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domingo, novembro 24, 2024

Só 5% das cidades brasileiras com imigrantes têm serviços de apoio, aponta IBGE

Pesquisa inédita integra o Perfil dos Municípios Brasileiros (Munic), realizada pelo instituto

Por Rodrigo Borges Delfim
Em São Paulo

Uma pesquisa inédita divulgada na última quarta-feira (25) pelo IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística) mostra que há presença de imigrantes em 3.876 dos 5.570 municípios brasileiros (69% do total). No entanto, apenas 215 ( 5,5% ) contam com algum tipo de serviço de apoio voltado a essa população.

A partir da base de dados da Polícia Federal, o IBGE identificou os municípios com presença imigrante e compilou as informações para o Perfil dos Municípios Brasileiros (Munic) 2018.

Quando o escopo é ampliado para todos os 5.570 municípios, inclusive os sem registro de imigrantes, o número aumenta para 232, mas a proporção é ainda menor, de 4,1%.

“O Brasil vem recebendo um fluxo grande de migrantes em vários municípios. Era natural que a gente tentasse conhecer um pouco das estruturas existentes nos municípios. A intenção foi investigar o quanto esses municípios estão mais ou menos organizados para tratar da questão do migrante”, afirmou a gerente da pesquisa, Vânia Pacheco.

Maior cidade brasileira, São Paulo também é a que conta com o maior número de registros de imigrante e de serviços disponíveis, entre os oferecidos pelo poder público ou pela sociedade civil (associações em geral), seguida por Rio de Janeiro (RJ), Boa Vista (RR), Brasília (DF), Curitiba (PR), Manaus (AM), Macaé (RJ), Porto Alegre (RS), Florianópolis (SC) e Belo Horizonte (MG).

A capital paulista, por enquanto, é o único município brasileiro a contar com uma Política Municipal para a População Imigrante, em vigor desde dezembro de 2016.

Serviços e lacunas

Para realizar o estudo, o IBGE definiu os seguintes instrumentos de gestão migratória: Mecanismos de cooperação entre os municípios e os demais entes da federação; relação entre a prefeitura e associação ou coletivo de imigrantes; oferta de curso de português para imigrantes; atendimento multilíngue nos serviços públicos; abrigo de gestão municipal; centros de Referência e Apoio (CRAIs); e formação e capacitação continuada interdisciplinar para o atendimento a imigrantes.

A pesquisa, contudo, não especifica quais são instrumentos destinados exclusivamente ao atendimento e orientação de imigrantes em cada município, caso existam.

De acordo com o instituto, apenas 75 municípios tinham mecanismos de cooperação na promoção e desenvolvimento das políticas públicas locais voltadas aos imigrantes. Os municípios de Epitaciolândia (AC), Manaus (AM), Presidente Figueiredo (AM), Boa Vista (RR), Normandia (RR) e Pacaraima (RR), que, recentemente, receberam correntes migratórias oriundas do Haiti e da Venezuela, estabeleceram cooperação ao menos com um ente federado.

Mutirão promovido pela Prefeitura de Boa Vista mapeia venezuelanos que vivem na cidade. Crédito: Nayra Wladimila/MigraMundo

A pesquisa identificou serviços de abrigamento de imigrantes em 58 municípios, incluindo Pacaraima (RR), Boa Vista (RR), Manaus (AM), Porto Velho (RO), Cuiabá (MT), Campo Grande (MS), Foz do Iguaçu (PR) e São Paulo (SP).

O ensino de português a imigrantes era ofertado em apenas 48 municípios de 11 unidades da federação, concentrados nas cidades do Sul, particularmente em Santa Catarina – Estado que recebeu imigrantes de países como Senegal e Haiti que foram direcionados para setores como o abate de animais em frigoríficos.

Quando o assunto é atendimento multilíngue, o vazio é ainda maior: apenas 25 municípios, distribuídos em 12 Estados – de acordo com o IBGE, nenhuma capital do Sudeste oferecia esse serviço.

“A gestão migratória deveria ser da responsabilidade das três esferas de poder, com o ente federal gerindo as entradas e saídas, a regularização e a cooperação internacional. Já as políticas referentes à integração, como o ensino do idioma, geração de trabalho, acesso aos serviços, entre outras, estão mais próximas às esferas municipais e estaduais”, constatou Pacheco.

A Lei de Migração, que entrou em vigor em novembro de 2017, prevê no seu artigo 120 a instituição de uma Política Nacional Migratória, que teria como objetivo definir as tarefas que cabem a cada esfera na questão migratória. No entanto, ele ainda necessita de regulamentação para entrar em vigor – algo que não se vislumbra no horizonte.

Capacitação

Apesar das lacunas na oferta e na prestação de serviços para imigrantes, há ações Brasil afora que procuram preencher tais espaços.

Uma delas é o ciclo de oficinas de capacitação de atores locais que vem sendo promovidas desde meados de 2018 pela Rede de Capacitação a Refugiados e Migrantes, formada por um pool de instituições da sociedade civil, do Judiciário e das Nações Unidas.

Mantido com recursos das próprias instituições integrantes, o projeto vem rodando o Brasil com atividades gratuitas de formação para integrantes de instituições locais de acolhida e orientação a migrantes, jornalistas, migrantes, agentes públicos, entre outros interessados.

Roda de conversa com migrantes durante encontro de capacitação para acolhimento de migrantes, em Curitiba (PR).
Crédito: Amanda Souza/Ascom ESMPU

“A educação é o caminho para tentar superar essa dificuldade que temos hoje. Precisamos todos nos libertar de uma visão xenofóbica”, afirmou ao MigraMundo em maio o procurador João Akira Omoto, atual diretor-geral da ESMPU (Escola Superior do Ministério Público da União), uma das instituições que integram a rede e que dá apoio logístico para a realização dos encontros.

A série de encontros começou em julho de 2018, em Belém (PA). De lá, passou por Manaus (AM), São Paulo (SP), Boa Vista (RR), Porto Alegre (RS), Recife (PE), João Pessoa (PB), Curitiba (PR), Florianópolis (SC), Campo Grande (MS) e Cuiabá (MT). Até o final de novembro, quando se encerra o programa, ele passará por Rio de Janeiro (RJ), Foz do Iguaçu (PR), Belo Horizonte (MG) e Brasília (DF).

Levantamento anterior

Embora a pesquisa seja inédita por parte do IBGE, a inserção de imigrantes em cidades brasileiras também já foi notada por um outro estudo recente, finalizado em 2018 por pesquisadores do Observatório das Migrações em São Paulo, da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp).

O trabalho deu origem ao “Atlas Temático – Observatório das Migrações em São Paulo”, apresentado em abril de 2018.

Embora o foco do trabalho seja o contexto paulista, o estudo também analisou números e o cenário nacional e internacional para entender como o Brasil e, mais especificamente, o Estado de São Paulo se insere na rota das migrações internacionais.

“Isso rompe com o imaginário de que a rota das migrações internacionais no Brasil passa pelas fronteiras, segue para as metrópoles, principalmente das regiões Sul e Sudeste do país, e se espalha para outros estados”, explicou à época Rosana Baeninger, pesquisadora do Núcleo de Estudos da População (Nepo) da Unicamp e coordenadora do projeto, em entrevista à Agência Fapesp.

Com informações da Agência Fapesp e Agência IBGE de Notícias

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