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quinta-feira, novembro 21, 2024

Polarização ideológica ignora direitos humanos de venezuelanos

Embate no Brasil entre setores da direita e da esquerda prejudica busca por possíveis soluções

Por Laura Marcondes, Lorena Trevelin e Victoria Ferreira
Em São Paulo (SP)

De acordo com os últimos dados divulgados pelo ACNUR (Alto Comissariado das Nações Unidas para os Refugiados) em abril de 2018, mais de 52 mil venezuelanos chegaram ao Brasil desde o início de 2017, dos quais 25 mil são solicitantes de refúgio. Apesar do grave problema humanitário, a crise se transformou em pauta ideológica no atual contexto brasileiro de grande polarização. Enquanto parte da esquerda brasileira defende o governo de Nicolás Maduro e evita falar sobre os problemas enfrentados pela população daquele país, a direita defende uma política xenófoba e protecionista.

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“O debate sobre as migrações e seu papel nas agendas políticas é bastante importante e saudável, mas me preocupo com esses posicionamentos”, declara o professor da Universidade Federal de Roraima, João Carlos Jarochinski, que é doutor em Ciências Sociais e cuja pesquisa está focada em Migrações Internacionais. A população de Roraima, que era de 332 mil, cresceu 10% em apenas um ano com a chegada de venezuelanos.

Para Jarochinski, a maneira como esse debate vem sendo abordado até agora no Brasil fará com que a migração venezuelana se transforme em mais um argumento retórico e de ataque no período das eleições, entre os candidatos que disputam a Presidência. Um embate que, de acordo com ele, nos faz esquecer da dignidade das pessoas e das potencialidades que a crise representa.

Mãe e filho cruzam ponte que liga a Venezuela a Cucuta, na Colômbia.
Crédito: Boris Heger/ACNUR

Dentre os países que estão recebendo refugiados venezuelanos o Brasil está em sétimo lugar. São números expressivos, especialmente quando se leva em conta a realidade em Roraima, porém, quando se compara a situação com países como a Colômbia, que só no ano passado contabilizou 600 mil imigrantes com entrada por postos oficiais, eles se tornam baixos. Jarochinski afirma que a chegada de venezuelanos ao Brasil é bem menor que a média mundial. Contudo, os dados não são conclusivos, o que agrava a polarização e impede a discussão sobre possíveis soluções ou auxílio efetivo para os venezuelanos que estão por aqui.

Não são só os direitos dos cidadãos enquanto imigrantes estão sendo ignorados. Comparando a situação da Venezuela com a do Brasil, o jornalista venezuelano Angel Villarroel Lara, que aceitou ano passado uma proposta de trabalho em São Paulo, questiona se seria possível um brasileiro viver na capital paulista com R$ 20,00 mensais. Ele afirma que o jornalismo local está sendo controlado pelo governo: “Não tem censura, pois não tem mídia. Não se pode falar sobre a rejeição dos políticos”.

O jornalista venezuelano Angel Villarroel Lara, atualmente vivendo em São Paulo.
Crédito: Arquivo pessoal

Entretanto, a oposição ao governo de Nicolás Maduro não teve um posicionamento diferente quando assumiu como maioria na assembleia venezuelana em 2015. Na ocasião, eles não reconheceram o lado oposto.

Segundo Fernando Spiritto, professor de Economia e Políticas Públicas da Universidad Católica Andres Bello (UCAB), em Caracas, os problemas que afetam a população são resultantes de uma crise econômica causada pela dependência que a Venezuela tem do petróleo, seu principal recurso, que por sua vez é muito afetado pelos preços internacionais. Para o professor, as políticas econômicas fracas ao longo dos anos determinaram as circunstâncias em que o país se encontra e, consequentemente, o grande fluxo migratório em busca de melhores condições de vida. “Não há uma solução imediata. Seriam necessárias medidas de longo alcance e em todas as frentes. Elas implicam um novo modelo político e econômico”, avalia Fernando, ressaltando que é preciso discutir a política além de lados e partidos.

Para o professor Jarochinski, as ações de natureza antidemocrática têm se tornado recorrentes pelo governo Maduro e setores, como as forças armadas, que acabam obtendo um enorme poder político. Essas ações poderão gerar um quadro ainda mais complicado para a reconstrução do país no futuro. Futuro que parece no mínimo desanimador para vários cidadãos venezuelanos, como Odalis Uribe. “Nosso país está no chão. Então, para que nosso país se levante vai ser preciso passar muitos anos”, lamenta.

Marco da fronteira entre Brasil e Venezuela, entre Pacaraima e Santa Elena de Uairén.
Crédito: Rodrigo Borges Delfim/MigraMundo

Mesmo com uma perspectiva ruim ainda lhe resta esperança. Ela veio para a cidade de São Paulo por conta de uma oferta de trabalho feita a seu marido pouco antes da situação na Venezuela se agravar, e atualmente é professora em escolas de idiomas. Diante da necessidade de familiares e amigos, começou no ano passado um projeto que envia remédios, itens de higiene pessoal e roupas para grupos de venezuelanos sem recursos em Roraima. A prioridade para Odalis é olhar para as pessoas, para mais do que suas opiniões, olhar suas necessidades. “Entre venezuelanos e brasileiros, vamos conseguir ajuda para todos que precisam”, finaliza.

Laura Marcondes, Lorena Trevelin e Victoria Ferreira são estudantes do terceiro ano do curso de Jornalismo na Universidade Mackenzie. A reportagem está disponível no MigraMundo por meio de uma parceria entre o portal e a professora Patrícia Paixão, do corpo docente da instituição

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