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domingo, novembro 24, 2024

Os desafios da atuação com migrantes e refugiados na epidemia de coronavírus

A população migrante e instituições que trabalham em prol dessas pessoas relatam os desafios que o novo coronavírus tem causado

Do Centro Scalabriniano de Estudos Migratórios (CSEM)
(Leia aqui o texto original)

No início de abril de 2020, o secretário geral da ONU, António Guterres, afirmou que a crise do novo Coronavírus seria o maior teste que a humanidade teria desde a Segunda Guerra Mundial. Acendido o alerta, organizações não-governamentais, defensores de direitos humanos e governos correm contra o tempo em busca de soluções e ações que minimizem o impacto na sociedade.

Cientistas do mundo inteiro estão focados na busca por uma vacina eficiente para o combate ao vírus, e a medida de prevenção que se mostra mais eficaz é o isolamento social acompanhado de cuidados e atenção à higiene pessoal.

Tais condições, que previnem e amenizam a transmissão da doença, se mostram impraticáveis nos campos de refugiados mundo afora, onde as condições de saúde e higiene são precárias e a superlotação inviabiliza o isolamento social. E, para migrantes e refugiados de todo o mundo, o fechamento de fronteiras e restrições de circulação aumentam riscos à sua situação de vulnerabilidade.

Atualmente, existem mais de 200 mil solicitantes de refúgio no Brasil, e essa população possui o direito ao auxílio emergencial do Governo Federal. Apesar disso, encontraram dificuldades no início do processo. A falta do CPF (Comprovante de Pessoa Física) regularizado é um impedimento para acessar o recurso. Todos os processos migratórios como reconhecimento de refúgio, pedido de reunião familiar e naturalização estão suspensos, e os migrantes que estão no Brasil encontram dificuldades redobradas para regularizar o documento.

No mundo, pessoas em situação de mobilidade já enfrentam dificuldades em acessar informações precisas por fatores como língua e xenofobia, mas esforços de algumas organizações que oferecem cartilhas virtuais nos idiomas dos migrantes, com informes sobre prevenção do Covid-19, são tentativas de ajuda nesta época.

Além da preocupação com o acesso aos serviços de auxílio, ainda existe o medo do tratamento diferente cometido contra eles, que, muitas vezes, prejudica o acesso aos atendimentos médicos.

Em Ressano Garcia, Maputo – fronteira entre Moçambique e África do Sul—, 23 mil moçambicanos já retornaram ao país devido ao encerramento das atividades laborais na África do Sul para conter a pandemia. No mundo, muitos migrantes e refugiados se encontram em situações insalubres de moradia, vivendo em ocupações ou em situação de rua, enquanto que as ONGs que recebiam e auxiliavam essa população suspenderam suas atividades físicas e buscam doações de alimentos e produtos de higiene para levar a essas pessoas.

Mulheres migrantes e o covid-19 na Europa

Uma grande parcela das mulheres migrantes na Europa trabalha no setor de cuidados atendendo pessoas idosas, as mais afetadas pela pandemia. Segundo dados do governo espanhol, em 2005, 53,6 por cento do total de empregados nas tarefas domésticas e de cuidados eram migrantes, desses, 27 por cento cuidavam de idosos, a maioria mulheres migrantes. Do número total de falecidos em hospitais espanhóis por causa do Coronavírus, 86,1 por cento tem mais de 70 anos, segundo o Ministério da Saúde da Espanha.

Segundo as professoras da Universidade de Brasília (UnB), Susana Martinez e Carolina Calvo, do projeto MOBILANG que atua com migrantes e refugiados, as circunstâncias dessas mulheres antes da epidemia já eram de vulnerabilidade (baixos salários, trabalhos informais, longas jornadas de trabalho e situação migratória não regularizada), e que a conjuntura atual preocupa.

Por motivos diversos, imigrantes em geral estão entre as populações mais vulneráveis ao coronavírus
Epidemia fragiliza ainda mais mulheres migrantes na Europa.
(Foto cedida ao MigraMundo pelo artista Levi Israel)

As professoras alertam que essa alta taxa de mortalidade entre a população idosa desencadeará na perda do emprego das migrantes trabalhadoras, e ainda é possível que elas estejam se deparando com a pressão, “não só das famílias [patroas], também do próprio sentido do dever“, para continuar o serviço em situações inadequadas, o que as expõe ao vírus.

Casas de acolhida a migrantes e refugiados

Diversas organizações que trabalham diretamente com migrantes e refugiados tiveram de adequar-se às novas recomendações da Organização Mundial da Saúde (OMS) durante o atendimento.

O Instituto Madre Assunta em Tijuana, México, das Irmãs Scalabrinianas, alberga anualmente muitas mulheres e crianças migrantes que chegam à fronteira com os Estados Unidos. Com a pandemia, o Instituto se viu obrigado a não receber novas residentes, as mulheres que chegam são encaminhadas ao abrigo do governo federal mexicano. O objetivo é preservar a saúde de quem está abrigada no Instituto e evitar a disseminação do novo Coronavírus.

A Casa do migrante de Tijuana, dos padres Scalabrinianos, também fechou as portas e abriga somente o máximo permitido pelo governo local – 50 pessoas. À medida que os EUA deportam mais pessoas à cidade, com o objetivo de esvaziar os centros de detenção estadunidenses, entidades buscam por parte do governo mexicano uma melhor atuação para proteger a saúde de quem chega forçadamente, assim como das equipes que trabalham com essa população.

Terezinha Mezzalira, Irmã Scalabriniana que atua em Foz do Iguaçu, no estado brasileiro do Paraná, relata que famílias paraguaias e locais estão acolhendo os migrantes que chegam na medida do possível, mas ainda há famílias acampadas. Paraguaios que tentam retornar ao seu país estão sendo impedidos, muitos chegam à fronteira de outras partes do Brasil buscando chegar em casa. Felizmente, segundo a Irmã, município, organizações e Igreja estão unidos para atuar em prol dos migrantes.

Na África do Sul, país que enfrenta lockdown desde o último dia 27 de março, a Irmã Marivane Chiesa, Scalabriniana e diretora do albergue Bienvenu, que recebe mulheres e seus filhos refugiados, relata que a instituição está em isolamento desde o dia 18 do mesmo mês. As residentes não podem sair do local a não ser em casos de emergência, em respeito ao decreto local. A instituição, que possui equipamentos para capacitação de refugiadas para o serviço de corte e costura, está agora confeccionando máscaras para uso dos funcionários, voluntários e residentes. Medidas de proteção sanitária estão sendo adotadas rigidamente, com relatórios diários sobre os procedimentos.

O que nos preocupa, é o abrigo de emergência. Muitas são as mulheres migrantes e refugiadas que, forçadas pela situação a nossa volta, fome e desespero, batem a nossa porta e não podemos acolhê-las por conta da situação de precaução. E programas de alimentação de emergência para as pessoas afetadas nos bairros ao redor do Bienvenu Shelter, na sua maioria mulheres que foram residentes nossas [também foram afetados]. São muitas pessoas vulneráveis e em situação de risco” , afirma Ir. Marivane Chiesa, do MSCS.

Como ajudar

Confira os contatos das instituições citadas nesta reportagem, e de outras instituições que atuam com migrantes e refugiados neste momento de pandemia.

  • Instituto Madre Assunta, albergue para mulheres e crianças migrantes em Tijuana, México. Contato: +52 664 683 0575.
  • CAMI – Centro de Apoio ao Migrante São Paulo (SP). Contato: [email protected]; +55 (11) 9672-94238.
  • CAM – Centro de Atendimento ao Migrante Caxias do Sul (RS). Contato: [email protected]; +55 (54) 3027-3360.
  • Se você mora em São Paulo, pode solicitar o serviço de comida liderado por refugiados e imigrantes que fazem entregas. Veja a lista aqui.
  • África do Coração, organização de migrantes no Brasil. Para ajuda financeira Banco Bradesco SA-237, Ag: 0515, C.c: 0005122-5, África do Coração – CNPJ 25.224.617 / 0001-11.

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