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terça-feira, outubro 29, 2024

Viajar e morar fora do país pode nos transformar, diz autora brasileira migrante

Livro Ventos Nômades, da baiana Manuela Marques Tchoe, reflete parte das experiências da própria autora fora do Brasil, além de defender a diversidade cultural

Por Rodrigo Borges Delfim
Em São Paulo

Viver choques culturais, se deparar com medos e fraquezas pessoais, desenvolver novas habilidades: estas são apenas algumas das experiências possibilitadas pela vivência no exterior – seja como residente em um outro país, seja como um simples viajante.

Contar essas experiências de um forma leve e poética é o que busca a escritora brasileira Manuela Marques Tchoe por meio do livro “Ventos Nômades” – disponível para e-book e em formato impresso.

Em dez contos, a baiana que nasceu em Salvador e vive desde 2005 no sul da Alemanha – mais exatamente em Munique – mescla experiências que ela própria viveu como migrante com relatos de amigos, além de dar asas à própria imaginação.

“Com esse livro eu quis falar de experiências humanas e de como viajar, morar fora do nosso país de origem, pode nos transformar. Ventos Nômades é apenas uma forma mais poética de contar essas histórias”, conta a autora, que também colabora mensalmente com o MigraMundo como colunista e mantém o blog Baiana da Baviera.

Em entrevista ao MigraMundo, Manuela também cita que usa seus textos para rebater a xenofobia e dar um olhar migrante para as discussões sobre o tema.

“Quando muita gente fala de migração, muitos não têm experiência como migrantes, nem os fatos necessários para uma discussão racional sobre o tema. Com meus textos, eu procuro dar a perspectiva do migrante e mostrar que, no mundo globalizado de hoje, a diversidade cultural é algo a ser intensificado, ao invés de combatido com tanta agressividade”.

Capa do livro “Ventos Nômades”, de Manuela Marques Tchoe.
Crédito: Reprodução

MigraMundo: Por que a escolha pelo nome “Ventos Nômades” para seu livro?
Manuela Marques Tchoe: Ventos são nômades por natureza, estão sempre percorrendo o mundo. Eles não ficam parados, num só lugar. Com todos nós é assim também; viver é movimento, independentemente de onde estejamos. Com esse livro eu quis falar de experiências humanas e de como viajar, morar fora do nosso país de origem, pode nos transformar. Ventos Nômades é apenas uma forma mais poética de contar essas histórias.

De onde veio a inspiração para escrever os contos?
De início eu queria escrever um romance que tivesse como inspiração o meu primeiro ano na Alemanha, que foi repleto de viagens, choques culturais e descobertas. Mas então pensei que num romance seria difícil abordar tantas histórias e lugares, por isso optei por contos, para que a imaginação pudesse fluir. Escrever contos me deu a liberdade de construir histórias completamente diferentes em cenários e culturas distintas.

Você já viveu alguma das histórias descritas nos contos?
Com certeza! Algumas situações vividas foram a base para algumas histórias. “Tempestade de Areia”, por exemplo, foi baseado num relacionamento que tive com um egípcio e todas as diferenças culturais que tivemos. “Olho no Olho, Polvo com Repolho foi criado a partir das lembranças de quando conheci a família coreana de meu marido num restaurante asiático, as reações de minha sogra e seus dilemas. “Milagres na Praça dos Reis” e “Milagres na Terra dos Orixás”, contam da ida para a Alemanha e os choques culturais, assim como o retorno para casa e o choque cultural reverso, que foram sensações reais para mim e muitas das pessoas que eu conheço.

Dos contos, tem algum que te chamou mais a atenção? Qual o seu favorito e  por quê?
O meu preferido seria À Sombra da Cerejeira, que conta a história de uma mulher mais velha que recomeça a sua vida a partir de um novo relacionamento. Não é uma história auto-biográfica, mas penso como é forte essa questão de recomeçar quando se acha que a vida não guarda mais surpresas. A viagem que essa personagem faz a leva a Portugal, a terra de seus ancestrais, num processo de redescoberta.

Viajar e morar fora do país são experiências transformadoras, segundo a autora brasileira. Crédito: Jan Vašek/ Pixabay

Depois de escrever o livro, como foi o processo para encontrar uma editora disposta a publicá-lo?
O mercado literário no Brasil é muito complicado e não foi fácil. Mandei o manuscrito para diversas editoras e… nada. Cheguei a fazer uma autopublicação, porque além de nem receber respostas, queria aprender como esse esquema funciona. Aprendi muito nesse processo.

Eventualmente, como sou uma autora novata, eu vi que seria difícil publicar entre as grandes editoras e apostei numa editora pequena. Apesar de alguns percalços, o livro foi publicado e foi bem recebido pelos leitores. 

Mas não basta publicar e esperar que o livro venda por si só. O escritor brasileiro tem que fazer muito mais que escrever bons livros para ser reconhecido no mercado.

Tem algum autor ou gênero em específico no qual você se espelha para escrever? 
Como leitora sou bastante eclética, mas confesso que tenho uma quedinha por livros que se ambientam em locais fascinantes, relatos de viagem, etc. Mas também gosto muito de clássicos latino-americanos como Isabel Allende, que se tornou um dos ícones do realismo mágico. A Casa dos Espíritos é um dos meus livros favoritos, além de Como Água para Chocolate da escritora mexicana Laura Esquivel. 

A autora brasileira Leticia Wierzchowski para mim é também inspiradora – seus livros são poéticos e impossíveis de largar, como A Casa das Sete Mulheres.

O que significa para você, como migrante, escrever sobre migração – seja em seu blog, seja em sites com os quais colabora, seja em livros?
Migração é um assunto riquíssimo e pelo qual tenho grande fascinação. Mas também é um tema controverso, que para muita gente se tornou uma caça às bruxas. Por isso, é um tema que escrevo não só porque me fascina, mas porque é importante de ser abordado e discutido

Quando muita gente fala de migração, muitos não têm experiência como migrantes, nem os fatos necessários para uma discussão racional sobre o tema. Com meus textos, eu procuro dar a perspectiva do migrante e mostrar que, no mundo globalizado de hoje, a diversidade cultural é algo a ser intensificado, ao invés de combatido com tanta agressividade.

Quais seus projetos futuros para a literatura?
Estou lançando um novo livro – dessa vez um romance – chamado Encontro de Marés. Esse livro conta a história de mãe e filha que se desencontram pela vida. Sempre quis escrever um livro com um caráter social, então explorei o tema da prostituição infantil na obra. Mas também tem a questão da procura pela identidade e a interculturalidade, o misticismo da Bahia, um pouco da violência do Rio. Mostra um pouco das diferenças culturais entre Brasil e Alemanha, também.

Ventos Nômades
Autora: Manuela Marques Tchoe
Editora Pendragon
e-book: R$ 8,90; impresso: a partir de R$ 19,90






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