No começo de 2017, o poeta angolano Moisés António, radicado em Curitiba (PR), publicou no MigraMundo o poema “Sou Imigrante”, que acabou reproduzido por materiais didáticos ao longo do tempo no Brasil e se tornou um dos conteúdos mais populares do portal.
Sete anos depois, Moisés decidiu compartilhar com o MigraMundo uma nova versão do poema, atualizada à luz de acontecimentos recentes sobre as migrações no mundo, que segue abaixo.
Formado em Letras – Inglês pela Universidade Agostino Neto, em Angola, Moisés deu continuidade à carreira literária em solo brasileiro e tem na condição de migrante e negro duas de suas principais inspirações.
Além dos poemas “Sou Imigrante” e “Sou Imigrante II”, outras composições de Moisés António no MigraMundo podem ser lidas na coluna “Moisés e a Poesia”, como “Carta do Refugiado às Nações”, Sou D’África – Filho da Realeza, entre outras.
Moisés também é autor do livro Grito A Poesia, que reúne parte de sua obra.
Sou Imigrante II
Por Moisés António
Medo
Terror
Pavor
Massacre!
Vidas amputadas, corpos mutilados, corpos mortos irreconhecíveis,
balas atravessando em corpos infantis, uivando!
Gritos, choros, lamentos…
Tristeza e desolação…
Causados por aqueles que nos governam
Que dizem nos proteger,
Mas nos matam!
Sou Imigrante
Não porque quis,
Mas fui forçado a deixar o país
Porque aqueles que nos governam
De tudo detêm, nos deixando sem nada
Vivendo à baixo da pobreza feito miseráveis, comendo migalhas
Tendo apenas como café da manhã,
o pão achado no lixo!
Somos Imigrantes
Porque miséria tem nome
Nos países de origem que nos viu nascer
Viu crescer, querendo viver…
Sim, viver a vida…
Mas aqueles que de nós detêm o poder
Não nos deixam com outra opção senão apenas a sobrevivência!
Eles continuamente nos falam:
_ Votem em nós para um futuro melhor!
Quando na verdade eles vivem o presente em berço de ouro – beneficiando a si mesmos, o Ocidente, a Europa, os chineses… novos impérios!
E o futuro em nós nunca chega,
Então na velhice sucumbimos e não vivemos a vida!
Ah… sou imigrante
Porque não tenho terra
Sou Imigrante a busca de condições
de vida, em um país onde eu possa viver como humano e não sobre condições desumanas!
Lá de onde eu nasci
A minha vida nela não avivi!
Em suma, sou imigrante em movimento
Porque vós me moveis com a força impetuosa de um furacão destruindo tudo, colocando-me em marcha para onde quer que o destino me leve!
Minha infância foi roubada
Minha adolescência foi transferida pra fase adulta, colocada sob condições desumanas- feito escravo, trabalhando para essa gente ociosa, folgada, submetida a exploração brutal daqueles que dizem nos governar, mas nos escravizam; (observem o Congo!)
Eis a colonização moderna com outra face da moeda,
Do opressor branco para o opressor negro, de opressores latinos contra latinos, de Israelenses contra palestinos
Piores seres desumanos, nossos carrascos letais, da África-Angola, Congo, Venezuela, Palestina, Ucrânia para o mundo!
Sou Imigrante
Porque na terra onde eu nasci
Abastecida do mel
Nossos presidentes
Nos dão de comer o fel
Ao invés do mel, por Deus fornecido!
Sou Imigrante feito um andarilho
Percorrendo o mundo a busca de melhores condições de vida como humano, porque sou humano!
As guerras têm nome,
Ganância governamentais!
A xenofobia tem nome,
De governantes egocêntricos que nos tratam como animais,
Mas são eles os causadores das tais atrocidades!
A miséria tem nome,
De governantes que nos deixam com nada se beneficiando com tudo que
é nosso!
Deixando-nos sofrer horrores,
Chamando-nos de terroristas
Nos encarcerando, matando,
deportando quando nos movemos, de terra em terra, de um canto para outro…
Querendo apenas viver em paz em busca de serenidade, quando na verdade são eles os verdadeiros criminosos terroristas!
Vivendo nas engordas
Sobre marés de riquezas produzidas a mão barata dos povos sofredores,
feitos escravos!
Sou Imigrante
Lá de onde eu venho
Onde nasci, e não vivi
A minha infância foi sequestrada
Vivendo a vida de um adulto,
A minha vida foi roubada com promessas vazias de um futuro risonho,
Meus sonhos foram encalhados
Quando eles vivem o presente!
Sou Imigrante dalém
Lá do outro lado do oceano que seria
a minha moradia,
Fui forçado a abandonar o país
Em busca de um abrigo, um auxílio,
De braços abertos que enlaçam
E no final, tentar recomeçar uma vida
Aquela que há anos foi adiada por um sistema político doentio e cruel,
que me colocou sobre essas condições.
Em marcha, feito uma andorinha imigrante em busca da melhor estação!
Se puderem me acolher
E deixarem-me viver como humano
Com certeza, trago comigo uma bagagem de calor humano,
Dedicação, determinação, força de vontade pra recomeçar uma vida
E contribuir para o desenvolvimento do país acolhedor, trabalhando afincadamente, contribuindo culturalmente, com danças rítmicas, músicas, e culturas diversas
E finalmente soltar a voz em prosas,
feito poesia, a verdadeira guardiã dos povos diversos, migrantes, Imigrantes, refugiados através dos versejares na voz da razão do Poeta e Escritor Angolano…
Moisés António
“ e o futuro em nós nunca chega” Que impacto essa frase teve em mim, bem como todo o poema. Parabéns Moisés.