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segunda-feira, outubro 14, 2024

Da política pública à defesa da mulher: alguns dos legados de Oriana Jara para a causa migratória

Há um ano, a luta em prol de direitos e de políticas públicas para migrantes no Brasil perdia uma de suas principais mobilizadoras, a chilena Oriana Jara. Ao MigraMundo, pessoas que trabalharam lado a lado com a ativista destacaram o legado que ela deixou

Por Rodrigo Borges Delfim e Antonella Pulcinelli

Quem vai ao Centro de Referência e Atendimento ao Imigrante (CRAI), na região central de São Paulo, se depara com o nome de Oriana Jara batizando o local. Essa foi uma das formas encontradas para homenagear e reconhecer o legado deixado pela socióloga e ativista chilena, cuja morte aos 75 anos completou um ano nesta quinta-feira (2).

A pedido da ONG Presença de América Latina (PAL), instituição por ela fundada em 2004, uma missa foi celebrada na Igreja Nossa Senhora do Brasil, na zona oeste de São Paulo, para marcar a data.

“Oriana era chilena, mas seu coração era universal. A morte não tem poder sobre ideais tão valorosos”, disse o padre durante o culto religioso.

As palavras do sacerdote na missa vão ao encontro do que expressou o peruano Ives Berger, coordenador do festival cultural Soy Latino, que teve Oriana Jara como grande entusiasta e madrinha. “Ela deixou um legado de amor, solidariedade, sempre disposta a lutar por os imigrantes. Ela não partiu, vive nos corações e sorrisos de cada um de nós”.

Ação por políticas públicas

A trajetória de Oriana começou ainda no Chile e teve continuidade no Brasil, a partir de 1980. Além de ocupar a Presidência de Presença de América Latina e da Rede Espaço sem Fronteiras, a socióloga integrou diversos conselhos e espaços de participação popular no âmbito da capital paulista e do governo estadual de São Paulo.

Entre eles colegiados estão o Conselho Municipal de Imigrantes (CMI) de São Paulo, o Conselho Consultivo da Ouvidoria da Defensoria Pública do Estado de São Paulo, a Comissão Estadual para a Erradicação do Trabalho Escravo (COETRAE), e o Núcleo de enfrentamento ao Tráfico de Pessoas (NEPT).

“Precursora de uma longa trajetória pela defesa das populações imigrantes na cidade de São Paulo, Oriana deixa um legado de resistência e o exemplo de caminhos a serem trilhados, parte deles presentes na elaboração e implementação da Política Municipal para População Imigrante”, ressaltou a colombiana Maria Cristina Estevez, atual tesoureira da ONG Presença da América Latina.

A capacidade de ajudar a converter mobilizações históricas da comunidade migrante em ações concretas por parte do  poder público foi também destacada por Paulo Illes, coordenador de políticas públicas para imigrantes na Prefeitura de São Paulo entre 2013 e 2016 e atualmente representante externo da Organização por uma Cidadania Universal.

“Acho que talvez esse seja o grande legado da Oriana Jara: mostrar que era possível integrar os desejos e lutas dos migrantes à política pública. Sim, ela foi capaz de transformar esses sonhos em política pública. Ela foi minha grande maestra”.

Luta pelas mulheres e empreendedorismo

Oriana foi idealizadora de uma série de ações afirmativas em prol da comunidade migrante, especialmente na defesa e valorização da mulher. Entre elas figuram os projetos: “Mujer eres parte, no te quedes aparte”, que resgata histórias de vida de imigração de mulheres de difernetes países da América do Sul; “¿Y Hora, porque me callo?”, com o objetivo de prevenir e combater toda e qualquer forma de violência de gênero, seja no ambiente doméstico ou externo

Em parceria com a CATWLAC (sigla em inglês para a Coalizão Regional contra o Tráfico de Mulheres e Meninas na América Latina e no Caribe), Oriana desenvolveu, capacitações e materiais didáticos para a prevenção do abuso e prostituição de meninas e mulheres.

Outro ramo no qual Oriana teve atuação foi o empreendedorismo, especialmente por meio do programa Tecendo Sonhos, da ONG Aliança Empreendedora, focado no público migrante

“Sempre aberta a novas ideias e projetos, Oriana não media esforços para construir políticas públicas, articulações e projetos de inclusão. Foi essencial para trazer o olhar das mulheres imigrantes ao programa Tecendo Sonhos, mulheres que possuem seus próprios negócios, construindo diálogo e uma rede de apoio necessária para que pudessem ter autonomia. Contribuiu com a construção das metodologias e todo o desenho e ações de campo com elas”, destacou Cristina Bonjardim Filizzola, diretora da filial de São Paulo da ONG Aliança Empreendedora e coordenadora do Tecendo Sonhos.

Testemunha de grande parte dessa trajetória, a também chilena Rossana Vilugrón, segunda tesoureira da PAL e responsavel pelo projeto de emprendedorismo na organização, resume em poucas palavras o que significa esse legado deixado pela compariota. “A migração em São Paulo e no Brasil devem muito ao ativismo histórico de Oriana Jara”.

Em março de 2014, Oriana escreveu um texto especial para o MigraMundo, em espanhol, sobre o que era ser migrante, a partir de sua vivência pessoal.


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