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terça-feira, dezembro 24, 2024

Dados citados por ministro sobre venezuelanos são duvidosos, diz pesquisador

Suposta redução no número de venezuelanos vivendo em Roraima é novo elemento no jogo de empurra entre autoridades locais e federais em relação à temática migratória no país

Por Natália Scarabotto, Nayra Wladimila e Rodrigo Borges Delfim
Em Boa Vista (RR) e São Paulo (SP)
Atualizada às 11h50 em 23/07/18

O ministro-chefe da Casa Civil, Eliseu Padilha, disse nesta semana que mais da metade (54%) dos 128 mil venezuelanos que entraram no Brasil nos últimos 18 meses já saíram do país. Mas será que esses números estão sendo lidos de forma correta?

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Para Gustavo da Frota Simões, professor do curso de Relações Internacionais da UFRR e que tem acompanhado a questão migratória venezuelana no Estado e no país, essa leitura é, no mínimo, duvidosa.

“O ministro fala que metade já deixou o país, de acordo com os números de entrada e saída. A questão é que não dá para saber se são os mesmos que entraram ou saíram. É um número total de entradas e saídas, o que pode demonstrar uma migração pendular, por exemplo [algo que sempre foi presente em Roraima, devido à proximidade com a Venezuela]. “.

Vista interna do abrigo Jardim Floresta, um dos que foram abertos em Boa Vista para receber os venezuelanos na cidade.
Crédito: Nayra Wladimila/MigraMundo

Troca de farpas

Tanto o governo de Roraima como as prefeituras municipais alegam que não recebem a devida ajuda da União para lidar com a temática migratória no Estado.

O secretário da Casa Civil Estadual de Roraima, Frederico Linhares, acusa o governo federal de “mascarar a realidade” de que “a crise migratória é do país, e não apenas de Roraima”, e que ele [governo federal] precisa assumir o papel de protagonista para resolver a questão.

“O governo federal não pode simplesmente mascarar dados achando que os imigrantes entram e não permanecem aqui. Esses imigrantes precisam ser acolhidos de maneira digna e precisam ser distribuídos pelo país para que possam ter oportunidades, em vez de transformar a cidade de Boa Vista em um campo de refugiados. Isso é desumano com os imigrantes e também com o roraimense e com o brasileiro que vive em Roraima, que têm os serviços públicos seriamente afetados por esse maciço ingresso de pessoas sem planejamento”.

Um levantamento feito pela Prefeitura de Boa Vista entre os meses de maio e junho indicou que cerca de 25 mil venezuelanos residam atualmente na capital roraimense – seja em casas, nos abrigos administrados pela Força Tarefa Humanitária ou mesmo nas ruas e praças da cidade.

Recentemente foi inaugurado ainda um novo abrigo para venezuelanos em Boa Vista, o Rondon 1, destinado às famílias que estão vivendo ao relento nas redondezas da Rodoviária Internacional de Boa Vista e outros locais na cidade. Com ele, chegam a dez o total de abrigos para os migrantes na cidade, todos eles gerenciados pela Força Tarefa Humanitária e pelo ACNUR (Alto Comissariado da ONU para Refugiados).

Teoria e prática distantes

Simões lembra que há, sim, venezuelanos que usam o Brasil como ponto de passagem para outros países, mas acrescenta que a fala do ministro Padilha é mais um elemento do jogo de empurra que as autoridades locais e nacionais estão fazendo com a migração.

“Ao dizer que metade já foi embora, o ministro esvazia os pedidos por recursos vindos principalmente das prefeituras e do governo estadual”.

Enquanto isso, em Boa Vista, a realidade difere do discurso do ministro Eliseu Padilha. Desde dezembro há venezuelanos compartilhando o antigo prédio da Secretaria Estadual de Administração (Segad), interditado após um incêndio. Alguns alugam kitnets quando conseguem uma renda mínima. Ainda há quem more na rua: no quarteirão em frente ao abrigo Jardim Floresta, na zona oeste da cidade, mais de cem pessoas acampavam em pequenas barracas de lona e palete, com espaço para um pouco mais do que um adulto deitado.

Sem opção e com abrigos lotados, venezuelanos improvisam acampamento na rua em Boa Vista.
Crédito: Natália Scarabotto

As roupas secam nos muros vizinhos. Os alimentos vêm de uma igreja ao lado e também dos próprios refugiados, que cozinham em latas de tinta apoiadas em pedras e grades de ventiladores, formando um fogão à lenha improvisado. O banheiro é compartilhado pela igreja, mas há uma mangueira na calçada para que alguns deles tomem banho.

Enquanto as autoridades locais e federais continuam o jogo de empurra sobre as responsabilidades em relação à temática migratória venezuelana, os migrantes continuam em situação fragilizada, ainda mais sujeitos a abusos de todo o tipo. Um cenário que também é potencializado pela polarização ideológica que recai sobre a questão no Brasil, e pela proximidade com as eleições estaduais e presidencial neste ano.

Migrantes venezuelanos tem sofrido com xenofobia e hostilidades em Roraima.
Crédito: Felipe Larozza/REPAM Brasil

 

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