Fruto da pressão da sociedade civil, decisão tem efeito direto sobre migrantes da Venezuela em Roraima
Por Rodrigo Borges Delfim
Atualizada em 03/03/17
O CNIg (Conselho Nacional de Imigração) publicou novamente nesta sexta-feira (03/02) a Resolução Normativa 125/2017, que permite concessão de residência temporária para migrantes que entraram no Brasil por via terrestre e sejam naturais de nações que tenham fronteira com o Brasil.
A resolução permite a solicitação de residência temporária no Brasil de migrantes oriundos de países fronteiriços e para os quais ainda não esteja vigorando o Acordo de Residência para Nacionais dos Estados Partes do Mercosul e associados – no caso, Venezuela, Guiana, Guiana Francesa e Suriname.
A proposta tinha sido publicada originalmente no Diário Oficial da União no dia 22 de fevereiro, mas no dia seguinte o CNIg voltou atrás e invalidou a proposta. Segundo o Conselho, a proposta precisava ainda de ajustes, que foram feitos.
Recentemente, o Peru aprovou uma norma que permite a concessão de Autorizações Temporárias de Permanência para venezuelanos que migraram em razão da crise social.
A republicação da resolução do CNIg acontece às vésperas da missão agendada para os dias 8, 9 e 10 de março em Roraima. Nela, representantes de organizações públicas, organismos internacionais e sociedade civil estarão no Estado para conhecer melhor a situação dos migrantes no Estado. A agenda de atividades contará com encontros com órgãos do poder público federal, estadual e municipal, visita a locais onde estão vivendo esses migrantes, além de uma ampla audiência pública.
Vitória da sociedade civil
A medida atende a pedidos do Ministério Público Federal, Ministério Público do Trabalho e Defensoria Pública da União que, em conjunto com diversas entidades da sociedade civil, pediam uma resposta rápida e humanitária à situação vivida por venezuelanos na fronteira com o Estado de Roraima.
“Acreditamos que a melhor solução seja a concessão de residência, facilitando, assim, a solução para a vida destes imigrantes, bem como evitando acumular mais processos junto ao Conare (Comitê Nacional para Refugiados) que já possui uma grande demanda pendente de análise. Por outro lado, dever-se-á sempre assegurar a quem o desejar o direito de pedir refúgio e de ter o processo analisado devidamente pelas instâncias próprias”, argumenta o documento assinado pelas entidades.
A carta foi assinada por: Caritas Arquidiocesanas de São Paulo e Rio, IMDH, Missão Paz, Conectas, Fundação Avina e Instituto Igarapé, além do Ministério Público do Trabalho, Defensoria Pública da União e Ministério Público Federal. Outras entidades que não assinaram o documentos também ajudaram a pressionar o CNIg em favor de uma resolução para a situação em Roraima.
“A regularização migratória tem vantagens evidentes, como a possibilidade de documentação desses migrantes e de condições de ingresso no mercado formal de trabalho”, destaca o procurador federal dos Direitos do Cidadão adjunto João Akira Omoto, em entrevista ao site da instituição.
Para o gestor público João Guilherme Granja, especialista em migrações e refúgio, a medida representa um grande avanço. “O principal ponto positivo é não ter sido uma resolução estreita, que criasse mais uma situação “extraordinária” pensando num único país ou outro. É positivo que ela atende ao principal ponto de preocupação humanitária atual na região, que é notório no Estado de Roraima, com o aumento dos fluxos de pessoas da Venezuela. É especialmente adequado para promover uma documentação sustentável e duradoura para essas populações”.
Granja destaca ainda o papel da sociedade civil para aprovação da resolução, em uma articulação semelhante a que tem pautado a tramitação da nova Lei de Migração no Congresso. “Esse pessoal [as entidades] estão mantendo uma articulação bem profunda e chegou a fazer audiências em janeiro para organizar um plano e cobrar uma atitude do CNIG. É grande o esforço da sociedade civil e essa articulação foi fundamental para a resolução sair”.
Pontos a observar
Apesar do avanço que a resolução representa, Granja cita dois pontos que merecem uma observação.
Um deles diz respeito ao fato do texto limitar a decisão somente os casos de migrantes que entram no Brasil por terra, excluindo o ingresso por via área, por exemplo. O outro ponto se refere à documentação exigida dos migrantes e o fato de parte deles serem indígenas, que podem nunca chegar a ter tais documentos.
“Seria interessante desenvolver alguma forma mais especifica para lidar com esses casos, envolvendo os órgãos especializados das políticas para essa população”, opina Granja. Para o primeiro caso, o especialista sugere que a norma não se limitasse ao ingresso via terrestre e contemplasse também a via aérea, considerada mais segura.
Mudanças no CNIg
A Resolução Normativa 125/2017 foi a última do CNIg sob a presidência de Paulo Sérgio de Almeida, que teve sua exoneração do cargo publicada no Diário Oficial da União da última segunda-feira (20). Em seu lugar, assume Hugo Gallo, atual coordenador geral de imigração do Ministério do Trabalho.
O MigraMundo vai acompanhar a mudança e, em breve, vai trazer entrevistas tanto com Paulo Sérgio de Almeida como com Hugo Gallo.
[…] A invalidação da Resolução Normativa 125 pegou de surpresa entidades da sociedade civil e do Ministério Público. Há meses elas reivindicavam uma resposta humanitária para a situação dos migrantes venezuelanos em Roraima e comemoravam a publicação da norma, considerada um grande avanço (leia mais aqui). […]