A cada 25 de maio é lembrado mundialmente o Dia da África. A data, instituída oficialmente pela ONU em 1972, faz referência ao dia de criação da OUA (Organização da Unidade Africana), em 1963, em um contexto no qual os países do continente estavam obtendo a independência em relação às metrópoles europeias.
Em alguns países africanos, como Gana, Mali, Namíbia, Zâmbia e o Zimbébue, o Dia da África é um feriado nacional. No Brasil, embora não seja feriado, a data tem como objetivo promover o reconhecimento da história e cultura africana com a história do país. Além disso, serve como ponto de conexão com os imigrantes de países africanos que residem no país na atualidade.
A criação da OUA visava a busca dos países do continente por união, desenvolvimento, democracia e liberdade contra a colonizaão europeia. Na época de fundação da entidade, ainda haviam nações que lutavam por independência, obtida somente nas décadas seguinte, como Angola, Moçambique e Cabo Verde (1975) e Rodésia do Sul (atual Zimbábue), em 1980.
Em 2002, a OUA deu lugar à União Africana, entidade que existe até hoje e congrega 55 nações. Sua sede está em Adis Abeba, capital da Etiópia, um dos únicos países do continente que não passou por colonização europeia.
Importância da data para o Brasil
O sociólogo Alex André Vargem, doutorando em Ciências sociais pela Unicamp, pesquisa e atua com a comunidade africana residente no Brasil há duas décadas. Ele aponta que o Dia da África é uma efeméride que une o Brasil e o continente africano, refletida há muito tempo pelo movimento negro brasileiro e pelos africanos que vivem no país.
“Num contexto de um Brasil que há um forte racismo e xenofobia, materializa-se no imaginário social um alto grau de desconhecimento das sociedades africanas no que tange aos saberes tradicionais, científicos e tecnológicos, das lutas de emancipação frente aos colonizadores europeus. É uma oportunidade dos brasileiros conhecerem a diversidade social, cultural e política de um continente que pouco é ensinado e refletido nas escolas e universidades no país”.
Vargem lembra ainda que tal oportunidade ainda não tem sido aproveitada em plenitude, uma vez que a Lei 10.639/2003, que prevê a obrigatoriedade de se aprender a História da África e dos Africanos e a luta dos negros no Brasil, ainda é pouco aplicada. “As mulheres e homens africanos de diferentes países que residem no Brasil e na diáspora, são protagonistas, portanto, cumprem um papel político e pedagógico de educar e desconstruir estereótipos construídos ao longo das décadas”.
Com a palavra, os imigrantes africanos
As observações do sociólogo são reforçadas pelas declarações de imigrantes de países africanos que falaram ao MigraMundo sobre a data, lembrada por eles como um momento de celebração, de afirmação e de luta contra injustiças e preconceitos existentes há séculos.
Para Constance Salawe, nascida em Camarões e de nacionalidade nigeriana, a data tem um significao especial. “Este dia significa muito para mim. Sendo África o berço da humanidade, a sua união é extremamente importante para a sobrevivência desta humanidade. Não esqueçamos que este dia foi criado para comemorar a fundação da Organização da Unidade Africana desde 25 de Maio de 1963. Gostaria, portanto, que nós, africanos, o lembrássemos e soubéssemos que somos uma força para a nossa humanidade”.
“A importância dessa data para mim é de clamar: chega de preconceito, xenofobia e o racismo ao povo africano.
De clamar por um olhar com mais empatia e solidariedade, de lembrar que o Brasil tem uma ligação maior com o continente africano”, complementa a atriz, modelo e ativista congolesa Prudence Kalambay, residente em São Paulo.
O escritor angolano Moisés António, que vive em Curitiba, também recorda a ligação existente entre o Brasil e a África, que se faz presente inclusive na composição da população brasileira – que tem 55% dos habitantes que se identificam como negros ou pardos. “É imperativo de todos nós, migrantes e brasileiros descendentes e simpatizantes com o continente, homenageá-la, por ser a terra dos nossos ancestrais, e que de várias maneiras tem servido o mundo, com seus recursos minerais, seus povos maravilhosos, cheio de ricas culturas,
e por ser também, o principio das grandes civilizações, impérios como Egito, que deu início às tecnologias, ciências e vários outros conhecimentos”.
“Para nós migrantes africanos essa data é muito importante pois oferece um espaço para celebração, reflexão e fortalecimento das nossas identidades. Além disso, é também um momento de solidariedade e de apoio mútuo entre os africanos”, complementa o também angolano Frederico Manuel Henriques Eurico, fundador da VemBumbar, instituição que visa facilitar inserção de migrantes africanos no mercado de trabalho.
Além de celebração e de reflexão sobre o passado, a empreendedora e ativista Benazira Djoco, de Guiné-Bissau, aponta o Dia da África como um elemento que ajuda a projetar um futuro mais próspero e justo, com base nos aprendizados do passado e do presente.
“É um momento de lembrar os heróis e heroínas que, muitas vezes, com pouco mais do que sua determinação e coragem, enfrentaram desafios imensos. Mas é também uma oportunidade para celebrar as conquistas e avanços que foram alcançados. A celebração deste dia inspira esperança e força para continuar a construir um continente que honra suas heranças e se projeta com otimismo para o futuro”.
O também guineense Mamadú Cissé, mestrando em Demografia na UFMG (Universidade Federal de Minas Gerais), reconhece a existência de um dia dedicado à África de fato ajuda a impulsionar reflexões e iniciativas relativas ao continente africano e sua diáspora mundo afora.
“Temos que reconhecer que conquistas foram feitas no sentido de divulgar mais a África e suas contribuições, ainda que estejam concentradas em áreas como o meio acadêmico e o terceiro setor. São reflexos de termos momentos de reflexão e de ação como esse do Dia da África”.
Também integrante do ProMigra, Mamadú escreveu sobre o Dia da África para o MigraMundo em 2023, destacando as manifestações organizadas no Brasil e no exterior relativos aos 60 anos de fundação da OUA.