Busca por dados que permitem embasar pedidos de dupla cidadania ou mesmo por curiosidade é como uma “caça ao tesouro”, que pode variar de dificuldade dependendo de cada caso
Por Rodrigo Borges Delfim
Em São Paulo (SP)
De que cidade ou país vieram seus antepassados? Como e quando vieram para o Brasil? Essas e outras dúvidas estão bem presentes na cabeça de muitas pessoas que têm interesse na própria trajetória familiar, seja para fins de dupla cidadania ou simplesmente por curiosidade.
Um dos locais mais procurados em São Paulo para tentar buscar os chamados documentos de família, que podem conter essas informações desejadas, é o Museu da Imigração, no Brás (zona leste). Ele funciona na antiga Hospedaria do Brás, que recebeu cerca de 2,5 milhões de pessoas de todo o mundo entre 1887 e 1978, quando foi desativada. Embora o Museu não tenha esses documentos de família, conta com uma série de dados em seu acervo que podem ajudar nessa tarefa.
De acordo com o CPPR (Centro de Preservação, Pesquisa e Referência) do Museu da Imigração, mensalmente são recebidas cerca de 1.000 solicitações de pesquisas de documentos de família – seja pessoalmente, via e-mail, telefone ou correspondência.
Para ajudar a atender demandas como essas, o Centro de Preservação, Pesquisa e Referência do Museu da Imigração conta com atendimento ao público gratuito, de terça a sexta, das 13h às 17h (exceto feriados). Também promove palestras semestralmente com dicas práticas sobre como e onde consultar dados que podem ajudar a buscar os documentos de família – tanto no acervo da instituição como em outras fontes no Brasil e no exterior, dependendo de cada caso.
A próxima palestra, aliás, ocorre no dia 22 de fevereiro, das 14h30 às 17h30, intitulada “Pesquisando Documentos de Família”, a ser ministrada pelo historiador Henrique Trindade, pesquisador do CPPR do Museu (veja mais informações no serviço ao final da matéria).
Na entrevista abaixo, concedida ao MigraMundo, Trindade cita a importância de ações como essa tanto para auxiliar as pessoas na busca pela história de suas famílias como para conectar as migrações do passado e do presente. “O papel social que o Museu da Imigração desempenha, nesse sentido, é muito importante”, resume.
MigraMundo: Qual sua avaliação sobre esse tipo de evento, em relação à presença e participação do público?
Henrique Trindade: As pessoas realmente possuem muito interesse pelo tema. Nas redes sociais do Museu, por exemplo, as postagens sobre histórias de famílias, curiosidades históricas da Hospedaria e divulgação da palestra “Pesquisando Documentos de Família” são as que têm maior número de curtidas, compartilhamentos e comentários. O auditório do museu, quase lotado para o evento numa quinta-feira [10 de agosto de 2017, data da palestra anterior], é reflexo desse interesse. Todo mês, por volta de mil solicitações de pesquisas de documentos de família são feitas ao museu, seja pessoalmente, no Centro de Pesquisa, via e-mail, telefone ou correspondência.
MigraMundo: Na sua opinião, o que eventos como esse mostram sobre o trabalho do museu, que busca dialogar tanto com as migrações históricas como com as atuais?
Henrique Trindade: Eventos como esse sempre são uma oportunidade para que os visitantes conheçam os projetos que o museu está realizando ou já realizou. As pessoas começam se interessando pelo tema dos documentos de imigrantes que chegaram ao Brasil no final do século XIX, por exemplo; ficam sabendo da palestra, na palestra sabem que o Museu possui um Centro de Pesquisa, visitando o Centro de Pesquisa sabem que possuímos uma biblioteca especializada no tema da migração, um acervo de história oral com centenas de entrevistas, inclusive projetos relacionados à migração contemporânea (exposições, eventos, projetos de história oral). Além disso sempre procuramos, nessas ocasiões, informar para as pessoas que, além de Museu, o espaço da antiga Hospedaria de Imigrantes do Brás é também, ainda hoje, um espaço de acolhida para migrantes nacionais e internacionais, o Arsenal da Esperança. Isso faz com que as pessoas reflitam bastante sobre a experiência do migrar, que a migração não parou no tempo, não aconteceu somente lá longe, há dezenas de anos e agora acabou. A experiência de um migrante que chega hoje ao Brasil pode ter muitos contatos com a experiência de um antepassado nosso que chegou no Brasil há mais de 100 anos. O papel social que o Museu da Imigração desempenha, nesse sentido, é muito importante.
MigraMundo: Quando exatamente a pessoa deve procurar o Museu para saber sobre como procurar os registros que podem levá-la a encontrar os documentos de família?
Henrique Trindade: As pessoas podem procurar o museu em qualquer fase da busca por registros. Se quiserem saber como começar uma pesquisa, se quiserem algum dado mais específico para melhorar o desenvolvimento da pesquisa, estamos sempre à disposição.
MigraMundo: Na sua opinião, quando a pessoa realmente deve recorrer a alguma ajuda paga para conseguir a documentação necessária?
Henrique Trindade: As pesquisas de documentos de família, geralmente, podem ser feitas de forma totalmente gratuita. Claro que existem custo para emissão e envio de certidões encontradas, por exemplo. Porém, a pesquisa em si, pode ser feita em arquivos públicos. Acontece que, em alguns casos, as dificuldades para se obter informações relativas à localização de documentos são maiores. Quando isso acontece pode-se recorrer à ajuda de profissionais. É importante sempre tomar cuidado com preços exorbitantes que são cobrados para esse tipo de serviço, muita gente explora o desconhecimento das pessoas. Sempre é bom procurar várias referências, pedir avaliações de quem já fez uso desses serviços.
MigraMundo: Qualquer pessoa pode entrar em contato com os diretores de arquivos públicos nos países de origem? Há alguma dica para ajudar nessa comunicação?
Henrique Trindade: Sim, qualquer pessoa pode entrar em contato, pedir informações e auxílio para os arquivos distritais, nacionais, estaduais, nos países de origem do familiar migrante. A primeira dica é que procure se comunicar no idioma do arquivo. Assim, se tiver que entrar em contato com algum Archivio di Stato na Itália, por exemplo, minha sugestão é que envie um e-mail em italiano. Inclusive existem alguns modelos de solicitações disponíveis na internet para alguns casos. Minha segunda dica é procurar ser objetivo. Não precisa contar toda a história da família, citar o nome de todos os familiares, etc. Escreva, objetivamente, apenas o que procura.
MigraMundo: Para finalizar, uma pergunta para descontrair: seria essa procura pelos documentos de família uma espécie de “caça ao tesouro” para todas as idades, que varia de dificuldade caso a caso?
Henrique Trindade: Sim, é uma investigação. Toda pesquisa histórica é uma investigação. Quais informações eu tenho? Quais informações eu desejo? No que as informações que eu tenho me ajudam a encontrar as informações que desejo? São essas as questões essenciais para começar uma pesquisa. Cada caso possui sua dificuldade específica mas sempre é possível descobrir alguma informação.
Checklist
Segundo Trindade, as principais dúvidas dos que procuram o acervo do Museu em busca de documentos de família estão em torno de três pilares principais. Ter respostas para essas perguntas é um bom ponto de partida para iniciar essa “caça ao tesouro”:
- Onde e quando o imigrante nasceu – no caso de imigrantes italianos, por exemplo, é preciso saber o nome do Comuni (o equivalente à aldeia) na qual ele nasceu. Em Portugal, é necessário saber o nome da freguesia de origem;
- Onde e quando o imigrante se casou (caso tenha se casado, é claro);
- Onde e quando ele morreu;
Antes de dar entrada em um pedido de cidadania – e de começar a busca pelos documentos – é importante ter em vista:
- Você realmente tem direito a uma cidadania europeia?
- Se sim, quais os documentos necessários?
- Além da documentação, que outras exigências você precisa cumprir? Cada país pode ter uma exigência específica, como residir lá por um determinado período, uma avaliação de conhecimento sobre o idioma nacional, entre outras
- Que documentos e outras informações que você já possui? E quais estão faltando?
Com esse checklist feito, é mais fácil saber o que buscar e onde. Nunca é demais lembrar que tanto o acervo do Museu como de outros arquivos públicos no Brasil e no exterior possuem certas limitações, seja por conta do acesso e/ou do estado de conservação dos documentos.
Palestra “Pesquisando Documentos de Família”
Data e hora: 22 de fevereiro de 2018, das 14h30 às 17h30
Local: Museu da Imigração do Estado de São Paulo
Endereço: Rua Visconde de Parnaíba, 1316 – Mooca, São Paulo (SP) – próximo à estação Bresser-Mooca do metrô
Entrada: gratuita – inscrições a serem feitas pelo e-mail [email protected]
Centro de Preservação, Pesquisa e Referência do Museu da Imigração
Atendimento ao público: De terça a sexta, das 13h às 17h (exceto feriados)
Local: Museu da Imigração