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segunda-feira, dezembro 23, 2024

Limitações migratórias na América Latina empurram pessoas para Darién, aponta Human Rights Watch

Entidade internacional defende que os governos do continente americano tomem medidas urgentes para ampliar o acesso ao refúgio, aos processos de regularização e a oportunidades significativas de integração social e econômica

O fluxo de migrantes que passa pela densa e perigosa região de selva em Darién, entre a Colômbia e o Panamá, é motivada sobretudo pelas limitadas políticas de regularização migratória e de apoio a migrantes existentes em países da América Latina. Essa é a conclusão principal de um relatório recente da Human Rights Watch sobre a dinâmica migratória no continente.

O documento, intitulado “Darién Gap: The Jungle Where Poor Migration Policies Meet”, (“Estreito de Darién: a selva onde deficientes políticas migratórias se encontram”, em português), foi divulgado na semana passada. Ele é baseado em entrevistas conduzidas pela Human Rights Watch ao longo de dois anos e meio (abril de 2022 a setembro de 2024) com cerca de 300 pessoas, incluindo migrantes que fizeram ou estavam para realizar a travessia, além de pesquisadores, trabalhadores humanitários e autoridades colombianas e panamenhas. O estudo também analisa as ações tomadas em relação a migrantes pelo Brasil e mais cinco países da região: Chile, Colômbia, Equador, Panamá e Peru.

Em comum, os seis países analisados figuram entre os principais locais de partida ou de passagem de migrantes do Haiti e da Venezuela, que vivem duas das maiores crises humanitárias da atualidade. Embora também figure entre os analiasados pelas políticas migratórias, o Equador também vivencia uma crise institucional que tem levado a um contexto de violência que vem empurrando cidadãos para a travessia de Darién.

Segundo o relatório, desde o começo de 2023 mais de 700 mil migrantes, incluindo solicitantes de refúgio, cruzaram o Estreito de Darién. Entre eles estão 477 mil venezuelanos, 60 mil equatorianos e 41 mil haitianos.

Uma vez superada a travessia por Darién, a maioria dos migrantes ainda segue viagem pela América Central até a fronteira com os Estados Unidos, considerado o destino prioritário.

Esforços insuficientes

A Human Rights Watch defende que os governos do continente americano deveriam tomar medidas urgentes para ampliar o acesso ao refúgio, aos processos de regularização e a oportunidades significativas de integração social e econômica. No entanto, o relatório aponta que o caminho adotado tem sido justamente o inverso, com “cronogramas restritivos, procedimentos complexos, onerosas exigências de documentos e atrasos administrativos”.

A ONG prossegue, apontando que “os sistemas de refúgio também sofrem com a capacidade limitada, resultando em atrasos significativos e em uma aplicação inconsistente da Declaração de Cartagena, que exige ampla proteção para os refugiados”.

“Os governos do continente americano não deveriam ficar de braços cruzados enquanto as crises na Venezuela e no Haiti se aprofundam. “Eles deveriam respeitar e promover os direitos humanos internamente e assegurar que pessoas que fogem tenham oportunidades significativas para obter proteção e refazer suas vidas”, disse Tirana Hassan, diretora executiva da Human Rights Watch, em comunicado à imprensa.

Em abril, um outro relatório da Human Rights Watch já havia criticado os governos da Colômbia e do Panamá por não estarem conseguindo proteger efetivamente o direito à vida e à integridade física dos migrantes em trânsito e dos solicitantes de asilo, nem investigar as violações de forma eficaz, rápida e completa. A entidade também se colocou contra o recente acordo firmado entre o governo panamenho e os Estados Unidos para expulsar os migrantes que não possuam a documentação necessária para estar no país centro-americano, por considerar que ele vai piorar ainda mais a condição enfrentada pelos migrantes na região.

E o Brasil?

A entidade internacional reconhece a existência de boas práticas na região, destacando entre elas o fato do Brasil reconhecer os venezuelanos como refugiados e de prever acesso de haitianos ao visto humanitário.

No entanto, a Human Rights Watch aponta que a ausência de estratégias claras de integração social e econômica fez com que muitos migrantes ficassem sem emprego adequado e enfrentassem dificuldades de acesso a serviços de saúde, moradia, educação e programas sociais.

No caso do Brasil, embora o país conte com uma legislação migratória e de refúgio considerada progressista e elogiada internacionalmente, a falta de uma política nacional que defina a atuação dos entes públicos privados quanto à temática leva justamente ao quadro apontado pela Human Rights Watch como motivador das longas e arriscadas jornadas migratórias pelo continente americano.

Encaminhamentos

O relatório da Human Rights Watch sobre Darién pede uma atuação coordenada dos países da América Latina como caminho para resolver a situação na região e faz algumas sugestões.

Entre as propostas da entidade está o estabelecimento de um mecanismo equitativo de acomodação dos refugiados. Ele teria como objetivo garantir que nenhum dos países da região fique mais sobrecarregado do que outros.

Outra sugestão oferecida pela Human Rights Watch é a criação de programa único de regularização da situação de cidadãos da Venezuela e do Haiti para todos os países analisados.

No documento, a ONG evoca a Declaração de Cartagena (1984), que completa 40 anos em 2024 e que expandiu a definição de refúgio, como algo que poderia guiar as ações a serem tomadas pelos Estados da região. A legislação brasileira sobre refugiados, por exemplo, segue a definição do tema dada por Cartagena.

“O 40º aniversário da Declaração de Cartagena de 1984 é uma oportunidade para que os governos busquem soluções coordenadas para os desafios da migração na região e adotem políticas que respeitem os direitos humanos e que garantam o acesso a caminhos seguros e legais para a migração, processos efetivos de regularização e oportunidades significativas de integração social e econômica”, conclui o relatório.


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