temática de refúgio na agenda e manter o canal de diálogo aberto para constante melhoria dessas políticas.

Veja abaixo a entrevista na íntegra:

MigraMundo: Como a futura secretária encara o migrante e a temática da migração, tanto do ponto de vista histórico como em relação aos movimentos contemporâneos?
Patrícia Bezerra:
Migração é hoje uma realidade muito mais multifacetada do que já foi há décadas. As razões para que a migração ocorra são muitas: desastres ambientais, perseguições políticas, de etnia ou até culturais, guerras, motivações relacionadas a estudos e trabalho. Além disso, ao contrário do que pode parecer, a migração para países do Sul corresponde a quase o mesmo número de migrantes para os países do Norte. Diante desses movimentos contemporâneos, o tema de migração demanda soluções inovadoras por parte do gestor público para que migrantes de diferentes origens sejam acolhidos de forma humana.

Como a próxima secretária avalia a postura da cidade de São Paulo em relação à população migrante e refugiada, e as políticas já adotadas até o momento?
Como muitos outros pólos urbanos, a cidade de São Paulo atrai uma considerável população de migrantes e refugiados. Chega a ser impossível pensar a cidade sem a forte influência desses fluxos migratórios. Medidas como a criação de centros de atendimento e cursos de capacitação para migrantes formam uma rede de acolhimento que deve ser aprimorada.

CRAI (Centro de Referência e Acolhida para Imigrantes) é um dos centros voltados para migrantes em São Paulo.
Crédito: Fernando Pereira/SECOM

No programa de governo do prefeito eleito Doria estão previstos: a implantação de centros de informação e orientação ao imigrante e refugiado em pontos de entrada na cidade (rodoviárias, aeroportos, estações ferroviárias), disponibilizando serviço de cadastro para identificação das condições de vida e origem bem como a informações dos indivíduos nos seus países e a oferta de cursos de língua portuguesa. Há alguma outra medida prevista ou em estudo além do que já consta nesse programa?
É fundamental chegar onde o migrante está, daí surgiu a ideia de implantação de centros de informação e orientação em pontos de entrada da cidade. Devemos ter em mente a importância de fornecer informação adequada à população migrante. Além disso, pretendemos promover cursos e materiais de sensibilização sobre o tema de migração e refúgio para a própria máquina pública, para que agentes públicos não mais vejam os migrantes como uma ameaça.

Em 2016 foi instituída em São Paulo a Política Municipal para a População Imigrante, por meio do PL 142/2016. Como a gestão Doria e a Secretaria de Direitos Humanos e Cidadania vão trabalhar com essa lei?
A implementação da Política Municipal para a População Imigrante passa por três eixos principais: articular com a sociedade civil, inclusive os próprios migrantes, para escutar suas principais demandas; atendimento à população migrante no âmbito dos centros de referência; e cooperação com outras pastas como de saúde e assistência. Neste mês de dezembro foi publicado o decreto de implementação da Política Municipal que caminha nesta linha. Nossa proposta é aprimorar os serviços prestados à população migrante, incluir a temática de refúgio na agenda e manter o canal de diálogo aberto para constante melhoria dessas políticas.

Nos últimos anos a cidade de São Paulo passou a contar com centros de acolhida voltados especificamente para imigrantes, mantidos em parceria com entidades da sociedade civil. Também passou a contar com a Coordenação de Políticas para Imigrantes, dentro da Secretaria de Direitos Humanos e Cidadania. Esses locais e essa coordenação serão mantidos?
A partir de 2017, iremos fortalecer a atuação dos centros de acolhida e a estrutura da Coordenação responsável pelo tema. Neste sentido, a Coordenação de Políticas para Migrantes passará a incluir explicitamente a questão de refugiados, passando a ser chamada de Coordenação de Políticas para Imigrantes e Refugiados. A ideia é promover políticas públicas para ambas as populações, com as suas respectivas especificidades, promovendo desenvolvimento socioeconômico e paz.

Em um passado recente, festas e feiras promovidas por imigrantes chegaram a ser dispersadas com cassetetes. Atualmente certas festividades até constam no calendário oficial de eventos da cidade, como a Alasitas (Bolívia), e outras que recebem apoio logístico da Prefeitura. Qual vai ser a postura da nova gestão e da secretaria em relação a essas atividades culturais?
Promover o direito da população migrante à manifestação de sua própria cultura é um dos pilares de toda política humana de migração. Apreciar e dialogar com outras culturas é o que fez da cidade de São Paulo o centro cultural que é hoje.  Já durante a fase de transição para a nova gestão, temos dialogado com o atual Secretariado para que o apoio a festividades promovidas por imigrantes continue, como é o caso da Alasitas que acontece todo ano em janeiro.

Apresentação cultural na Alasitas 2015, do Memorial da América Latina, em São Paulo. Gestão atual promete apoio à festividade.
Crédito: Bolívia Cultural

Desde 2014 a cidade de São Paulo conta com representantes dos imigrantes – eleitos pelos próprios imigrantes residentes na capital – nos conselhos participativos municipais. Esses conselhos e essa representação vão continuar?
Sim, porque esses espaços de representação de imigrantes são fundamentais porque permitem que eles contribuam para a política pública que mais os afetam. Constituem espaços para o diálogo, sendo uma via de mão dupla – tanto a administração quanto os migrantes aprendem uns com os outros numa troca permanente.

Uma das áreas de atuação da vereadora é o combate ao trabalho escravo, no qual infelizmente ainda existem muitos imigrantes. No entanto, existe o temor de certas entidades da sociedade civil que o combate ao trabalho escravo sirva de pretexto para mais repressão e restrições contra imigrantes – postura essa que já é adotada por certos governos nacionais. Como a questão do combate ao trabalho escravo será abordada na Secretaria de Direitos Humanos, sem que ela signifique mais restrição contra imigrantes?
Esta é uma preocupação importante. No entanto, tanto a lógica atual  do combate ao trabalho escravo, quanto a dos direitos do migrante coincidem num ponto crucial: garantir o trabalho decente, humano. De fato, as leis de combate ao trabalho escravo concentram esforços na figura do empregador: exigindo que não se empregue trabalho escravo e que a empresa seja responsabilizada caso o faça. Uma das propostas da Secretaria é aproximar-se dos órgãos de combate ao trabalho escravo como a COMTRAE (Comissão Municipal de Erradicação do Trabalho Escravo) e das empresas de construção civil para sensibilizar sobre o tema e promover mudança nessas práticas. Dada a importância deste tema, a Secretaria contará a partir de 2017 com duas coordenações que trabalharão de maneira próxima nesta área: a de migrantes e refugiados e a de combate ao trabalho escravo e tráfico de pessoas.

É imprescindível reconhecer que o trabalhador – migrante ou não – tenha acesso integral a direitos sociais, entre eles o de não ser submetido a condições degradantes de trabalho. Reforçando esses direitos no âmbito nacional, em meados de 2016, o Conselho Nacional de Imigração determinou que estrangeiros em situação de vulnerabilidade, vítimas de tráfico de pessoa ou de trabalho análogo à de escravo poderão permanecer no Brasil pelo período de até cinco anos.

Será feita alguma política de valorização da cultura de povos que migraram para São Paulo, seja da migração histórica ou das migrações contemporâneas?
Um dos pilares da política de migração precisa ser a valorização da cultura de povos que migraram para São Paulo. , A Secretaria de Direitos Humanos manterá diálogo constante com a pasta de Cultura para reforçar tais iniciativas. Por exemplo, o Programa para a Valorização de Iniciativas Culturais (VAI), da Secretaria Municipal de Cultura de São Paulo recebe até janeiro inscrições de projetos, inclusive de populações migrantes. Iniciativas como essas serão estudadas junto com às demais áreas da Prefeitura para ampliarmos esse trabalho.

Para finalizar, o que o imigrante residente em São Paulo, independente da condição, pode esperar da gestão Doria na cidade e da vereadora Patrícia à frente da Secretaria de Direitos Humanos e Cidadania?
É importante olhar migração não como problema de direitos mas com uma oportunidade para construirmos juntos o crescimento, o desenvolvimento igualitário em nossa sociedade, garantindo direitos, desde os mais básicos como à documentação ao direito a um trabalho de acordo com a qualificação de cada um. Hoje o que vemos é a dificuldade do migrante de ver seu diploma reconhecido, por exemplo. Neste sentido, políticas para a população migrante e refugiados na cidade de São Paulo precisam ser aprimoradas. É um grande desafio que estamos dispostos a enfrentar, é uma tarefa que estamos dispostos a realizar.

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