O relatório referente à situação dos direitos humanos no mundo em 2024, divulgado neste mês de janeiro pela Human Rights Watch, traz um diagnóstico pessimista em relação ao assunto, incluindo nessa avaliação o tratamento destinado pelos países em geral à temática das migrações.
A entidade salientou que 2024 foi marcado por conflitos armados e crises humanitárias, expondo o desgaste das normas internacionais destinadas a proteger civis e o custo humano devastador quando elas são desrespeitadas. A lista inclui casos como Gaza, Sudão, Ucrânia e Haiti, todas localidades cujos conflitos em curso vêm gerando deslocamentos forçados, tanto internos quanto internacionais.
No relatório, a Human Rights Watch aponta que os governos têm achado mais fácil ignorar questões de direitos humanos no âmbito internacional, “em parte porque as violações que cometem no âmbito doméstico não têm sido contestadas pela comunidade internacional”.
Em comunicado público sobre o relatório, a diretora-executiva da Human Rights Watch, Tirana Hassan, disse que a comunidade internacional e os governos nacionais como um todo têm falhado na missão de proteger os direitos humanos.
“Seja em resposta ao aumento da repressão na Rússia, na Índia e na Venezuela, ou aos catastróficos conflitos armados em Gaza, no Sudão e na Ucrânia, os governos de todo o mundo estão sendo chamados a demonstrar seu compromisso com os direitos humanos, a democracia e a ação humanitária. Muitos não passaram no teste. Mesmo governos comprometidos e orientados para a ação invocaram as normas de direitos humanos de forma fraca ou inconsistente, alimentando a percepção global de que os direitos humanos carecem de legitimidade”.
Hasan frisa que os direitos humanos “não são ideais abstratos; são a base da dignidade e da sobrevivência humana”, e que deveria ser de interesse comum protegê-los.
Migrantes como bodes expiatórios
A situação cada vez mais difícil dos migrantes mundo afora foi lembrada em diferentes pontos do relatório da Human Rights Watch, tanto nas seções individuais de países quanto no resumo global.
A organização internacional lembrou que diferentes governos europeus tem usado a estagnação econômica e as questões de segurança como pretexto para justificar o alijamento seletivo de direitos, especialmente de grupos marginalizados e migrantes, solicitantes de asilo e refugiados, ao mesmo tempo em que falham em tomar medidas críveis para melhorar os direitos econômicos e sociais.
Também foi recordado pelo documento que líderes autoritários têm conquistado espaço em eleições com retórica e políticas discriminatórias. E que estas, por sua vez, têm sido normalizadas pelos principais partidos que adotam sua agenda, mesmo quando muitos eleitores resistem ao avanço desses líderes.
A eleição de Donald Trump para um segundo mandato como presidente dos Estados Unidos e o avanço da extrema-direita nas eleições do Parlamento Europeu e em governos nacionais foram citados pela Human Rights Watch como exemplos desse retrocesso.
“De fato, o apelo de líderes populistas reside em sua disposição de transformar minorias e estrangeiros em bodes expiatórios e oferecer aos eleitores a miragem de ‘soluções’ em troca da negociação de seus direitos e do Estado de Direito. No entanto, quando os direitos e a dignidade de todos são protegidos, a humanidade floresce, destacando o vínculo inseparável entre eles”, observou Hassan.
Como caminhos para enfrentar essa situação, a organização aponta para o poder de organismos como entidades da sociedade civil e imprensa para pressionar governos nacionais e instituições internacionais no sentido de resistir a retrocessos.
O Brasil no relatóro da HRW e migrações
No caso do Brasil, o relatório da HRW menciona que o país tem tido uma postura inconsistente quanto a direitos humanos. Ao mesmo tempo que foram notados avanços nas questões ambiental, indígena e de gênero, o governo brasileiro foi criticado pelas falhas no enfrentamento à violência policial e pela falta de condenação a violações de direitos por parte da gestão de Nicolás Maduro na Venezuela.
“O presidente Lula prometeu que colocaria o Brasil de volta ao cenário internacional”, disse César Muñoz, diretor da Human Rights Watch no país. “Ele deveria usar o novo perfil global do Brasil, incluindo a participação no Conselho de Direitos Humanos da ONU, nos BRICS e na presidência do G20 em 2024, para promover os direitos humanos e condenar abusos, independentemente dos interesses geopolíticos ou da ideologia do governo responsável por violações.”
Na questão migratória, o relatório da HRW faz menção à decisão governo brasileiro de proibir que as pessoas em trânsito sem visto solicitassem refúgio, exigindo que continuassem seu trajeto até o destino final ou retornassem ao país de origem. A medida, que entrou em vigor em agosto do ano passado, tem sido alvo de críticas de diferentes setores sociais, como operadores do Direito, acadêmicos e sociedade civil.
Questionado pela Agência Brasil sobre esse ponto, o Ministério da Justiça defendeu a medida, classificando-a como um elemento chave para o combate ao tráfico de pessoas e ao contrabando de migrantes, e que o país segue sendo um local acolhedor “para aqueles que efetivamente buscam proteção internacional”.
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