A mudança recente no governo do Reino Unido, com a vitória histórica do Partido Trabalhista sobre o Partido Conservador, também significou o fim do criticado e polêmico plano de enviar para Ruanda os migrantes que chegam ao território britânico sem documentação.
A medida foi anunciada no último sábado (6) pelo novo primeiro-ministro, Keir Starmer, em sua primeira coletiva de imprensa no cargo.
“O plano Ruanda estava morto e enterrado antes de começar. Não estou preparado para continuar com artifícios que não funcionam como dissuasores”, disse.
Para lidar com a questão migratória no Reino Unido, Starmer comprometeu-se em resolver o problema “a montante”, combatendo grupos de contrabando de pessoas. No centro desta política, segundo o novo premiê, estará um novo Comando de Segurança das Fronteiras de “elite”, composto por especialistas em imigração e em aplicação da lei, bem como pelo serviço de informações internas MI5.
Os eleitores britânicos levaram o Partido Trabalhista a conquistar 412 dos 650 assentos da Câmara dos Comuns, o equivalente à Câmara dos Deputados no Parlamento Britânico. Os conservadores, por sua vez, pederam 252 cadeiras e elegeram apenas 121 parlamentares. Foi o pior resultado da história da sigla, fundada em 1834.
Começo e fim do Plano Ruanda
Idealizado em 2022 pelo então premiê Boris Johnson, o chamado Plano Ruanda era uma das bandeiras do agora antecessor de Starmer, o conservador Rishi Sunak, como uma forma de conter a chegada de imigrantes ao país por barcos. No entanto, era fortemente criticada por organizações internacionais e entidades locais de defesa dos direitos humanos, além de ter sido rejeitada de forma unânine em novembro passado pela própria Suprema Corte britânica.
Mesmo com esses fatores, o líder conservador insistiu no Plano Ruanda, que acabou aprovado em abril. Sunak, inclusive, ameaçou retirar o Reino Unido do Tribunal Europeu dos Direitos Humanos caso a Corte continuasse a se opor aos voos com imigrantes para Ruanda.
A expectativa do antigo governo era de iniciar os voos com deportações já neste mês de julho, após as eleições. Com a derrota para o Partido Trabalhista, o plano foi enterrado antes mesmo de entrar efetivamente em vigor.
Mesmo sem deportações, o Plano Ruanda custou pelo menos £ 240 milhões (R$ 1,54 bilhões) até o fim de 2023 aos cofres públicos britânicos. O valor tinha sido encaminhado ao país africano para que o país fornecesse serviços de hospedagem aos requerentes de asilo.
Segundo estimativas divulgadas pelo governo britânico em novembro, entre junho de 2022 e o mesmo mês de 2023, o país recebeu cerca de 970 mil migrantes, sem contar os vindos da União Europeia (mais 130 mil). Os que têm possibilidade de pedir asilo político, no entanto, são apenas aqueles perseguidos por motivos de raça, religião, nacionalidade, opinião política ou pertencimento a um determinado grupo social.
Sem revisão do Brexit
Na mesma coletiva de imprensa, Starmer também descartou rever o Brexit, o processo de saída do Reino Unido da União Europeia.
A temática migratória esteve no cerne das discussões que levaram ao Brexit. O argumento dos políticos favoráveis à saída do Reino Unido da União Europeia era de que a medida daria mais poder ao governo nacional de regular suas fronteiras. No entanto, o processo se arrastou e, além de não ter reduzido o fluxo migratório, ainda trouxe danos para a economia britânica, que vive crescimento baixo e inflação em alta.
“Votei pela permanência [na União Europeia]. Fiz campanha pela permanência. Mas o que aquele referendo fez foi lançar a política em um turbilhão por três anos. Entre 2016 e 2019, nosso parlamento não conseguiu fazer nada. Isso causou uma enorme incerteza. E eu não acho que voltar a esse tipo de incerteza vá realmente nos ajudar a reconstruir nossa economia, reconstruir nosso país, aumentar a riqueza e criar a riqueza de que precisamos para os empregos seguros do futuro”, afirmou o líder trabalhista.
Como resposta no meio econômico, Starmer afirmou nesta segunda-feira (8) que vai trabalhar para garantir um “acordo melhorado” com a União Europeia e reformular o “malfeito” assinado pelo ex-premiê Boris Johnson.