O acidente aéreo que chocou o Brasil na última sexta-feira (9) e deixou o país de luto também afetou parte da comunidade migrante no país. Quatro das 62 vítimas da tragédia com o voo da companhia Voepass, que caiu em Vinhedo (SP), eram migrantes: uma professora portuguesa e três venezuelanos da mesma família.
As vítimas venezuelanas são: Maria Parra, sua filha Josgleidys Gonzales e Joslan Perez (filho de Josgledys Gonzalez e neto de Maria). Junto com a família estava ainda um pet, a cachorrinha Luna. Além deles, também estava a portuguesa Gracinda Marina Castelo da Silva.
Os quatro moravam na região oeste do Paraná, sendo os venezuelanos em Cascavel, cidade de origem do voo da Voepass, e Gracinda Marina na cidade de Toledo.
A Aeronáutica apura as causas da queda da aeronave, que atingiu duas residências em um condomínio fechado no município paulista. Não há registro de vítimas entre moradores ou de quem estava no solo.
Trajetórias interrompidas e reflexões
A tragédia significou o fim de trajetórias que, a partir do recorte sobre migrações no Brasil, ajudam a ilustrar a situação de diferentes comunidades migrantes no país.
De acordo com amigos em Cascavel, a família venezuelana havia migrado para o Brasil em busca de uma vida melhor, mas enfrentava dificuldade para regularizar a documentação de Joslan, nascido na Venezuela, mas que havia crescido no Brasil.
Dias antes do acidente, a família venezuelana havia sido vítima de um golpe financeiro pela internet, deixando-a sem dinheiro. Diante dessa situação, a solução encontrada foi deixar o Brasil e fazer um novo processo de migração. Vizinhos ajudaram com uma vaquinha online e com a documentação do pet para que as duas mulheres e a criança pudessem fazer a viagem.
De Guarulhos, destino final do voo da Voepass, o plano da família era viajar até Boa Vista (RR) e seguir de ônibus até Pacaraima, na fronteira com a Venezuela, onde fariam um percurso de 12 horas até a cidade de origem. De lá, o passo seguinte seria a Colômbia, país que mais abriga venezeulanos da diáspora em todo o mundo.
“O falecimento de uma mulher migrante venezuelana em busca de um futuro melhor para ela e sua família. Um menino venezuelano que não poderá jogar e nem cantar o hino à sua bandeira. Ver e sentir como buscando um melhor futuro longe de nosso país perdemos a tantos…”, refletiu a comunicadora venezuelana Yesica Morais sobre a morte da compatriota.
Gracinda, por sua vez, era professora e fazia parte do corpo docente da Universidade Tecnológica Federal do Paraná (UTFPR) e casada há 25 anos com o servidor público municipal Nélvio José Hubner, com quem teve três filhos. Ele tambpem foi uma das vítimas do acidente aéreo.
Além da atividade acadêmica, Gracinda gostava de motociclietas e era filiada ao MDB. Em 1º de agosto, teve lançada a pré-candidata ao cargo de vereadora em Toledo pelo partido. Seu slogan era “Pilotando Toledo com educação e inclusão”.
De acordo com a Constituição brasileira em vigor, os migrantes residentes no Brasil não possuem direito a voto, nem de serem votados. Essa barreira, no entanto, cai por terra quando se trata de imigrantes que já obtiveram a cidadania brasileira – seja mantendo-a em conjunto com a cidadania de origem ou abrindo mão desta. Portugueses com igualdade de direitos em relação aos brasileiros também podem participar do processo eleitoral diretamente.
Nunca é demais lembrar que reconhecimento do direito de votar e de ser votado é uma bandeira histórica do movimento social migrante no Brasil. No entanto, tal obstáculo atualmente só é transposto por quem se enquadra nessas exceções. Um estudo feito em 2020 e destacado à época pelo MigraMundo traçou um perfil dos candidatos não-brasileiros que disputaram as eleições municipais daquele ano. Foram 219 nomes encontrados de 38 nacionalidades, sendo a portuguesa a maior representada.