É de grande importância conhecer e tornar conhecidas as diversas ferramentas disponíveis para atendimento e orientação aos migrantes em São Paulo e outras localidades. Por isso, o MigraMundo reproduz abaixo mais esta matéria do parceiro Sefras (Serviço Franciscano de Solidariedade), entidade gestora do Centro de Acolhida para imigrantes da Prefeitura de São Paulo, que inclui o CRAI (Centro de Referência e Acolhida para o Imigrante).
Atendimento aos imigrantes: Solidariedade sem fronteiras
Quem passa no centro de São Paulo, percebe como aumentou o número de imigrantes na cidade. A chegada de outros hermanos latino-americanos, como já de costume, foi somada à vinda de africanos, sírios e outras tantas nacionalidades que deram um sotaque diferente ao ‘burburinho’ da região central. Atento a esta realidade, o Serviço Franciscano de Solidariedade (Sefras) fez-se sensível e colocou-se na disposição franciscana de acolher e orientar quem chega dos lugares distintos, numa tentativa fraterna de garantir sua dignidade construindo, assim, a solidariedade que desconhece fronteiras por meio do Crai.
Uma referência para os imigrantes
Quem chega ao Centro de Referência e Acolhida para o Imigrante (Crai), localizado no bairro da Bela Vista, em São Paulo, é acolhido e passa por uma triagem. Em seguida, o imigrante é encaminhado ao atendimento na língua materna de seu país. É preenchida uma ficha com informações essenciais sobre a sua situação, como: data de chegada, documentação e situação imigratória. A pessoa pode ser encaminhada ao setor jurídico para regularizar a sua situação e, se desejar, ao atendimento psicológico para obter orientações sobre suas dificuldades emocionais. Além disso, os imigrantes também são encaminhados para outros serviços públicos, direcionados de acordo com a suas necessidades.
“Quando você está em um lugar que não é seu, o primeiro medo que aparece é entrar em contado com as pessoas. Você pensa: ‘Será que ele vai me ajudar? Será que ele vai falar comigo?’ Mas, quando você chega em um lugar como esse e encontra alguém que fala a sua língua, que tem características similares ou características que não são daqui, a pessoa tem mais confiança”, afirmou o atendente do Crai, Wibert Rivas, que é boliviano. “Sempre brinco com os imigrantes: ‘este espaço não é um espaço que você vem procurar uma orientação, esta aqui é a sua casa’. Para nós, é muito bom isso, pois, conseguimos identificar a real demanda que ele tem, porque às vezes vem procurar uma coisa, mas na verdade, o que ele precisa é outra” destacou.
Solucionando demandas
A assessora jurídica do Crai, Cíntia Freitas, contou uma das primeiras conquistas da solidariedade com os imigrantes atendidos. Foi o caso de dois africanos, o marido de Uganda e a esposa de Angola. Estão no Brasil há quase cinco anos e não possuem nenhum documento brasileiro. “Identificamos o caso dele e percebemos que poderiam solicitar o refúgio aqui no Brasil e isso era uma informação que ele nunca tinha tido antes”, expôs. Depois de ter conseguido regularizar sua situação e obter o protocolo de refúgio, ele teve que retornar ao Crai, pois, não estava conseguindo abrir uma conta bancária. “Providenciamos uma documentação, um acordo que foi estabelecido entre a Secretaria de Direitos Humanos da cidade de São Paulo, com o Banco do Brasil e a Caixa Econômica Federal e providenciamos uma carta para que ele levasse ao banco. Nesta semana ele me ligou dizendo que havia conseguido abrir a conta”, comemorou.
A advogada explicou como funciona o atendimento jurídico. “Fazemos primeiro um agendamento porque a demanda aqui é grande e precisamos organizar o fluxo. Preciso tomar conhecimento do caso, para quando a pessoa retornar, possamos fazer o encaminhamento”. Não existe um tempo específico para o atendimento, pois ele varia de caso a caso. De acordo com Cíntia, a assessoria jurídica, não descansa enquanto não resolver o caso. “Tem casos desde quando a gente inaugurou em novembro (2014), que eu ainda atendo. A pessoa continua vindo aqui para ser orientada” destacou. Processo parecido ocorre também com o atendimento psicológico.
Desafios da imigração no Brasil
Seja no âmbito jurídico, social ou político, a imigração é um desafio. Para o coordenador do Crai, Cleyton Borges, muito ainda precisa ser feito e discutido coletivamente. “O primeiro é fortalecer na sociedade, a visão que o imigrante é autônomo, e, que ele pode ser protagonista da sua história. Tem condições por si só de enfrentar os desafios de estar em uma cidade que ele não conhece, em um país diferente do seu”, considerou.
Para Cíntia Freitas, no que tange a área do direito, a legislação do Brasil apresenta-se arcaica. “Nossa legislação é muito fechada, e um de nossos desafios é quando alguém não é abarcado pela legislação brasileira. Existem algumas convenções internacionais, como por exemplo, a convenção internacional de trabalhadores imigrantes. Alguns países já ratificaram e assinaram, entretanto, o Brasil, nem signatário é, e, essas convenções não tem efeito jurídico no país” explicou.
A lei de imigração no Brasil data de 1980 ainda do período da ditadura.
Mãos que dão força para protagonizar a história
De acordo com Cleyton Borges, o trabalho das instituições sociais não é o suficiente. “Não achamos que cabe às organizações sociais continuar fazendo este trabalho, mas sim, fortalecer os diversos níveis de governança para que exista uma política nacional de imigração que contemple as realidades dos imigrantes”, afirmou. E acrescentou ainda, “não podemos ver o imigrante como alguém que precisa apenas de documento ou trabalho, mas, precisamos entendê-lo como alguém que precisa alcançar os direitos humanos em plenitude”.
No ano em que o Sefras completa 15 anos da rede franciscana de solidariedade com os empobrecidos, o serviço com os imigrantes alarga além-fronteira esta atitude. “Entendemos que a solidariedade atende todo o perfil de pessoas, nacionalidade e situação, desde aquele que não possui moradia ao que enfrenta preconceito” concluiu Borges.
O perfil dos atendidos no Crai
A faixa etária dos atendidos no Crai concentra-se entre os 19 e 39 anos, um público jovem e em idade considerada “produtiva” para o mercado de trabalho. Em relação à raça/cor, a grande maioria (68%) se declarou “preta”.
De acordo com dados oferecidos pelo Crai, os imigrantes, oriundos do Gongo e do Haiti foram os mais atendidos neste primeiro trimestre de funcionamento.
Quanto à escolaridade, 44% tem Ensino Médio, 28% tem Ensino Superior e, 19%, Ensino Fundamental. Entre as formações e atuações profissionais dos imigrantes destaca-se em primeiro lugar a construção civil, seguida de mecânica e informática. A situação migratória da maioria é de refugiados.
Sobre o Crai:
O Crai é um serviço público, pioneiro no Brasil, gerido pelo Sefras em parceria com a Secretaria Municipal de Direitos Humanos e Cidadania da Prefeitura de São Paulo. Dispõe de atendimento para 200 pessoas por mês com o serviço de regularização de documentação, intermediação de trabalho, prevenção de trabalho escravo, formação (profissional e em idiomas), orientação jurídica, e ainda, encaminhamentos de saúde e apoio psicológico. Funciona de segunda a sexta-feira, das 8h às 17h. Ambos os serviços prestam atendimento em seis idiomas (inglês, espanhol, português, árabe, francês e creole).
Texto: Fabiano Viana e Vinícius Fabreau
Edição: Fabiano Viana
Publicado originalmente em: http://www.sefras.org.br/portal/9887.html
Centro de Referência e Acolhida ao Imigrante
Rua Japurá 234 – Bela Vista, São Paulo (SP)
(próximo ao metrô Anhangabaú e à Câmara Municipal de São Paulo)
Telefone: (11) 3113-0074