Iniciativa que apoia projetos culturais em São Paulo já ajudou a tirar do papel projetos desenvolvidos por imigrantes e/ou que debatem a migração
Por Rodrigo Veronezi
Em São Paulo
O Programa para a Valorização de Iniciativas Culturais (VAI), da Secretaria Municipal de Cultura de São Paulo, está com inscrições abertas para a edição 2019, nas modalidades VAI 1 e VAI 2. O prazo vai até 11 de março.
Criado em 2003, o programa visa selecionar projetos e apoiar financeiramente grupos e coletivos formados, principalmente, por jovens de baixa renda e de regiões da cidade desprovidas de recursos e equipamentos culturais.
Segundo informações da Prefeitura, nos últimos cinco anos mais de 1000 projetos foram contemplados nas modalidades 1 e 2, que selecionam, respectivamente, propostas de coletivos formados por jovens entre 18 e 29 anos ou que tenham no mínimo dois anos de existência.
Para o VAI 1, os projetos devem ter um orçamento limite de R$ 40.750,00 e duração máxima de 8 meses; no VAI 2, o teto sobe para R$ 81.500, também com duração de até 8 meses – neste caso, é preciso ainda que o coletivo comprove, no mínimo, dois anos de existência e atuação em regiões do Município desprovidas de recursos e equipamentos culturais ou que já tenham sido contemplados na modalidade VAI I.
Mais informações podem ser obtidas no site do programa e nas redes sociais do VAI
Nos últimos anos, o programa tem aberto espaço e apoiado ações desenvolvidas direta ou indiretamente por migrantes. Em 2018, pelo menos três projetos abordavam a temática migratória e/ou contavam com migrantes na equipe.
Um desses projetos é o Cinema Jenin, do coletivo Ninho de Vespas – formado por migrantes, refugiados e brasileiros. A partir de uma peça teatral que deve ficar pronta nos próximos meses, o grupo vai abordar a questão palestina sob a reflexão do quão legítima é uma guerra e de que formas pode-se lutar para sair dela. Jenin, aliás, é o nome de uma cidade palestina.
“Ele [o programa VAI] faz o que se propõe de fato, que é estimular a criação e participação dos pequenos produtores e/ou artistas da cidade, de uma forma ou outro incluindo-os no panorama cultural da cidade”, diz a produtora cultural colombiana Daniela Solano, uma das integrantes do coletivo. Ela também integra o coletivo Visto Permanente, que deu seus primeiros passos com a ajuda de um outro edital de cultura, o programa Redes e Ruas.
Daniela deixa uma dica importante para quem tem interesse em apresentar projetos ao VAI: participar dos encontros de formação sobre o projeto.
“Façam os cursos que o próprio VAI está promovendo. Porque apesar de ser um edital ótimo, nem todos temos acesso à linguagem dos editais e como devem ser escritos. Se informem, se formem, mas não deixem de se inscrever”.
O próximo encontro – o último antes do fim do prazo – está agendado para 8 de março, no bairro do Capão Redondo (zona sul).
Daniela recomenda, no entanto, que o imigrante proponente do VAI tenha paciência para lidar com trâmites e eventuais barreiras burocráticas.
“Eu mesma não consegui ser proponente do VAI [em 2018] pois no período de inscrição eu estava renovando meu documento e tinha em mãos o protocolo apenas. Apesar de morar no país há mas de 15 anos, não aceitaram meu protocolo como documento válido”.
Além do Cinema Jenin, o VAI também já contemplou outros projetos tocados por imigrantes, como Ecos Latinos, Microcine Migrante e Lakitas Sinchi Warmis.
VAI TEC recebe inscrições até 6 de abril
O crescimento do VAI ao longo do tempo deu origem a um “filhote”: o VAI TEC, focado em ações tecnológicas que possam exercer impacto nos locais em que estão inseridos. O programa chega à sua quarta edição em 2019.
Para esta modalidade, as inscrições começam em 8 de março e terminam em 6 de abril, e devem ser feitas no portal do VAI Tec (acesse aqui).
Serão selecionados 24 projetos, que receberão aporte de R$ 33,1 mil cada, além de um programa de aceleração com duração de seis meses – início estimado para meados de junho.
O VAI TEC também já beneficiou projetos idealizados por imigrantes. Dois deles foram os aplicativos Além das Fronteiras, de Wilbert Rivas (peruano de nascimento e criado na Bolívia), e o Guia do Imigrante, desenvolvido pelo comunicador boliviano Antonio Andrade – responsável pelos já conhecidos portais Bolívia Cultural e Planeta América Latina.
“Ser contemplado pelo VAI TEC ampliou a autoestima da equipe do Bolívia Cultural. Além do incentivo, foi uma amostra de que podemos desenvolver outros projetos e de mostrar que estamos em evidência, que podemos [imigrantes] ser inovadores”.
Além do apoio financeiro, Andrade destaca prestação de contas exigida pelo VAI TEC como um legado importante do programa, fazendo com que o projeto contemplado se organize para atender a esse requisito.
“Isso ajudou muito não só a organizar o projeto, mas também o restante dos projetos [Bolívia Cultural e Planeta América Latina]. Conseguimos ter uma consciência maior de organização, de transparência de aplicar os recursos. Foi um aprendizado de enorme importância que hoje conseguimos aplicar em outras ações”.
Ocupar espaços
Tanto Daniela como Andrade destacam a importância de os imigrantes que vivem em São Paulo de buscarem programas de fomento cultural e tecnológico que permitem a participação de imigrantes.
“Temos que ocupar estes espaços e políticas públicas, temos que ocupar nosso lugar de fala”, destaca Daniela.
“Pretendo incentivar outros imigrantes a participarem. Tem muita gente qualificada também entre os imigrantes, que pode competir de uma forma saudável com as outras ideias apresentadas [tanto ao VAI como ao VAI TEC]. A sociedade como um todo – e não apenas os imigrantes – só tem a ganhar com os resultados”, completa Andrade.