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terça-feira, outubro 8, 2024

Os haitianos são o problema? Ou o problema é a falta de uma política migratória que respeite os imigrantes? – nota do CDHIC e Grito dos Excluídos Continental

Segue abaixo nota conjunta do CDHIC e Grito dos Excluídos Continental, com a qual o MigraMundo concorda, sobre o tratamento dado à questão dos haitianos em São Paulo:

O CDHIC – Centro de Direitos Humanos e Cidadania do Imigrante, juntamente com o Grito dos Excluídos Continental, organizações que integram o Fórum Social Mundial de Migrações/FSMM, tornam pública sua opinião sobre a recém-chegada, em massa, de haitianos em São Paulo, “enviados” pelo Governo do Acre devido o fechamento do abrigo em Brasiléia.

Nos últimos meses surgiram várias notícias na mídia corporativa sobre a entrada de imigrantes haitianos no Brasil, apontando a sua situação como um problema, uma ameaça, uma calamidade pública, um caos, uma invasão e até mesmo com extremo preconceito com sensacionalismo de baixo nível, chegando a afirmar que os haitianos difundem doenças em nosso país.

Crédito da foto: Conectas DH
Crédito da foto: Conectas DH

O envio de ônibus com destino a São Paulo, lotados de haitianos, com recursos do Governo do Acre trouxe à tona a desarticulação entre os governos estaduais, federal e municipal. Embora haja uma política municipal para imigrantes da Prefeitura de SP pautada pela Secretaria de Direitos Humanos e Cidadania, a falta de comunicação entre os entes federativos e a omissão/lentidão tanto do Governo do Acre como do Governo Federal em enfrentar seriamente a questão traz consequências negativas. O esforço somente da Prefeitura é insuficiente, pois questões práticas como emissão da Carteira de Trabalho e revisão dos procedimentos do visto humanitário ou refúgio são da alçada federal.

O pano de fundo da questão não é só a quantidade de haitianos ou a emergência assistencial aos mesmos e suas famílias. Estas são questões importantes, mas que devem ser entendidas num contexto maior: falta ao Estado Brasileiro uma redefinição sobre sua política migratória. É inadmissível que prevaleça uma Lei Federal em vigor (Estatuto do Estrangeiro) de 34 anos atrás, formulada pelo regime ditatorial civil-militar, totalmente incompatível com a Constituição Federal. Por que demora tanto o governo em apresentar e aprovar uma nova lei federal de migrações?

Ao invés de encarar a situação dos haitianos como um problema ou uma crise, o Estado Brasileiro deveria sim imbuir-se da obrigação de promover o acesso dos imigrantes a todo o conjunto de direitos garantidos aos cidadãos que aqui vivem, como saúde, trabalho decente, educação e moradia, entre tantos. Mas isso não se faz sem uma nova Política Nacional de Migração baseada no respeito aos direitos humanos. Por que o Governo não propõe uma política descentralizada e com distribuição de responsabilidades entre Estados e Municípios?

Mas, com raras exceções, o que vemos pelos depoimentos de agentes públicos é uma disputa de (ir)responsabilidades, ou um jogo de depoimentos na mídia, com caráter eleitoral, que em nada contribui para a questão.

O assunto não permite tais posturas. Estamos falando de pessoas oriundas de um dos países mais pobres do planeta, devastado por um terremoto em 2010 e que, por sua condição de imigrantes, negros e que falam outro idioma, enfrentam também dificuldades e discriminação racial existente em nosso país.

Resta perguntar mais uma vez: qual o perfil de imigrante desejado pelo Brasil? No mesmo período em que chegam os haitianos, outros grupos de estrangeiros com perfil eurocêntrico e branco por aqui desembarcaram em número muito maior e não são chamados de invasores ou problema.

Não cabe aqui criminalização da imigração, ou uma disputa judicial entre os governos estaduais de partidos opostos, ou a ironia do Secretário de Justiça do Acre, Nilson Mourão que disse “Vou passar a dar uma garrafa de água para cada imigrante, porque sei que há falta de água em São Paulo”. Perante semelhantes depoimentos e fatos se faz urgente uma manifestação e retratação que exigimos por parte dos gestores públicos baseado no “respeito dos direitos humanos da pessoa imigrante: mulheres, crianças, homens e idosos, tod@ ser humano merece a acolhida integral e devem ser titulares de direitos plenos”, e assim honrarem o cargo público que exercem.

O CDHIC e o Grito dos Excluídos Continental consideram também que estes princípios sejam centrais e orientadores na primeira Conferencia Nacional de Migração e Refúgio/Comigrar que ocorrerá em SP dentro de um mês.

Fazemos um chamado, pois se faz urgente mobilizar campanhas emergenciais de solidariedade aos migrantes haitianos, contando com apoio de outras instituições e empresas para doação de produtos para suas necessidades básicas, bem como de alimentos e agasalhos, e considerar também cursos de capacitação e de idioma português com professores militantes voluntários, em parcerias entre instituições de ensino e poder público.

Juntos por uma cidadania universal!
Nenhuma pessoa é ilegal, todos somos imigrantes!

Assinam

Centro de Direitos Humanos e Cidadania do Imigrante
Grito dos Excluídos Continental

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