O setor têxtil emprega muitos imigrantes que vivem em São Paulo, com destaque para os de origem boliviana. No entanto, infelizmente são comuns os casos de condições precárias e de trabalho análogo à escravidão na área, frutos de uma cadeia complexa e repleta de terceirizações e quarteirizações de mão de obra, jornadas extenuantes, locais insalubres, entre outros fatores.
Quebrar esse círculo vicioso não é tarefa fácil. Mas tentar agir nesse quadro e colaborar para melhores condições no setor têxtil é o objetivo da Alinha, uma plataforma online focada na aceleração de oficinas de costura e no aumento de sua visibilidade para o mercado. Para isso, busca colaborar para a melhoria das condições de trabalho na cadeia da moda com foco no apoio ao empreendedorismo.
A iniciativa é tocada pelas amigas Monyse Almeida e Dari Santos, formadas respectivamente em Direito e Relações Internacionais pela PUC-SP, e que desde a faculdade têm interesse em ações que procurem atuar no setor de produção têxtil.
A Alinha e a Aliança Empreendedora
Desenvolvida no segundo semestre deste ano, a Alinha teve seu lançamento oficial em 16 de dezembro de 2014, em São Paulo, junto com o evento de apresentação dos resultados deste ano da Aliança Empreendedora – uma OSCIP (Organização da Sociedade Civil de Interesse Público), sem fins lucrativos, que trabalha com projetos de geração de renda, negócios inclusivos e disseminação da cultura empreendedora no Brasil.
A Alinha é um dos principais frutos do projeto Uma Mensagem para a Liberdade, tocado pela Aliança desde 2013 e que visa o fortalecimento de empreendedores e o combate ao trabalho em condições análogas à escravidão na indústria têxtil da cidade de São Paulo.
“O empreendedorismo da sala de aula não tinha nada a ver com com o empreendedorismo que de fato é feito no Brasil. Nesse cenário, nos questionamos sobre o que poderia de fato ser feito. Daí nasceu a Aliança”, resume Lina Useche, cofundadora da instituição.
Ajudar a desenvolver uma plataforma nos moldes da Alinha não estava nos planos iniciais da Aliança. “A ideia era desenvolver uma ferramenta tecnológica de denúncia para os imigrantes no segmento da indústria têxtil e junto aos imigrantes em São Paulo. Depois, a iniciativa acabou evoluindo para algo que tentasse de fato interferir na cadeia produtiva e ajudar a melhorar as condições de trabalho no setor”, explica Cristina Filizzola, também da Aliança Empreendedora.
Foi dessa revisão de projeto que nasceu a Alinha, que se encontrou com o conhecimento que Monyse e Dari já tinham acumulado sobre o tema. Enquanto Monyse acompanhou casos de trabalho análogo à escravidão quando estagiou no Ministério Público do Trabalho (MPT), Dari desenvolve pesquisas sobre o tema e teve envolvimento pessoal também com a atuação do Centro de Apoio ao Migrante (CAMI) – entidade parceira da Alinha e da Aliança.
Já com esse novo enfoque, a Alinha foi apresentada e premiada na edição mais recente do Social Good Brasil, promovido em novembro de 2014 em Florianópolis (SC), o que acelerou ainda mais a implantação da startup.
Como funciona?
A Alinha não faz mediação de mão de obra entre oficinas e compradores, mas sim dá a estes ferramentas para que possam eliminar intermediários e se conectem diretamente. Uma vez registrado no sistema (mediante resposta a um questionário), o comprador pode buscar as oficinas mais aptas a atenderem sua demanda, consultando informações que vão desde o número de funcionários aos tipos de máquinas de costura presentes em cada uma.
As oficinas também respondem a um questionário que, com base nas condições e ferramentas de trabalho de cada local, vai atribuir a ela uma pontuação. Somente oficinas com uma determinada pontuação ficarão aptas para busca e contato por meio da plataforma.
E se o local cadastrado apresentar uma pontuação baixa? Aí entra em cena uma das principais atividades da Alinha, que é fornecer dicas e orientações para a oficina aprimorar sua administração e as condições de trabalho. Com esse tipo de consultoria, o negócio pode ganhar mais pontos, tornar-se mais viável e melhor estruturado, podendo assim integrar a área pública da plataforma e ficar visível para compradores e novos negócios.
“É empoderar esses pequenos empresários, que estão muitas vezes na informalidade, com ferramentas – desde conhecimento, informação e parceiros que possam ajuda-los – para que eles consigam condições mais justas. E apoio para que eles mesmos consigam valorizar o trabalho deles. Eles já fazem um bom trabalho, só precisam mostrar isso para o mundo”, explica Dari.
Além da busca, a Alinha permite também que lojistas e oficinas façam avaliações mútuas. “Os costureiros e empresários têm liberdade de escolher com quem trabalhar. Isso eu gosto muito na proposta da Alinha”, explica o boliviano Miguel Angel Saavedra, que já trabalhou como costureiro e hoje atua como consultor. Ele também é voluntário no projeto Si, Yo Puedo, outro parceiro da Aliança Empreendedora.
Próximos passos
Com o lançamento oficial da Alinha, começa uma nova fase: o trabalho de campo junto às oficinas de costura, com o objetivo de ajudar na capacitação e expansão dos negócios, mediante à melhoria das condições de trabalho e administração de cada uma.
“Agora é a parte mais “offline”. Depois do desenvolvimento da plataforma, agora é hora de visitar as oficinas, ver as metodologias de alinhamento e aprimorar, ir para a rua mesmo”, resume Monyse.
Embora a tarefa seja árdua e possa encontrar resistência dos empreendedores mais receosos, os frutos já colhidos pela Alinha mostram que a startup tem totais condições de cumprir com o papel e a mensagem que seu próprio nome transmitem: o de alinhar e conectar não apenas negócios, mas também valores, experiências e sonhos de melhores condições de vida para todos os envolvidos na cadeia produtiva da moda. E, quem sabe, também estimular também outras iniciativas na área.
[…] plataforma Alinha foi lançada oficialmente em 16 de dezembro de 2014 (saiba mais aqui) e será em breve transformada em uma Organização Não Governamental […]