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segunda-feira, novembro 25, 2024

Sírios citam segurança e documentação ao optarem por refúgio no Brasil

Residentes nas cidades de Curitiba e São Paulo contaram um pouco da trajetória que os trouxe até o Brasil

Por Debora Draghi
Em Curitiba (PR)

*Nomes dos entrevistados foram trocados de forma a preservar a identidade de cada um

Já são 5,3 milhões de sírios deslocados de suas casas desde quando a guerra eclodiu no país, em 2011 (UNHCR 2016, 07). Num primeiro momento, muitos deles se mostraram relutantes em sair. Mas ao longo dos anos, com chances de que a paz diminuísse e as condições se tornassem mais difíceis, muitos sírios optaram por partir, para encontrar uma vida pacífica, longe da situação brutal.

Parte do deslocamento aconteceu internamente, mas milhares decidiram ir mais longe, tentando chegar à Europa – a maioria por meio da travessia pelo mar Egeu, entre Turquia e Grécia. Para os sírios, o continente europeu significaria um lugar não tão longe de casa que supostamente, forneceria tudo o que precisam. Entretanto, muitos países europeus tornaram a entrada mais difícil, obstaculizando vistos e tornando a jornada mais perigosa e arriscada para os refugiados.

Por outro lado, o Brasil abriu suas fronteiras para os sírios através do Programa de Visto Humanitário (ACNUR 2016, 01), em 2013. Até junho de 2017, 3.772 sírios haviam solicitado refúgio no Brasil (Secretaria Nacional de Justiça 2017, 03). No entanto, diferente da Europa, o Brasil fica a 11 mil quilômetros de distância da Síria e a maior parte da assistência é concedida pela sociedade civil. A cultura tem muitas diferenças e as lutas não param quando os refugiados chegam no Brasil.

Assim que chegam como turistas, os sírios podem ir à Polícia Federal, pedir asilo, obter um protocolo, uma autorização de trabalho e um documento de identificação nacional. Desde 2013, 100% dos pedidos de asilo feitos pelos sírios foram aceitos no Brasil. (ACNUR 2014, 4). Eles recebem status legal e proteção.

Os sírios que vêm para o Brasil na maioria das vezes passam por uma entrevista no Consulado no Líbano, geralmente respondendo por que querem se mudar para o Brasil, suas profissões e sua rede de contatos. O processo demora menos de 2 semanas, permitindo-lhes recomeçar uma nova vida na América do Sul – outras nacionalidades, no entanto chegam a passar anos até terem seus pedidos de refúgio avaliados pelo governo brasileiro.

Embora os entrevistados tivessem dinheiro para pagar um atravessador que os levassem até o continente europeu, ainda assim decidiram não colocar suas vidas e as de seus familiares em risco e as incertezas se estenderiam no pós travessia. Desse modo, ao saberem das fronteiras abertas no Brasil e de um processo relativamente fácil, decidiram vir para a América do Sul, apesar do país não oferecer nenhuma estrutura e deixar que os imigrantes recomeçassem suas vidas com recursos próprios, sem falar português e com dificuldades que atrasam o processo de integração.

“Chegar até a Europa não seria uma rota normal, eu teria que encontrar alguém da máfia para atravessar. Da Turquia para o mar e de lá para a Grécia. As pessoas morrem no mar e é muito problemático. Chegar até o Brasil era fácil, normal, eu poderia ter meu visto, não como na Europa. Eu não queria ficar irregular na Europa”, disse Jamil* sobre a vinda ao Brasil.

Tapeçaria de parede árabe na inauguração do restaurante Talal Culinária Síria, em São Paulo (abr.2016).
Crédito: Rodrigo Borges Delfim/MigraMundo

Quando se trata de riscos de vida, mudar para o Brasil é definitivamente uma rota mais segura se comparado a entrar em um barco para tentar alcançar a Europa. “Meu marido e eu queríamos ir para a Europa, mas precisávamos pegar um barco e eu não queria isso, então descobrimos o Brasil através de um amigo e viemos”, contou Samira*.

Comparativamente, chegar seguro no Brasil significa que todas as despesas serão pagas pelo migrante. Portanto, pode-se dizer que os sírios migraram sabendo que seria seguro, mas não para maximizar seus meios financeiros.

“Eu pedi asilo para 25 países diferentes, e nenhum deles aceitou a mim e toda a minha família, apenas o Brasil. Então nós viemos”, relata Said*.

O Brasil não foi a primeira escolha dos sírios, mas era claramente um país mais mais aberto e fornecia toda a documentação de forma regular.

“Eu pedi asilo na Austrália, e eles disseram que levaria 2 anos para processar o meu pedido e dar uma resposta, era muito tempo e não podia esperar. Mas o Brasil abriu as fronteiras para os sírios em 2013 e nós viemos”, lembra Omar*.

Era uma questão de não querer aguardar por muito tempo a resposta de outros países e de estar em situação regular em um país que oferece essa possibilidade. O Brasil disponibiliza uma decisão rápida vinda de seus consulados no Oriente Médio , uma viagem segura, documentos que garantem direitos como de qualquer outro cidadão nacional e lhes permite trabalhar. Os sírios queriam estar em situação regular, continuar trabalhando e sendo seguros durante toda a jornada. O dinheiro que pagariam por passagens para o Brasil era basicamente o mesmo valor que pagariam para um atravessador. No entanto, não havia garantia de que fariam a travessia até a Europa em segurança, enquanto que no Brasil havia uma garantia de viagem segura e direitos legais quando em território nacional.

Assim sendo, é relevante ressaltar que a segurança foi uma palavra-chave para os refugiados entrevistados. No entanto, não era apenas chegar em segurança: era ter todos os documentos, pertencer a uma nação e poder ter um emprego, ter os mesmos direitos que os cidadãos nacionais e ter a chance de reiniciar uma nova vida. Mas o Brasil não foi uma primeira escolha para nenhum deles, foi simplesmente o país aberto que lhes permitiu escapar da Síria.

Desse modo, reunindo as políticas hostis de países no Hemisfério Norte, as fronteiras abertas no Brasil, o medo de embarcar em uma jornada perigosa, contatos sociais disponíveis e os meios econômicos suficientes para a maioria deles, foi possível verificar que todas essas possibilidades, principalmente reunidas, levaram os sírios a escolher o Brasil como um novo país para se estabelecer.

Referências:

ACNUR. 2016. Brasil tem quase 9 mil refugiados de 79 nacionalidades. http://www.acnur.org/portugues/noticias/noticia/brasil-tem-quase-9-mil-refugiados-de-79-nacionalidades/

ACNUR 2015, “Deslocamento forçado atinge recorde global e afeta uma em cada 113 pessoas no mundo. http://www.acnur.org/portugues/noticias/noticia/deslocamento-forcado-atinge-recorde-global-e-afeta-uma-em-cada-113-pessoas-no-mundo/

ACNUR 2014, Refúgio no Brasil: uma Análise Estatística. http://www.acnur.org/t3/fileadmin/Documentos/portugues/Estatisticas/Refugio_no_Brasil_2010_2014.pdf?view=1

Secretaria Nacional de Justiça, 2017.

UNHCR 2016, “Mid Trends 2016. http://www.unhcr.org/statistics/unhcrstats/58aa8f247/mid-year-trends-june-2016.html

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