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sexta-feira, junho 13, 2025

DPU processa União e Latam por morte de migrante ganês que ficou retido no Aeroporto de Guarulhos

Defensoria cobrou R$ 10 mi de indenização e plano de acolhimento para migrantes que aguardam autorização de entrada no país na área restrita do terminal

A Defensoria Pública da União (DPU) ingressou com uma ação civil pública contra a União e a companhia aérea Latam pela morte do imigrante ganês Evans Osei Wusu, depois de ter passado mal após dias na área restrita do Aeroporto Internacional de Guarulhos (SP) sem receber a devida assistência.

Evans havia chegado ao Brasil em 8 de agosto de 2024 e estava retido na área restrita quando se sentiu mal, no dia 11. Ele foi transferido ao Hospital Geral de Guarulhos, mas veio a falecer já no dia 13. O Ministério da Justiça, no entanto, disse ter sido notificado do óbito somente no dia 16.

Impetrada na última segunda-feira (19), a ação pede a adoção de um plano de acolhimento para os migrantes que aguardam autorização de entrada no país na área restrita do aeroporto de Guarulhos. Além disso, cobra um valor de R$ 10 milhões como indenização por danos morais individuais e coletivos, além de danos materiais.

“Apontamos na petição que, a partir da investigação conduzida pela DPU, se identificou que os migrantes foram e são submetidos a situação degradante e que, no caso de Evans, resultou no extremo, que foi sua morte”, explicou o defensor regional de direitos humanos de São Paulo (DRDH/SP), Murillo Martins, em comunicado da DPU à imprensa. Além dele, assinam a ação os defensores Natália Von Rondow, do Grupo de Trabalho Políticas Etnorraciais, e Ed Fuloni, do Grupo de Trabalho Migração, Apatridia e Refúgio.

Ainda segundo a DPU, a União é responsável pela morte de Evans tanto pela ausência de assistência aos migrantes retidos como pela demora no processamento da solicitação de refúgio, que fez com que ele ficasse muito tempo na área restrita. A companhia aérea, por sua vez, foi denunciada pela falta de assistência, tanto no momento em que Evans estava em área restrita, como depois de seu falecimento dele. Além disso, a Defensoria apontou que a Latam sonegou informações ao hospital, o que resultou no enterro do migrante sem que a família soubesse.

Martins destacou ainda que o caso Evans revela traços do racismo estrutural presente nas políticas migratórias e nos serviços públicos. Para o órgão, a negligência sofrida por Evans está diretamente ligada à sua cor e origem. “Será que suas queixas de saúde teriam sido ignoradas por tanto tempo, tivesse ele outra aparência?”

A União, por meio do Ministério da Justiça, informou que “não cabia à Senajus [Secretaria Nacional da Justiça] o acompanhamento da assistência específica ao migrante de Gana”.

“A Senajus não foi comunicada sobre a situação do viajante. A comunicação à Secretaria Nacional de Justiça, do Ministério da Justiça e Segurança Pública, aconteceu no dia 16 de agosto, após o falecimento do migrante de Gana”, complementou a pasta.

Em nota enviada ao portal G1, a Latam informou que não foi notificada e não comentará o assunto.

Respostas e repercussão

O caso da morte de Evans gerou revolta e repúdio tanto junto à comunidade migrante quanto entre atores da sociedade civil e do meio acadêmico com inserção na temática migratória. Ela também trouxe à tona um tema que de tempos em tempos retorna ao noticiário: a situação precária de pessoas de outros países que ficam retidas em uma área restrita do terminal internacional do aeroporto de Guarulhos – o famoso “conector”.

Na época, a DPU também listou uma série de recomendações dirigidas tanto a autoridades públicas quanto privadas para lidar com a questão dos migrantes retidos nessa área restrita.

Ato em São Paulo pediu justiça para migrante ganês que morreu após passar mal na área restrita do aeroporto de Guarulhos (SP). (Foto: Fórum Fronteiras Cruzadas/Divulgação)

Entre as recomendações, a DPU havia proposto a adoção de um procedimento chamado admissão excepcional ou entrada condicional, que permitiria que a pessoa fosse admitida no território nacional após ser identificada e, dentro de um prazo de oito dias, completasse a solicitação de refúgio.

A principal resposta do governo federal a essa situação veio em 26 de agosto, por meio de uma portaria do Ministério da Justiça, que foi exatamente no sentido contrário do que recomendou a Defensoria. A pasta optou por restringir a solicitação de refúgio por parte de pessoas migrantes que estejam apenas em trânsito pelo país.

Por essa norma, que segue em vigor, quem entrar com pedido de refúgio no Brasil e for de um país do qual é exigida a apresentação de visto terá que provar que está sendo perseguido no país de origem para ter autorização para ingressar em território brasileiro.

Essa medida tem sido fortemente questionada tanto pela sociedade civil quanto pelo meio acadêmico e jurídico. Tais atores apontam tanto violações aos direitos garantidos aos migrantes por meio da legislação nacional quanto de acordos internacionais firmados pelo Brasil.

As manifestações contrárias à medida ressaltam que o caminho a ser adotado é o da construção de políticas públicas que definam direitos e deveres de cada um dos atores envolvidos com a temática migratória, e não o de restrições puras e simples.

O governo federal, por sua vez, sustentou que o Brasil tinha se tornado um local de trânsito de migrantes que visam basicamente chegar aos Estados Unidos e Canadá. E que a restrição visava dar uma resposta a denúncias de que o país tem sido usado como rota de organizações criminosas para tráfico de pessoas. Essa visão se baseia em um relatório da Polícia Federal que apontou que a maioria dos solicitantes de refúgio no Brasil não tem motivações que justifiquem a admissão no país sob tal condição.

A pasta ainda sustentou que a restrição não atenta contra a legislação migratória brasileira e protege o instituto do refúgio de usos indevidos.


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