Por Isabella Nickel, Pâmela Morais, Raíssa Oliveira e Thaila Pasetto
Do Migranós
Apesar da Lei de Migração nº 13.445, promulgada em 2017, ter trazido avanços importantes para a política migratória brasileira e representar um verdadeiro progresso para a comunidade migrante, questões importantes permanecem pendentes.
Épocas de eleição, por exemplo, como neste ano de 2022, trazem à tona o direito ao voto para imigrantes e refugiados/as no Brasil, que é inexistente. Pessoas não-brasileiras não podem votar para qualquer cargo, seja a nível municipal, estadual ou nacional.
Segundo a nossa Constituição Federal (art. 14), o voto é obrigatório para todo cidadão, nato ou naturalizado, alfabetizado, com idade entre 18 e 70 anos. O voto é facultativo para os jovens com 16 e 17 anos, para as pessoas com mais de 70 anos e para os analfabetos. O parágrafo 2º desse artigo prevê ainda expressamente que estrangeiros não podem ser eleitores.
Por essa lógica, nem um jovem haitiano que mora no Brasil há dois anos ou uma senhora argentina que aqui reside há mais de trinta podem votar caso não tenham se naturalizado brasileiros. Da mesma forma, essas pessoas também não têm o direito de se candidatar para um cargo político no Brasil.
A única exceção que essa regra prevê são para indivíduos de nacionalidade portuguesa, que podem exercer o direito ao voto no Brasil sem possuírem nacionalidade brasileira, caso optem pelo exercício dos direitos políticos no Brasil. Essa exceção está prevista pelo “Tratado de Amizade, Cooperação e Consulta entre a República Federativa do Brasil e a República de Portugal – Estatuto de Igualdade”.
Os demais imigrantes e refugiados de qualquer outra nacionalidade que não a portuguesa só passam a ter direitos políticos no momento em que se tornam cidadãos brasileiros, ou seja, após a naturalização.
O poder ao voto representa o exercício de direitos políticos e é a essência de uma democracia representativa. Em outras palavras, cada indivíduo vota pelo representante e pelas políticas que quer ver incentivadas no próximo governo. Dessa forma, em menor ou maior grau, os candidatos eleitos são reflexo de uma vontade coletiva por um determinado estilo de governo.
Assim, quem não vota não soma nessa equação. E no Brasil, temos cerca de 1,3 milhões de migrantes e refugiados atualmente enfrentando as mesmas dificuldades políticas e econômicas que qualquer pessoa nascida no país, mas sem o direito de expressar sua vontade sobre quem os governará.
E será que em todos os países do mundo imigrantes e refugiados também não votam? Não! Portugal, por exemplo, permite o voto de cidadãos com residência legal há mais de três anos, desde que nacionais de países que, em condições de reciprocidade, atribuam capacidade eleitoral ativa aos portugueses neles residentes.
A Irlanda também permite que imigrantes ou refugiados votem em eleições locais, independentemente do tipo de autorização de residência que essas pessoas possuam. Por sua vez, na Noruega, imigrantes que residem no país há mais de três anos têm direito ao voto desde 1983. Um fato interessante sobre o país é que, nas eleições de 2019, 3% dos eleitores eram imigrantes, pessoas naturalizadas norueguesas ou nacionais filhos de imigrantes.
Já na América do Sul, a maioria dos países permite a participação formal dos imigrantes nas eleições. Na Argentina, por exemplo, imigrantes podem votar em eleições municipais e provinciais (de acordo com a legislação local de província). Na Bolívia e Colômbia também é possível a participação. No caso desta última, o imigrante deve ser residente de forma ininterrupta por no mínimo cinco anos, estar plenamente regularizado e possuir registro eleitoral. Outro país sul-americano que permite o voto de nacionais de outros países é o Equador, onde imigrantes podem votar quando já possuírem mais de cinco anos de residência legal — no entanto, é válido destacar que podem somente votar, não se candidatar. Por fim, Uruguai, Paraguai, Peru e Venezuela também permitem, em algum nível, a participação formal dos imigrantes nas eleições.
No Brasil, tramita na Câmara de Deputados a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 347/2013, de autoria do deputado Carlos Zarattini (PT/SP) que visa alterar a redação do parágrafo 2º do art. 14 da Carta Magna para permitir que possam se tornar eleitores as pessoas imigrantes, residentes há mais de quatro anos no país e regularizadas. Não há movimentação da PEC, no entanto, desde 20 de janeiro de 2019.
Há ainda uma outra PEC, a 25/2012, que prevê o direito a voto para imigrantes apenas nas eleições municipais. Esta, no entanto, também encontra-se arquivada no Senado Federal, onde foi proposta inicialmente.
Esperamos que o Brasil siga o exemplo de tantos outros países e permita, ao menos em alguma medida, que imigrantes e refugiados exerçam seus direitos políticos e tenham a possibilidade de contribuir para a eleição de seus futuros representantes. Afinal, esse é o mais emblemático exercício da democracia e é necessário permitir que todas as pessoas afetadas por decisões políticas sejam ouvidas.