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quinta-feira, novembro 21, 2024

Polícia Federal retoma a impressão de cédulas de identidade para migrantes residentes e solicitantes de refúgio

A aceitação ou não do protocolo CRNM pelas autoridades migratórias brasileiras e de outros países para sair e entrar no Brasil é uma das preocupações recorrentes dos migrantes

Por Alexei Padilla Herrera
De Belo Horizonte

Interrompido em dezembro de 2023, o serviço de emissão de DPRNM (Documento Provisório de Registro Nacional Migratório) e CRNM (Carteira de Registro Nacional Migratório) foi retomado em 15 de abril de 2024, afirmou por e-mail a Coordenação Geral de Comunicação Social da Polícia Federal (PF) do Brasil.

A paralisação teria afetado 14.207 migrantes que se registraram no Registro Nacional Migratório e solicitaram sua primeira carteira de identidade em dezembro de 2023, assim com os 20.646 que solicitaram às autoridades brasileiras o reconhecimento da condição de refugiado, entre dezembro de 2023 e o primeiro trimestre de 2024, de acordo com dados publicados pelo Observatório das Migrações Internacionais (OBMigra),

Quase cinco meses de atraso

A bióloga Anisley Pérez, um dos milhares de imigrantes afetados pelo atraso, conta que apenas em dezembro de 2023 foi à Unidade de Imigração da PF em Belo Horizonte para solicitar a renovação de sua residência temporária no Brasil e a emissão de uma nova carteira de identidade. O procedimento era essencial para dar continuidade aos seus estudos de doutorado na Universidade Federal de Minas Gerais.

Depois de verificar se a documentação estava em ordem, coletar suas impressões digitais e tirar uma foto, o agente de plantão renovou a autorização de residência. A cubana voltou para casa com uma cópia do protocolo de seu CRNM, uma folha com suas informações gerais, a classificação migratória e um código QR para verificar a autenticidade e a validade do documento.

Válido por 90 dias, o protocolo seria o único documento de identidade oficial que Anisley teria até obter seu cartão de residência.

Rafael Luis, também cubano, teve de lidar com procedimentos burocráticos adicionais para substituir a cédula que recebeu como residente permanente em 2017. Antes de “caçar” um agendamento na plataforma da Polícia Federal, o motorista do Uber teve que detalhar as circunstâncias da perda do documento no boletim de ocorrência que preencheu no portal digital da Polícia Civil de Minas Gerais.

Para os migrantes com residência temporária ou permanente, a parte mais onerosa do processo (incluindo os custos de transporte e tempo) é a taxa de 204,77 reais (cerca de US$ 38), que equivale a 14,5% do salário mínimo em 2024 e é mais alta do que a taxa média que os brasileiros geralmente pagam pelas carteiras de identidade emitidas pelos institutos de identificação estaduais.

A emissão de CRNM e DPRNM era um processo que normalmente não levava mais de 40 dias. No entanto, no final de março de 2024, Anisley e Rafael Luis se depararam com um sério problema: os protocolos que receberam em dezembro estavam para vencer sem que as carteiras de identidade estivessem prontas.

Apesar do atraso de quase seis meses, a Coordenação-Geral de Comunicação Social da Polícia Federal brasileira garantiu que a perda dos prazos não resultou em nenhum prejuízo aos imigrantes que foram às unidades de imigração do país para receber o protocolo do CRNM ou do DPRNM.

Quando a PF foi questionada sobre a situação dos milhares de imigrantes cujos protocolos estavam vencidos, ela orientou que os interessados deveriam fazer um agendamento e ir até a unidade de imigração correspondente para receber o documento atualizado.

O e-mail, usado por Rafael Luis, é outra opção disponível para os imigrantes gerenciarem e receberem uma atualização de seus protocolos. A solicitação deve incluir o nome completo do solicitante e o número do requerimento que aparece na parte inferior do protocolo.

Por esse canal também é possível receber informações gerais sobre determinados processos e até mesmo solicitar a emissão de certidões de regularidade migratória para comprovar que o titular está ou não autorizado a permanecer em território brasileiro.

Eliminar a fila de espera

Diante do desafio de produzir carteiras de identidade para mais de 160 mil imigrantes, a PF e a Valid S.A. – empresa contratada para o serviço – criaram um grupo operacional que iniciou a impressão e o envio dos CRNMs e DPRNMs pendentes para as delegacias de imigração em 15 de abril de 2024.

Em uma nota conjunta enviada por e-mail, o órgão estatal e a empresa privada declararam que estão trabalhando “para eliminar a fila de espera” e que preveem que o processo de confecção de carteiras de identidade para imigrantes será normalizado em maio ou junho de 2024. A produção, eles esclarecem, seguirá a ordem cronológica das solicitações para priorizar aqueles que têm o maior tempo de espera.         

Os novos DPRNMs e CRNMs estarão disponíveis nas unidades da Polícia de Imigração onde foram solicitados ou transferidos a pedido do titular. O solicitante será notificado por e-mail para retirar o documento pessoalmente ou por meio de um procurador, que deverá apresentar uma procuração lavrada por um cartório autorizado.

Os migrantes que ainda não retiraram a carteira de identidade devem acessar o portal do SISMIGRA para verificar a situação do seu pedido. Por outro lado, a PF reforçou que desde janeiro de 2023 está disponível no Google Play e na App Store a Carteira Digital do Migrante, aplicativo que permite a instalação gratuita em um único dispositivo (celulares e tablets) da versão digital do CRNM e do DPRNM emitidos a partir de janeiro de 2020.

 Reconhecimento facial, validação por QR code e login com senha ou biometria reforçam a segurança do aplicativo, que tem a mesma função da carteira de identidade impressa e, portanto, é válido para atos civis.

Sair e voltar ao Brasil com o protocolo?

A aceitação ou não do protocolo CRNM pelas autoridades migratórias brasileiras e de outros países para sair e entrar no Brasil é uma das preocupações recorrentes dos migrantes cubanos e também de outras nacionalidades.

A legislação brasileira determina que os migrantes com residência temporária ou permanente, como Rafael Luis e Anisley, podem sair e entrar novamente no país com o protocolo do CRNM, pois ele comprova sua classificação migratória.

Acostumado a usar sua carteira de motorista como documento de identidade, Rafael solicitou um novo CRNM porque, sem ele, teria problemas para retornar ao Brasil. “Como eu tinha planos de ir a Cuba visitar a família, fiquei tranquilo quando o agente me disse que, com o protocolo, desde que não estivesse vencido, eu poderia viajar e voltar como qualquer outro residente”, disse ele.

Foi o que Alicia* fez em julho de 2023 quando visitou Puerto Iguazú, uma cidade argentina localizada na região conhecida como Tríplice Fronteira. “Embora eu esperasse ser expulsa do ônibus por não ter visto ou cidadania de um país membro do Mercosul, com o protocolo, a carteira brasileira vencida e meu passaporte cubano, pude entrar na Argentina e voltar ao Brasil sem problemas”, lembra a professora e pesquisadora cubana.

A liberdade de entrar e sair do Brasil é mais limitada quando se trata de refugiados e solicitantes de asilo.

Nesse sentido, a jurista e consultora em migração Denise Popa, da Diáspora Consultoria, alertou que, antes de deixar o Brasil, os solicitantes de refúgio (pessoas que ainda não receberam o status porque seu processo está pendente de análise) devem enviar sua notificação de viagem ao Comitê Nacional para os Refugiados (Conare). Se não o fizerem, “o pedido de refúgio poderá ser arquivado sem sequer ser analisado o mérito”. As solicitações de refúgio daqueles que permanecerem mais de 90 dias seguidos fora do Brasil também podem ser arquivadas.

“O arquivamento da solicitação de refúgio implica que o solicitante não será entrevistado pelos funcionários do Conare e, portanto, não poderá renovar seu protocolo de refúgio ou atualizar seu DPRNM”, acrescentou Denise Popa.

No entanto, o processo pode ser desarquivado apenas uma vez, ressaltou Popa, a pedido do solicitante de reconhecimento da condição de refugiado, por meio de um formulário específico destinado a esse fim, que deve ser enviado à Coordenação Geral do Conare.

“Diferentemente dos refugiados, os solicitantes de refúgio não têm residência reconhecida no Brasil, mas possuem uma autorização provisória para permanecer no território nacional enquanto seus casos estão sendo analisados. Portanto, aqueles que possuem apenas a cidadania cubana terão que solicitar um visto para reingressar no território brasileiro regularmente”, ressaltou o consultor.

As causas do atraso

Sobre as razões da paralisação da emissão de documentos de identidade para migrantes e solicitantes de asilo – a segunda em menos de dois anos – a PF explicou que a queda na produção diária foi condicionada por questões licitatórias e contratuais que foram resolvidas no primeiro quadrimestre de 2024.

De acordo com a entidade, a produção de 252 mil documentos anualmente (durante o período 2022-2023) foi insuficiente para atender à demanda de 388.243 pessoas que, segundo o OBMigra, se registraram no Registro Nacional Migratório durante o biênio. O número inclui 331.220 migrantes temporários de diferentes nacionalidades que tiveram de prorrogar sua autorização de residência no Brasil e solicitar um novo CRNM.

Para resolver o problema sem violar a legislação vigente – que não permite que o número de cartões contratados aumente em mais de 25% – a PF abriu um processo de licitação que durou de janeiro a abril de 2024 e no qual a empresa Valid S.A. foi a vencedora.

O contrato assinado entre a PF e a Valid S.A. prevê a produção de 1.125.000 documentos de identidade nos próximos 30 meses. Durante a vigência do contrato, a produção responderá à demanda.

Com a estratégia, a PF pretende garantir que em cada região do país a emissão e a entrega de CRNMs e DPRNMs sejam realizadas o mais rápido possível para evitar que a agitação de milhares de migrantes de diferentes nacionalidades se torne recorrente.

Nota: Após o fechamento da reportagem, Anisley Pérez e Rafael Luis retiraram seus CRNMs no posto da Polícia de Imigração de Belo Horizonte.

*A versão em espanhol desta matéria foi veiculada pelo El Toque

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