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segunda-feira, dezembro 9, 2024

Projeto brasileiro com mulheres refugiadas é destaque em conferência da ONU

Por Carla Trabazo e Rodrigo Borges Delfim
*Reportagem em parceria entre o site Diplomacia Civil (Instituto Global Attitude) e o MigraMundo

Vivendo uma das suas piores crises humanitárias, o mundo enfrenta um crescimento alarmante de refugiados. Segundo o Alto Comissariado das Nações Unidas para Refugiados (ACNUR), o número chegou a 20 milhões ainda na metade de 2015, aumentando em 78% as solicitações de refúgio em comparação ao mesmo período de 2014.

No Brasil, o cenário também foi de crescimento: em menos de cinco anos o número de solicitações aumentou quase quinze vezes, de 566 em 2010 para 8.302 até outubro de 2014, de acordo com estatísticas do ACNUR.

É com esta situação que surge a necessidade de criar iniciativas que auxiliem na inserção, inclusão e adaptação social do refugiado que chega ao Brasil.

Surge, assim, entre outras iniciativas, o projeto piloto Empoderando Refugiadas, criado pelo Grupo Temático de Direitos Humanos e Trabalho da Rede Brasil do Pacto Global, que tem o objetivo de conscientizar e informar às empresas a situação da mulher refugiada – grupo que tende a sofrer mais com o preconceito por ainda envolver uma questão de gênero.

“Vemos no Brasil uma melhor postura em relação ao acolhimento, então começamos a conscientizar as empresas sobre quem é o refugiado, o que é o refúgio, como funcionam seus documentos e as práticas legais sobre a contratação de um refugiado”, explica Vanessa Tarantini, coordenadora de Parcerias e Engajamento da Rede Brasil do Pacto Global.

“Falamos com várias empresas e foi crescendo o movimento de interesse pelo tema. Com isso, começamos o projeto piloto, que tivesse impacto direto, onde promovemos oficinas que empoderem economicamente 20 mulheres. O objetivo é que até o final do projeto [em junho deste ano] elas estejam empregadas e financeiramente auto suficientes”, continua Vanessa.

Parceiros do projeto conversam com empresas para sensibilizá-las à causa do refúgio. Crédito: Pacto Global Brasil/Divulgação
Parceiros do projeto conversam com empresas para sensibilizá-las à causa do refúgio.
Crédito: Pacto Global Brasil/Divulgação

Obstáculos para o trabalho

Uma das maiores necessidades tanto financeira quanto inclusiva do refugiado que chega a um país novo é o emprego. Isso significa a conquista da independência econômica e um ponto de partida para o estabelecimento de sua vida em um território desconhecido.

As dificuldades, porém, começam já no preconceito e desinformação de empresas, das quais a maior parte desconhece o direito do refugiado ao trabalho e que o Protocolo de Refúgio é um documento de identidade válido no país. Por parte dos refugiados e solicitantes de refúgio os desafios se concentram na falta do domínio do português, o desconhecimento da cultura local e, ainda, a dificuldade em comprovar seus estudos e capacidades profissionais, visto que tudo isso, na maioria das vezes, foi deixado no país natal.

É aí, então, que entra o projeto Empodere Refugiadas, sensibilizando empresas em relação à contratação de mulheres refugiadas de vários países e, ainda, realizando sessões de coaching, workshops de direitos, carreira, português e edcucação financeira e encaminhamentos para entrevistas de emprego.

Notoriedade internacional

“O projeto começou a chamar a atenção da sede [localizada em Nova York]. Vendo que estávamos trabalhando com esse tema, em um país ‘inesperado’ para isso, nos tornamos referência. O diretor do Pacto Global, inclusive, disse que o mundo deveria aprender com a experiência do Brasil”, explica Vanessa.

O projeto faz tanto sucesso que na última semana a Rede Brasil do Pacto Global foi convidada a participar do Fórum Global da Aliança das Civilizações da ONU (UNAOC, na sigla em inglês), entre 25 e 27 de abril, na cidade de Baku, no Azerbaijão.

Sob o tema “Vivendo juntos em sociedades inclusivas: um desafio e um objetivo”, Vanessa Tarantini foi até a ex-república soviética para fazer parte do painel de discussão sobre o papel e a responsabilidade do setor privado em relação à crise de refugiados.

Ao lado de outras duas representantes do Pacto Global e de grandes nomes, como o Secretário-Geral da ONU Ban Ki-moon, Vanessa apresentou o projeto piloto ao mundo.

“Recentemente, fomos chamados em Nova York para um evento sobre empoderamento da mulher e expomos o projeto – provavelmente por isso fomos chamados para esse fórum no Azerbaijão, temos exemplos mais reais, em comparação com outras filiais do Pacto. O meu painel tem o caráter de apontar o que as empresas podem fazer além de investimento financeiro ou doações”, explica.

Vanessa se mostra otimista com o impacto e reconhecimento que a apresentação do projeto no fórum pode causar, acreditando que empresas internacionais com filial no Brasil possam incentivá-las a fazer parte do Empodere Refugiadas.

“O fato de chamar a atenção de fora nos fortalece a trabalhar ainda mais com esse tema, que não tem sido fácil. O reconhecimento de fora dá mais legitimidade, o que pode melhorar a vida dessas pessoas do projeto, não com uma perspectiva de pena, pois são pessoas que podem ajudar no crescimento das empresas”, diz.

Empoderando

O projeto, que conta com parceiros como a ONU Mulheres, Centro de Referência para Refugiados da Caritas Arquidiocesana de São Paulo, Programa de Apoio para a Recolocação dos Refugiados (PARR), Fox Time, entre outros, será encerrado em junho e, até então, seis refugiadas foram empregadas, uma conseguiu um espaço para ser a sede de sua própria organização e três estão recebendo orientação da Rede Mulheres Empreendedoras para que possam desenvolver seus negócios.

Entre os parceiros, a Lojas Renner e a Camicado estão flexibilizando seus processos de admissão e integração de colaboradores para que seja possível receber candidatas refugiadas.

Segundo Vanessa, o projeto teve um efeito positivo na vida das mulheres participantes, o que será levado em conta para uma possível continuação da iniciativa.

Refugiadas se qualificam para buscar emprego no Brasil. Crédito: Pacto Global Brasil/Divulgação
Refugiadas se qualificam para buscar emprego no Brasil.
Crédito: Pacto Global Brasil/Divulgação

“A nossa ideia no Brasil é extremamente replicável, qualquer outro ator pode trabalhar com o engajamento de empresas, não só o Pacto Global. Isso não é um tema que estava na agenda das empresas, começou a entrar na cabeça das pessoas após a crise na Síria e o fluxo de pessoas indo pra Europa. Aqui no Brasil o número tem aumentado também e talvez tenha se tornado mais perceptível para as empresas na hora de contratar alguém”, conta Vanessa, que diz ainda que não havia antes uma perspectiva empresarial sobre o refúgio.

Em maio deste ano o Pacto Global estará organizando um evento paralelo ao World Humanitarian Summit, em Istambul (Turquia), para falar sobre como o setor privado pode contribuir para o lado humanitário, mostrando que a importância deste tema é global e deve ser levada a todos os cantos do mundo.

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