Apelidada de “inferno verde” e “selva da morte”, a região de mata fechada entre Colômbia e Panamá, chamada de Tampão de Darién, é uma das rotas migratórias mais letais da atualidade, guardando uma série de riscos para os que se aventuram por ela. No entanto, a procura apenas cresce a cada ano, o que leva a alertas constantes de autoridades e entidades que lidam com as migrações no continente americano
No mês de dezembro, o total de pessoas que atravessaram o Tampão de Darién ultrapassou a marca de 500 mil, segundo projeções da ONU. O número é mais do que o dobro registrado ao longo de 2022. O ano anterior, aliás, foi superado em movimentação já no mês de agosto.
A maioria dos que cruzam Darién vem da Venezuela, Haiti e Equador, bem como de outros países da América do Sul e do Caribe. Outros são originários de lugares mais distantes, incluindo a África Subsaariana, Ásia e Oriente Médio. Em comum, no entanto, está o objetivo final de chegar aos Estados Unidos, mesmo diante da série de riscos que a rota oferece.
O trecho usado por migrantes leva de quatro a seis dias para ser cruzado a pé, entre o povoado de Acandí, na Colômbia e Bajo Chiquito, no sul do Panamá. O percurso na selva inclui muita umidade, cadeias de montanhas, travessias de rios com fortes correntezas e animais perigosos. Os migrantes enfrentam ainda o cansaço, fome e sede. No caminho, é comum se depararem com corpos abandonados sem vida daqueles que vieram antes.
Além das condições naturais do meio ambiente e do corpo humano, a região ainda tem a presença de paramilitares, grupo armados e tráfico de drogas e de pessoas. Episódios de violência, assaltos, roubos, agressões sexuais e até assassinatos são relatados constantemente nos meios de comunicação locais e internacionais.
ONU pede ação conjunta
Em comunicado conjunto na última semana, a OIM, Agência da ONU para as Migrações, e o ACNUR, Agência da ONU para Refugiados, pediram uma abordagem regional abrangente, baseada em cooperação e solidariedade, em resposta à crise humanitária que ocorre no Tampão de Darién.
Segundo as duas entidades, dificultar vias para migração regular e solicitação de refúgio apenas leva pessoas a optar por rotas mais perigosas e encher os bolsos de contrabandistas de migrantes.
“Nenhum país por si só está equipado para lidar com eles. Apenas ao trabalharmos juntos com todos os atores relevantes, a partir de uma abordagem colaborativa baseada na rota e com foco no que podemos fazer em cada etapa da jornada, que conseguiremos enfrentá-los efetivamente”, disse o Alto Comissário da ONU para Refugiados, Filippo Grandi.
A Diretora-Geral da OIM, Amy Pope, complementou as falas do colega de ONU. “Países de acolhida precisam de maior apoio da comunidade internacional para fortalecer os serviços nacionais e oferecer oportunidades de integração para que as pessoas encontrem estabilidade e evitem embarcar em jornadas perigosas.
Violência sexual
As agências da ONU não são as únicas a alertarem sobre os riscos da rota migratória de Darién e cobrarem providências das autoridades. De janeiro a outubro de 2023, a ONG Médicos Sem Fronteiras (MSF) tratou 397 sobreviventes de violência sexual, muitos deles crianças e adolescentes, depois que conseguiram chegar ao Panamá.
Ainda de acordo com a instituição, apenas em outubro, suas equipes prestaram assistência a 107 pessoas. Em uma das semanas do mês, 59 pessoas procuraram atendimento, o que indica um evento de violência sexual ocorrendo a cada três horas.
“Nem todos os sobreviventes recebem atenção em tempo hábil, devido ao estigma que envolve essa forma de violência, às ameaças dos agressores, às formas de violência sexual não reconhecidas como tal e ao fato de que eles não se sentem seguros para pedir ajuda”, afirmou Carmenza Gálvez, coordenadora-médica do projeto de Médicos Sem Fronteiras, em informe especial sobre Darién.