Seminário procurou abordar o novo panorama das migrações na cidade e no Brasil, caracterizado pelas migrações do chamado Sul global
Por María Villarreal
No Rio de Janeiro (RJ)
O Coletivo Rede Migração, que reúne diversos pesquisadores e ativistas das migrações, e a Pastoral do Migrante no Rio de Janeiro realizaram um seminário denominado A presença do migrante no Rio de Janeiro: o olhar dos migrantes e refugiados. Em um debate amplo com espaço para discussão, perguntas e comentários por parte do público, imigrantes e refugiados de Ásia, África e América Latina e Caribe como Abdel Bakkour, Catalina Revollo, Daniel Ramal, Jazmin, José Rafael Bolívar, Agossou Lucien Ahouangan, Leonardo Ruge, Nínive Forero e María Villarreal, tiveram a possibilidade de apresentar suas experiências individuais e coletivas na sede carioca do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).
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O seminário, que aconteceu no último dia 25 de abril, visibilizou o novo panorama das migrações no Brasil, caracterizado de forma crescente por imigrantes provenientes do Sul (África, Ásia e América Latina e Caribe) e, especialmente, por imigrantes intrarregionais, com particular destaque para o caso da população colombiana, venezuelana, haitiana e boliviana. O evento organizado em mesas mediadas pelos pesquisadores Andressa Maxnuck e André Zuzarte, abordou a multidimensionalidade do fenômeno migratório, as múltiplas causas (econômicas, sociais, políticas, culturais, etc.) que provocam ou estimulam as migrações e a heterogeneidade de experiencias individuais e coletivas dos migrantes.
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Deste modo, foi analisado que as pessoas vêm ao Brasil buscando novas oportunidades de trabalho, como resultado de conflitos armados, perseguição e múltiplas formas de violência, por razões de estudo ou por motivos familiares e sentimentais, vinculados à elementos como o matrimônio ou relacionamentos com parceiros brasileiras/os. No entanto, a complexidade da mobilidade humana reside no fato de que estas motivações podem se combinar, como acontece na maioria dos casos, e que as experiências não podem nem devem ser reduzidas exclusivamente a razões de caráter econômico.
Outros fenômenos discutidos no evento foram os paradoxos da globalização que estimulam, por um lado, os fluxos de comércio e capital e, restringem, por outro, a mobilidade das pessoas. Um tema importante foi também o modelo de desenvolvimento vigente sobretudo na América Latina e Caribe que, na sua condição extrativista, propicia a exploração dos recursos, territórios e pessoas e beneficia apenas a uma minoria provocando altos níveis de pobreza, desigualdade e violência a nível regional. O extrativismo é um dos fatores explicativos das migrações forçadas na região e um dos principais elementos que devem ser considerados ao analisar o conflito colombiano, vigente desde a década de 1950, e que tem provocado mais de 200 mil mortes e o maior número de deslocados internos depois do conflito sírio, segundo o Alto Comissariado das Nações Unidas para Refugiados (ACNUR).
Por outro lado, foram também abordados os avanços em termos de política migratória a nível nacional, assim como os progressos obtidos no marco dos processos de integração sul-americanos: Mercado Comum do Sul (MERCOSUL), Comunidade Andina de Nações (CAN) e União de Nações Sul-Americanas (UNASUL). A este respeito, foram discutidos os efeitos positivos de iniciativas como o Acordo de Residência MERCOSUL que têm facilitado a circulação e residência de pessoas a nível regional, ao passo que se examinaram os desafios que ainda permanecem em relação à interiorização destas normas, assim como ao conhecimento dos seus princípios e ao cumprimento dos mesmos.
A parte central do seminário se concentrou em discutir as diversas experiências individuais e coletivas dos imigrantes e refugiados presentes no Rio de Janeiro. Elas e eles, enquanto artistas, acadêmicos, estudantes e trabalhadores em diversas áreas, narraram suas experiências de vida na cidade carioca, expondo suas dificuldades, mas também todas as novas experiências e aprendizagens que comporta residir em uma nova realidade. Ao mesmo tempo, foi possível conhecer a experiência organizativa das comunidades de migrantes presentes na cidade como o Coletivo “Colombianxs por la Paz”. Neste marco, ficou clara a condição dos migrantes como sujeitos de direitos e protagonistas da sociedade, da política, da economia e da cultura local. Paralelamente, foi discutida a artificialidade de noções como Estados, fronteiras e identidades, construídas historicamente de forma excludente e não integradora, deixando de lado o fato que são categorias em constante transformação.
A migração foi abordada como uma experiência histórica e intrínseca ao ser humano que deve ser entendida de forma integral. Portanto, não pode ser vista só como um problema ou apenas como fonte de sofrimento para seus protagonistas e sim como uma oportunidade de crescimento, de troca e de enriquecimento mútuo para os migrantes e as sociedades de acolhida. Finalmente, foram também discutidas algumas das contradições entre discursos e práticas por parte do Estado e da política migratória brasileira. Assim, se evidenciou que para além de políticas de acolhida, são necessárias políticas efetivas de integração que considerem o fenômeno migratório na sua integralidade, melhorando as políticas e serviços para migrantes e garantindo medidas concretas de não discriminação nem racismo. Algumas das medidas mais urgentes são a garantia de direitos políticos e socioeconômicos e a necessidade de facilitar o processo de revalidação de diplomas para as pessoas que aqui chegam e que, devido à burocracia, as dificuldades e a lentidão do processo, não podem trabalhar nas suas respectivas áreas de formação e acabam desempenhando funções aquém das suas capacidades, impedindo com isso sua plena integração à sociedade brasileira e suas contribuições ao desenvolvimento do país.
O Seminário do Coletivo Rede Migração foi também o espaço privilegiado para apresentar o terceiro volume da Revista “A Presença do Imigrante no Rio de Janeiro”. A revista, por eles organizada, retrata nesta ocasião o olhar dos migrantes e refugiados e inclui algumas pesquisas acadêmicas dos participantes do seminário e a narração das suas experiências migratórias e formas de organização na cidade carioca. Para os interessados, os temas analisados e as experiências migratórias discutidas no seminário, podem ser aprofundados nos diversos artigos que compõem a revista. A publicação está disponível aqui e em breve também vai constar no site do Coletivo (https://redemigrario.wordpress.com), junto com as edições anteriores da revista e as iniciativas promovidas na cidade.
Com iniciativas como esta, o Coletivo Rede Migração, integrado por pessoas como o padre Mario Geremia (Pastoral do Migrante), Carolina Moulin (PUC-Rio), Antônio Tadeu Oliveira (IBGE), Regina Petrus (NIEM-UFRJ) e diversos outros pesquisadores e ativistas busca realizar estudos e ações em favor de um melhor entendimento das migrações e articular a sociedade civil no Rio para pautar o debate sobre construção e implementação de políticas públicas para migrantes.