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terça-feira, setembro 17, 2024

Entenda o debate sobre cidadania que está acontecendo na Itália

Proposta do “ius scholae” sugere que filhos de imigrantes que tenham frequentado ao menos dez anos de escola na Itália possam solicitar a cidadania italiana; medida divide o governo

Por Dominique Maia

A vitória da seleção da Itália no vôlei feminino nas Olimpíadas de 2024 intensificou o debate sobre cidadania italiana, gerando controvérsias sobre as regras de naturalização e expondo questões de racismo. A conquista da medalha de ouro pela equipe, com uma equipe que teve atletas de origem migrante como destaques, levou a um vandalismo de mural em homenagem a uma das jogadoras e provocou discussões acirradas dentro da coalizão governante.

No país, a cidadania é concedida com base no princípio do jure sanguinis, que garante a todos os descendentes de italianos a cidadania, independentemente do número de gerações que os separam da ancestralidade original. Há alguns anos esse modelo tem gerado debates sobre sua adequação frente às novas realidades sociais e demográficas da Itália. 

O debate atual foca na necessidade de reforma na legislação sobre atribuição da cidadania para refletir as mudanças na sociedade e atender melhor às demandas de imigrantes. Nos últimos anos, o tema da concessão de cidadania aos filhos de imigrantes nascidos na Itália tornou-se central no cenário político, com propostas de revisão da lei que data de 1992

O vice-primeiro-ministro e líder do partido Forza Italia, Antonio Tajani, propôs a introdução do Ius Scholae, uma reforma que permitiria a concessão de cidadania a estrangeiros após a conclusão de 10 anos de escolaridade obrigatória na Itália. Esta proposta visa oferecer uma alternativa mais acessível e inclusiva para aqueles que, apesar de terem crescido e estudado no país, ainda enfrentam barreiras para obter a cidadania.

No entanto, a proposta enfrenta resistência dentro da coalizão governamental, com partidos como o Fratelli d’Italia e a Liga se opondo à mudança. O deputado da Liga, Rossano Sasso, observou que dois dos três partidos da coalizão não consideram a reforma uma questão prioritária.  Assim, alcançar um consenso com os parceiros da coligação parece improvável no momento. 

Além disso, há uma crescente pressão para alinhar as leis de cidadania italiana com as práticas de outros países da União Europeia (UE). A discussão sobre a reforma é acirrada, refletindo a complexidade e as diferentes perspectivas sobre como a Itália deve adaptar suas políticas de cidadania.

Polêmica sobre cidadania italiana após vitória da Itália no vôlei 

Nos Jogos Olímpicos de 2024, a equipe feminina de vôlei da Itália venceu os Estados Unidos e conquistou a medalha de ouro. No entanto, a celebração da equipe trouxe à tona um intenso debate sobre a cidadania italiana, gerando uma disputa dentro da coalizão governante da primeira-ministra Giorgia Meloni.

A polêmica começou após o vandalismo de um mural em Roma dedicado a Paola Egonu, uma das estrelas da equipe de vôlei, que, como várias de suas colegas, é filha de imigrantes africanos nascidos na Itália. O mural retratava Egonu em seu uniforme olímpico e incluía a palavra “italianidade”.

Nascida na Itália e filha de pais nigerianos, Paola Egonu, de 25 anos, obteve a cidadania italiana há uma década. Embora não tenha comentado sobre os recentes comentários de Vannacci, ela já processou o político por difamação no passado, com resultado desfavorável. Além disso, dois anos atrás, Egonu manifestou seu desejo de se afastar da seleção nacional devido ao persistente abuso racista que enfrentava.

Mural antirracista em homenagem à jogadora de vôlei Paola Egonu é vandalizado. (Foto: Reprodução)

O chefe da delegação da Liga no Parlamento Europeu, Roberto Vannacci, publicou nas redes sociais que uma atleta negra como Egonu “não representa a grande maioria dos italianos, que, em vez disso, têm pele branca”. Vannacci já havia feito comentários semelhantes contra Egonu em um livro polêmico lançado no ano passado, antes de começar sua trajetória política.

Por outro lado, diversos partidos, incluindo o centro-direita Forza Italia dentro da coalizão de Meloni, estão solicitando a revisão das rígidas regras de cidadania italianas para facilitar o processo de naturalização das crianças de origem imigrante que estudam no país. 

Debate sobre o Ius Scholae: desafios e perspectivas

O aumento considerável de estudantes nascidos na Itália, filhos de pais imigrantes, traz à tona questões importantes sobre cidadania e inclusão social. O debate sobre o Ius Scholae se intensifica à medida que esses jovens, que cresceram e estudaram no país, ainda não têm direito automático à cidadania, o que adiciona uma camada de complexidade ao tema.

Aqueles que são críticos do Ius Scholae argumentam que conceder cidadania a esses jovens pode desviar recursos e atenção política de outras áreas. Em contrapartida, os defensores acreditam que a cidadania é um passo fundamental para reconhecer e integrar plenamente essas pessoas na sociedade italiana, alinhando-se à realidade multicultural do país.

Esse é o caso de Amin Nour, fundador da organização “Nibi, Neri Italiani Black Italians”, que é um dos principais defensores da reforma da lei de cidadania italiana. Nascido na Somália e residente na Itália desde a infância, Nour aponta que, mesmo após completar sua escolaridade obrigatória, ainda não obteve a cidadania. 

Com 37 anos, Amin Nour vive na Itália com uma autorização especial renovável e sente-se excluído do pleno reconhecimento como cidadão italiano. De acordo com Nour, conceder o direito à cidadania com base na educação oferece uma abordagem distinta, pois “reflete o investimento do Estado no indivíduo, que é central em tudo”. 

A Save the Children também está envolvida na defesa da reforma, com uma petição que já reuniu cerca de 100.000 assinaturas. Raffaella Milano, diretora de pesquisa da organização, destacou que a lei atual está desatualizada e não reflete as mudanças sociais e educacionais da Itália.


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