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sexta-feira, novembro 22, 2024

Crise humanitária no Sudão segue gerando deslocamentos forçados e sem perspectiva de resolução

Por Julia Santos

Desde abril de 2023, o Sudão sofre com a maior crise humanitária de sua história. Como consequência de uma guerra civil entre grupos paramilitares e facções vinculadas ao governo, o país enfrenta episódios contínuos de violência e negligência. O conflito está entre os mais violentos do continente africano – que é palco de oito das dez piores crises humanitárias da atualidade – e já causou o deslocamento forçado de mais de 7 milhões de pessoas. O Sudão, inclusive, aparece no topo dessa lista, elaborada pela ONG International Rescue Comitee (IRC).

Além das questões geradas pelos embates militares e seus desdobramentos, o país do norte da África ainda lida com fatores climáticos e sanitários que potencializam a crise humanitária. Desde junho, fortes chuvas e enchentes já afetaram cerca de 317 mil pessoas e deslocaram 118 mil, gerando inclusive o rompimento de uma barragem próxima ao Mar Vermelho. Estima-se que 27 mil casas foram destruídas e acima de 31 mil sofreram danos antes do rompimento da barragem. O Sudão ainda enfrenta uma onda de casos de cólera, que infectou 658 pessoas e matou 28 no espaço de um mês, segundo informações da ONU.

Origens e efeitos do conflito

Após o golpe militar conjunto executado em 2021 por Abdel Fattah al-Burhan, líder das Forças Armadas Sudanesas (SAF), e Mohamed Hamdan Daglo, comandante das Forças de Apoio Rápido (RSF), a guerra civil no Sudão transformou o país em um campo de batalha. As tensões se intensificaram em 2023, quando disputas pelo controle do governo e pelas estratégias de reforma militar se agravaram. O que começou como uma crise política se transformou em uma guerra total e, há mais de um ano, resulta em combates urbanos na capital Cartum e em outras grandes cidades, além de ataques a vilarejos em áreas rurais.

Desde seu início, a guerra tem sido caracterizada por ataques indiscriminados, massacres de civis e uma escassez preocupante de alimentos e medicamentos em todo o território sudanês. Além das áreas urbanas em ruínas, a infraestrutura básica do país, que inclui hospitais e escolas, também foi destruída. Como consequência desses danos, o país conta com milhões de pessoas em necessidade urgente de assistência.

No momento, a maioria dos afetados têm buscado abrigo em campos improvisados nas regiões fronteiriças, onde o apoio é escasso e as condições de vida são extremamente precárias. A falta de acesso a alimentos, água potável e cuidados médicos básicos vem sendo o principal motivo responsável por provocar uma crise de saúde pública entre os refugiados e migrantes sudaneses.

Migração de crise e desafios humanitários

A guerra civil tem forçado milhões de sudaneses a abandonar suas casas. De acordo com a Agência da ONU para Refugiados (ACNUR), mais de 6 milhões de sudaneses foram deslocados internamente desde o início do conflito em abril de 2023. Além disso, cerca de 1,6 milhão de pessoas buscaram refúgio em países vizinhos, incluindo Egito, Chade, Etiópia e Sudão do Sul.

O número crescente de refugiados tem pressionado os governos locais e as organizações internacionais que atuam na região. Atualmente, esses organismos enfrentam dificuldades para atender às necessidades das comunidades afetadas pelo conflito, mas as contribuições ainda são limitadas. As áreas de combate intenso e a insegurança generalizada dificultam o acesso às populações necessitadas, impedindo a distribuição eficiente de alimentos, água potável e medicamentos.

Outro fator que prejudica ações no local é a destruição de infraestruturas essenciais, como estradas e instalações de saúde. A fragmentação do território controlado por diferentes facções e os bloqueios impostos pelos grupos armados complicam a logística da ajuda humanitária, resultando em uma resposta frequentemente inadequada para as necessidades urgentes de milhões de sudaneses deslocados.

Por meio de nota, o ACNUR ainda citou preocupação com uma potencial surto de cólera – que já afeta o país – nas áreas que hospedam refugiados. Além de receber cidadãos de outros países, os estados sudaneses de Kassala, Gedaref e Jazirah abrigam milhares deslocados forçados internos.

Apesar das dificuldades enfrentadas por aqueles que decidem deixar o Sudão, as motivações por trás dos deslocamentos são claras. Além de toda a destruição causada pela guerra, um exemplo da violência praticada na região foi divulgado no relatório ‘Cartum não é segura para as mulheres’, publicado pela Human Rights Watch em julho de 2024. De acordo com o documento, desde o início do conflito, mulheres e meninas que ainda vivem na capital sudanesa têm sido submetidas a casamentos forçados, escravidão sexual e violações coletivas, entre outros crimes que antecedem o femincídio.

Resposta internacional e perspectivas para o conflito

Buscando amenizar os danos causados pelo conflito, a comunidade internacional tem respondido à guerra civil no Sudão com uma série de iniciativas humanitárias e diplomáticas. A resposta é liderada por várias organizações e agências, incluindo a Oficina de Coordenação de Assuntos Humanitários da ONU (OCHA), que tem coordenado a assistência humanitária responsável por ajudar cerca de 19 milhões de pessoas no país.

A Cruz Vermelha e o Crescente Vermelho estão na linha de frente, fornecendo suprimentos essenciais e apoio médico aos deslocados. Outros organismos como UNICEF, Programa Mundial de Alimentos (PMA) e Organização Mundial da Saúde (OMS) também vem oferecendo apoio contínuo à população sudanesa.

Além das organizações internacionais, países e blocos têm contribuído para a manutenção da crise. A União Europeia, por exemplo, destinou mais de 200 milhões de euros em ajuda humanitária até agosto de 2024. Os Estados Unidos e outros governos, como Reino Unido, Canadá e Noruega, também têm prestado apoio financeiro.

No campo das sanções e medidas diplomáticas, o Conselho de Segurança da ONU impôs sanções direcionadas a indivíduos e entidades envolvidas na violência, com a Resolução 2664 (2022) limitando o financiamento do conflito e pressionando por negociações. Os EUA e a UE também adotaram sanções para restringir o comércio de armas e recursos financeiros. Enquanto isso, a União Africana desempenha um papel crucial na mediação das conversações de paz e na promoção de acordos de cessar-fogo.

Apesar das mobilizações, o conflito no Sudão segue sem perspectiva de resolução. Como resultado, a população civil do país continua sendo submetida a um processo de migração forçada.


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