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quinta-feira, dezembro 12, 2024

PF prorroga prazo para regularização de imigrantes; agendamentos ainda são gargalo

Advogado ouvido pelo MigraMundo aponta contradições entre a nova portaria da Polícia Federal e medidas anteriores tomadas pela própria instituição

Por Rodrigo Veronezi
Atualizado às 13h15 de 12.mar.2021

A Polícia Federal prorrogou para setembro de 2021 o prazo para que imigrantes que tiveram documentos vencidos em meio à pandemia possam se regularizar. O prazo inicial terminaria na próxima segunda-feira (15).

A medida foi anunciada na última segunda-feira (8), por meio de portaria publicada no Diário Oficial da União. O texto da portaria estabelece 16 de setembro como novo prazo máximo para regularização dos documentos, “podendo ser feita a regularização, independentemente de aplicação de multas por atraso no registro ou excesso de permanência ocorrido nesse período”.

A portaria também amplia o prazo para que brasileiros possam retirar passaportes. Ela estipula que não serão mais cancelados automaticamente os documentos de viagem não retirados no prazo fixado. A medida vigora até nova manifestação da PF.

A contagem dos prazos migratórios foi retomada em novembro de 2020, depois de ter ficado congelada durante boa parte do último ano em razão da pandemia.

Problemas com agendamentos

Por meio de nota divulgada em seu site, a Polícia Federal admite que há um grande número de imigrantes com pendências de regularização em razão da Covid-19. E que os atendimentos “continuarão sendo feitos por agendamento, por sistema ou por e-mail, na Unidade onde o imigrante for domiciliado, observados os cuidados e as restrições da localidade”.

Embora a prorrogação do prazo seja positiva por instituições da sociedade civil que lidam com a temática migratória, elas apontam que a portaria não traz providências para um grande gargalo nas questões de documentação: os agendamentos.

Migrantes reclamam constantemente da dificuldade de obter um horário junto à PF para regularizar a situação migratória. Há pessoas, de acordo com apuração do MigraMundo, que tentam agendamento pelo menos desde o final de 2018.

“O entrave continua sendo o agendamento na Polícia Federal”, afirma a socióloga Isabel Torres, que atua no setor de regularização migratória do CAMI (Centro de Apoio e Pastoral do Migrante e Refugiado).

Torres ressalta ainda que a ausência da documentação é algo que gera um efeito em cadeia: sem a documentação em dia, as pessoas migrantes enfrentam dificuldades adicionais para conseguir acessar serviços públicos e outros documentos necessários para viver no Brasil.

“É como uma bola de neve. A PF aumenta os prazos, mas não dá os caminhos de poder fazer com que os migrantes recebam seus documentos e fiquem regularizados. É preciso buscar um sistema que realmente ajude essas pessoas a se regularizarem”.

A advogada Karina Quintanilha, pesquisadora e advogada do Fórum Internacional Fontié ki Kwaze – Fronteiras Cruzadas (USP e Unicamp), também vê a prorrogação dos prazos como um alívio parcial, além de criticar a portaria por pontos omissos.

“Como fica a situação das pessoas que já estavam indocumentadas ou das que entraram no Brasil durante a pandemia, incluindo muitas pessoas em situação de refúgio, e que estão com imensa dificuldades de regularizar a sua situação, de conseguir um agendamento na PF?”

Quintanilha prossegue. “Temos contato cotidiano com imigrantes que estão sendo discriminados nos serviços públicos porque estão com os documentos vencidos, isso ficou muito claro durante o auxílio emergencial. Temos a Lei de Migração que garante o acesso a direitos igualmente a todos migrantes independente da condição migratória, mas existe uma distância entre a lei e como ela é aplicada na prática”.

Procurada pelo MigraMundo, a Polícia Federal informou que estão sendo estudadas possibilidades de ampliação dos locais de atendimento. Segundo a entidade, eles devem ficar “principalmente nas localidades em que a concentração de imigrantes ultrapassa a capacidade da unidade da Polícia Federal, eventualmente com a colaboração da sociedade civil”.

A PF acrescenta que, em paralelo, os sistemas estão sendo melhorados para reduzir o tempo de atendimento do imigrante, e assim otimizar a capacidade já instalada. No entanto, admite que a implantação desses sistemas não é imediata.

Contradições

O advogado Vitor Bastos, integrante do IPPDH (Instituto de Promoção e Proteção de Direitos Humanos) e do ProMigra (Projeto de Promoção dos Direitos de Migrantes da Faculdade de Direito da USP), aponta que a portaria traz algumas contradições em relação a textos anteriores.

Ele cita, por exemplo, o artigo 2º, que indica que “documentos expirados a partir de 16 de março de 2020 devem ser aceitos como válidos para todos os efeitos e poderão ser utilizados até o dia 16 de setembro de 2021, inclusive para fins de ingresso, de registro”. No entanto, o artigo seguinte traz que “as viagens ao exterior cuja soma dos períodos de duração que ultrapassem trinta dias impedem a aplicação do disposto no caput.”.

“Novamente ficamos sem saber o sentido que será dado ao texto das portarias, teremos que ver na prática a partir de 15 de março. Mas a expectativa é que a PF sempre faça leitura mais desfavorável possível ao migrante.”

Campanha por regularização

Tanto Torres quanto Quintanilha apontam que o problema dos agendamentos junto à PF são elementos que mostra a necessidade de haver uma iniciativa ampla de regularização de migrantess no Brasil.

“Nesse momento em que a crise sanitária se acentua no Brasil é crucial políticas massivas de regularização migratória, como fez Portugal. Do contrário, migrantes que estão em maior vulnerabilidade social é quem terão maior dificuldade de acessar direitos”, destaca Karina.

Em meio à pandemia, em maio de 2020 foi lançada a campanha Regularização Já, impulsioanda por imigrantes no Brasil. Ela ajudou a fomentar a criação de um projeto de lei na Câmara dos Deputados, o PL 2699/2020, que prevê a regularização de migrantes como parte do esforço de combate à Covid-19.

Até o momento não há notícia de que a pauta tenha avançado no Congresso. O que mostra, segundo Torres, a necessidade de união da sociedade civil em torno dessa temática.

“Falta vontade política e o momento não é favorável. Mas precisamos da união de todas as instituições e coletivos para colocar em pauta uma vez mais a regularização de imigrantes”.


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