Por Ana Carolina Montoro
Com as eleições municipais cada vez mais próximas, é preciso analisar com mais atenção as candidaturas de prefeitos e vereadores e ver quais são suas propostas para proteger grupos tradicionalmente excluídos e reduzir injustiças. Nesse cenário, a Ação Brasileira de Combate a Desigualdade (ABCD) organizou a Semana Eleições e Desigualdades (5 a 9 de outubro) para falar sobre as diversas formas de desigualdades dentro das cidades. E a questão das migrações foi um dos temas desse evento, também em formato online.
A mesa sobre migrações ocorreu na última quinta-feira (8), com o título “Proteção de direitos de migrantes e refugiados nas cidades”, transmitida pela página da Missão Paz no Facebook. A entidade, sediada no bairro do Glicério, é considerado um dos pontos de referência no atendimento e orientação à comunidade migrante na cidade, além de um centro de estudos sobre fluxos migratórios.
O debate teve mediação do padre italiano Paolo Parise, um dos diretores da Missão Paz, e focou principalmente na atual marginalização dos migrantes, onde mesmo aqueles que chegam com diploma de ensino superior e anos de experiência, são recolocados no mercado de trabalho através dos chamados subempregos pela dificuldade em comprovar e validar suas qualificações no Brasil.
A mesa foi composta pela peruana Soledad Requena, mestre em Políticas Públicas e membro do ProMigra, a congolesa Hortense Mbuyi Mwanzaeda, participante da Comunidade Congolesa no Brasil (CCB) e membro do Conselho Municipal de Imigrantes de São Paulo, e pelo idealizador do projeto Visto África, o guineense Vensam Iala.
Xenofobia junto à comunidade africana
De acordo com os participantes, a primeira e maior dificuldade dos imigrantes que chegam ao Brasil é a recolocação no mercado de trabalho. Esse cenários faz com que mesmo aqueles mais qualificados profissionalmente acabem aceitando os chamados subempregos para se manterem no país.
“Mesmo os imigrantes sendo pessoas qualificadas, com anos numa profissão, a imigração acaba matando a experiência do imigrante. Matando os currículos. Emprego faz parte da saúde mental das pessoas. As pessoas que se recusam a alugar a casa para o imigrante africano”, aponta Hortense Mbuyi Mwanza, da Comunidade Congolesa do Brasil (CCB).
Já Vensam Iala, idealizador do projeto Visto África, levantou a questão da xenofobia e da saída brasileira do Pacto Global da Migração. “Imagina um país que se retirou institucionalmente de um pacto global da ONU. É como se desse um álibi a todas as situações de discriminação que acontecem com os imigrantes e pessoas em situação de refúgio. O Brasil é um país que tem um sistema estrutural racista. Isso faz com que nós, enquanto africanos, compramos a briga dos brasileiros. E nós não somos nascidos nesse país, isso vai agravar os preconceitos, o racismo e a xenofobia”.
Iala também voltou a falar sobre o mercado de trabalho: “É preciso que se criem políticas públicas para valorização e reconhecimento dessas pessoas em situação de refúgio para que seus diplomas sejam reconhecidos e que eles possam ter oportunidade de exercer suas funções. Estamos falando de um país que no seu cerne tem uma gama muito diversa e rica de diversidade migratória. Precisa-se de políticas públicas que facilitem a inserção desses imigrantes no mercado de trabalho”.
Carta-compromisso e desigualdade econômica
O debate entre os imigrantes ocorre poucos dias após a apresentação de uma carta-compromisso, assinada por 39 organizações da sociedade civil que atuam em São Paulo, direcionada aos candidatos aos cargos de vereador e prefeito da capital.
Ao longo de 13 itens, o documento pede que o candidato se comprometa a apoiar leis, implementar ações e destinar recursos, bem como exercer o mandato em sintonia com a Política Municipal para a População Imigrante de 2016, além de fortalecer ações de combate ao trabalho escravo e infantil.
As propostas da carta são uma tentativa de formalizar futuras políticas públicas para mudar a realidade da desigualdade dentro da comunidade migrante. Soledad pontuou, por exemplo, que segundo a Organização Internacional do Trabalho (OIT), 70% de todos os migrantes hoje no mundo são pobres e quando essas pessoas chegam ao Brasil, tem suas vidas ainda mais dificultadas pela desigualdade nacional.
A integrante do ProMigra também lembrou que não dá para falar em políticas públicas sem discutir os recursos orçamentários para essa demanda que é urgente.
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