Formado em Medicina na ilha caribenha, profissional sentiu que deveria fazer mais pela terra onde nasceu
Por Alethea Rodrigues
Em Belém/Bethelem (Cisjordânia)
O “Project Cuba” é recente, apenas quatro meses de vida. Mas já foi o suficiente para que fossem realizados aproximadamente 300 atendimentos médicos gratuitos a refugiados palestinos que vivem no campo de Aida, em Belém, na Cisjordânia.
Mohammed Abu Srour nasceu e cresceu no campo que abriga cerca de 5.000 palestinos que foram expulsos de suas casas após a criação do Estado de Israel, em 1948. Apesar de todas as dificuldades, conseguiu uma bolsa de estudos, viajou para Cuba e realizou o sonho de estudar medicina na Universidad de Ciencias Médicas de La Habana, uma das mais conceituadas na área. Por oito anos viveu longe da família, enfrentou barreiras como o idioma e o sacrifício dos pais, que com muito suor, conseguiram cobrir os gastos com saúde e alimentação do filho durante esse tempo.
Após o término da especialização e residência em Pediatria, Mohammed voltou a viver na Palestina e hoje trabalha no hospital Cáritas Baby, que fica na mesma cidade onde nasceu. Cerca de 330 mil pessoas com menos de 14 anos vivem no sul da Cisjordânia. E é o único hospital na região que cuida exclusivamente de crianças.
Mohammed, no entanto, sentiu que precisava fazer um pouco mais pelo local onde nasceu e sofreu durante a infância e adolescência com um sistema de saúde bastante precário. Por isso, em outubro de 2018 ele concretizou a ideia do projeto que , sozinho, prestaria atendimento médico a quem necessita.
“A ideia veio especialmente pelo amor que tenho pelo sistema de saúde de Cuba, que tem como base a medicina familiar. Aprendi isso durante meus estudos e quis colocar em prática atendendo os palestinos que realmente necessitam”, contou.
Entre plantões no hospital onde trabalha profissionalmente e algumas noites sem dormir, Mohammed consegue conciliar a agenda e fazer visitas as famílias atendidas pelo projeto. O pediatra tem uma lista com os contatos de todas as famílias que vivem em Aida e os moradores o contatam pelo telefone quando necessário.
“Meu atendimento não se resume em visitar as famílias. Faço análises da situação integral de saúde do acampamento para futuros projetos, campanhas de saúde e meio ambiente, e no momento tenho 10 pacientes em situação crônica que necessitam de cuidados especiais”, finalizou o pediatra.
Segundo Mohammed, a infância complicada vivendo em meio ao conflito Israel-Palestina, que já dura décadas, só deu forças para que ele se esforçasse ainda mais para conseguir atingir seus objetivos.
“É preciso fazer com que as experiências negativas se tornem positivas para o nosso próprio crescimento pessoal. Passei por muitas dificuldades, mas hoje tenho a melhor recompensa que é ver o meu projeto concretizado. Não tem nada que pague ver o resultado positivo no tratamento dos meus pacientes, é um sentimento único e um dever meu como médico”.
Sem apoio financeiro do governo, o jovem médico de apenas 27 anos pensa em deixar a Palestina somente para aprimorar seus conhecimentos acadêmicos. E garantiu que continuará trabalhando voluntariamente para contribuir com o desenvolvimento de sua terra natal. “No futuro quero ver a população palestina desfrutando de uma sistema de saúde comunitário, gratuito e inclusivo”.