Por Dolores Guerra
O coletivo A Voz do Congo organizou uma performance no último domingo (24) na avenida Paulista, em São Paulo, para quebrar o silêncio quanto ao genocídio que acontece no país há quase tres décadas. Os embates ocorrem pela disputa de controle de regiões mineradoras, atraindo o interesse de seus vizinhos, como Ruanda, além de países do norte global.
Deitados ao chão, envoltos na bandeira congolesa e em tinta vermelha, os manifestantes foram embalados pelo canto e por palavras-de-ordem. A artista congolesa Prudence Kalambay representou a mulher de seu país, cujo corpo é transformado em praça de guerra.
A violência e exploração sexual contra meninas e mulheres é cometida de forma indiscriminada tanto pelos grupos armados, que desejam provocar o deslocamento forçado, como pelas forças de segurança do Estado. Segundo a ONU, cerca de 10 mil pessoas acessaram serviços de apoio para vítimas de violência baseada em gênero (VBG) em Kivu do Norte durante o primeiro trimestre de 2023, representando um aumento de 66%.
De acordo com dados da ONU, a República Democrática do Congo atualmente registra 6,2 milhões de deslocados forçados internos e 1,3 milhão de refugiados. A situação é considerada uma das crises humanitárias mais complexas e longas do continente africano.
Apoios
A manifestação contou com representações da Cáritas, do Conselho Municipal de Imigrantes (CMI) e do CAMI (Centro de Apoio e Pastoral do Migrante), assim como de membros de outras comunidades migrantes. O ex-candidato a deputado estadual, Abdul Jarour, participou da manifestação demonstrando sua solidariedade ao povo congolês, com quem estabeleceu proximidade desde que se refugiou no Brasil, em 2014, devido à guerra na Síria (iniciada em 2011).
Jarour acredita que a tendência conciliatória da diplomacia brasileira poderia auxiliar nos debates de paz para aquela região e defende a criação de um visto humanitário que garanta a reunificação familiar. O ativista sírio nutre esperanças quanto às conquistas que possam alcançar com a COMIGRAR deste ano, para que se possa implementar o “acolhimento necessário, com olhar humanizado aos refugiados e pessoas migrantes”.
A segunda edição da Conferência Nacional de Migrações, Refúgio e Apatridia (COMIGRAR) acontecerá em junho e terá como tema “Cidadania em Movimento”. O evento, que ocorreu pela primeira vez em 2014, pretende aprofundar o debate sobre migrações, propor e discutir diretrizes para políticas públicas, promover a participação social e política dessas populações, além de fomentar a integração entre organizações e instituições envolvidas na pauta.
Outras manifestações
Não é a primeira vez que a comunidade congolesa vai às ruas para denunciar o genocídio no país natal. Em setembro de 2020, em plena fase aguda da pandemia de Covid-19, o mesmo coletivo A Voz do Congo reuniu ao menos 80 manifestantes em uma intervenção artística no Largo da Batata, também em São Paulo, com essa finalidade.
Por conta da pandemia da Covid-19, então vigente, medidas de segurança foram tomadas pelos organizadores – máscaras de proteção e álcool gel eram ofertados aos participantes com a constante recomendação de distanciamento. Todos estavam com camisetas pretas em sinal de luto, com dizeres sobre a situação do país.
O ato de 2020 ainda teve referências ao movimento Black Lives Matter (Vidas Negras Importam), no qual todos apareceram ajoelhados e com punhos levantados, fizeram 1 minuto de silêncio em homenagem às milhões de vítimas do conflito em seu país de origem. Todos cantaram em francês o hino nacional e entoaram sucessivos cantos pedindo justiça.
Em 2016, os congoleses que vivem no Rio de Janeiro aproveitaram o Dia da Consciência Negra (20 de novembro) para mostrar sua voz e protestar contra a guerra que há décadas afeta a terra natal e causa deslocamentos forçados e derramamento de sangue sobre seu povo.