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segunda-feira, dezembro 9, 2024

Os impasses na rota mediterrânea e o impacto sobre migrantes e refugiados

Os países aprimoram a leis, erguem novos muros, criam barreiras e se fecham sobre si mesmos, deixando a população “descartável” do lado de fora

Por Pe. Alfredo J. Gonçalves, cs
Em Roma (Itália)

Nas últimas semanas/meses, vem mudando o cenário das migrações no mar Mediterrâneo. A rota que faz a travessia entre a Líbia e o sul da Itália vem sofrendo uma série de restrições. O governo italiano passa a controlar mais de perto a travessia dos imigrantes. Além disso, vem exigindo que as organizações não governamentais (ONGs) assinem um documento chamado “código de conduta”, submetendo-se a tais restrições. Pelo menos uma embarcação foi apreendida pelas forças legais italianas, enquanto um sacerdote foi acusado de incentivar a imigração. Além disso, algumas de tais ONGs foram inclusive acusadas de “favorecer o tráfico de imigrantes clandestinos”, segundo o noticiário de um telejornal local. Por isso, torna-se cada vez mais comum a presença de homens armados nos barcos que vão em socorro dos potenciais “imigrantes náufragos”.

Do lado da Líbia, os problemas a situação não é melhor para os que buscam um futuro mais promissor. Novos personagens entram em cena. Num país dividindo em três governos diversos e controversos, as forças policiais estão tentando bloquear a saída em massa dos imigrantes. Por uma parte, exigem que os barcos estrangeiros se mantenham cada vez mais à distância da costa daquele país; por outra, obrigou a retornar retornar algumas embarcações apinhadas de gente que procura a Europa. Quanto ao velho continente europeu, suas autoridades parecem respirar mais aliviadas. Afinal de contas, na perspectiva europeia, a Itália “está fazendo o dever de casa”.

Os resultados não se fazem esperar. A entrada de imigrantes na Itália em julho caiu quase 50% em relação a junho, e diminui mais ainda no decorrer de agosto. Estima-se que ao final de 2017 o número de imigrantes seja menor que em 2016. Retida em território líbio, a população em fuga, vinda do Sudão do Sul, Afeganistão, Guiné, Nigéria, Etiópia e Eritreia – entre ouros países – é mantida em lugares fechados e em condições extremamente precárias. Há notícias de que muitos passam dia e noite sobre as próprias fezes, outros são “oferecidos” como mão-de-obra escrava. Doenças, fome e sede se alastram, golpeando especialmente os menores e indefesos.

Convém não esquecer que a outra rota – a balcânica – também encontra-se bloqueada. Um acordo feito em 2016 entre a Europa e a Turquia mantém os imigrantes neste último país. Isso para não falar dos muros que foram levantados na Sérvia, Macedônia, Áustria, e assim por diante. A lógica parece clara: primeiro, a legislação migratória, com passaporte, visto e tudo em dia, foi sendo endurecida. Fechada a via legal, os migrantes arriscam tudo através de caminhos alternativos, pressionando as fronteiras, pelo mar (norte da África), pelo deserto (México e Estados Unidos) ou pelas florestas (Venezuela, Colômbia e Brasil). Agora, busca-se todos os meios para impedir o uso massivo desta via alternativa.

Os países aprimoram a leis, erguem novos muros, criam barreiras e se fecham sobre si mesmos, deixando a população “descartável” do lado de fora. “Descartável” é o termo utilizado seguidamente pelo Papa Francisco para referir-se aos pobres e excluídos, os quais sequer conseguem a “fortuna” de serem exploradas pelo sistema capitalista neoliberal, e assim receber dele uma pequena migalha. Mas é também a expressão usada pelo Documento de Aparecida. Literalmente: “Uma globalização sem solidariedade afeta negativamente os setores mais pobres. Já não se trata simplesmente do fenômeno da exploração e opressão, e sim de algo novo: a exclusão social. Com ela, fica afetada em sua própria raiz a pertença à sociedade na qual se vive, pois nesta já não se está abaixo, na periferia ou sem poder, mas se está fora. Os excluídos não são somente explorados, mas pessoas que sobram e são descartáveis” (DP, n. 65).

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