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quinta-feira, novembro 21, 2024

Migrantes devem valorizar a própria cultura, diz artista peruano radicado no Brasil

Artista contemporâneo que se inspira na era pré-colombiana, Adrián Ilave mostra que a cultura peruana vai muito além da gastronomia

Por Eva Bella (texto e fotos)

Inquieto, criativo, elegante e curioso. Um artista completo. Não é fácil definir Adrián Ilave.

Esse peruano de 32 anos, que vive em São Paulo há cerca de 3 anos, nasceu em Lima e passou boa parte de sua vida em Cusco. Ele vem de uma família onde existe a verdadeira essência da cultura peruana: afro, hispana e indígena – o que faz dele um artista único, com um repertório imenso.

Sua inspiração é a era pré-colombiana da América Latina, mesclando com arte contemporânea. Qualquer material é motivo para novas experiências – tecido, madeira, papel, papelão. Nem o corpo humano escapa às habilidades do artista e vira instrumento para suas criações.

Adrián Ilave promove a mescla entre o contemporâneo e a cultura pré-colombiana em suas criações.
Crédito: Eva Bella/MigraMundo

Em se tratando de literatura, Adrián cita Felipe Guamán Poma de Ayala (1550-1616) como cronista, o que ajuda a compreender melhor a sua obra artística. Em mais de mil páginas e quase quatrocentos desenhos, o autor (que é cronista indígena) mostra como assimilou a cultura européia, representando em letra e imagem o impacto da chegada dos espanhóis aos Andes.

“‘Primeira nova crônica y buen governo ( 1615) é considerada uma das obras mais excepcionais da literatura iberoamericana, que nos presenteiam o processo de destruição do mundo andino”, lembra o artista.

Ilave é capaz de formar uma grande unidade visual que prende o expectador. Ele conjuga texto e ilustração, produzindo unidades extremamente complexas, rica em detalhes, e retratava um pouco de tudo: vestimentas, personagens, costumes, governantes incas, religiosidade, guerra, enfim, a vida cotidiana.

Recado aos migrantes

Logo nos primeiros minutos de conversa é possível perceber como ele é apaixonado pela cultura andina.  Ilave me recebe vestido com uma roupa criada por ele, com sua interpretação.

Uma das peças usadas por Adrián para receber o MigraMundo foi a sua Maskaypacha (coroa usada pelos incas no período pré-colombiano), que foi criada com símbolo de sua identidade: o vermelho aparece como cor imperial; a meia lua é seu sobrenome; ao centro está o brasão do Peru; e na parte inferior, a representação das 7 artes (música, dança, pintura, escultura, literatura, teatro e cinema).

Adrián Ilave explica sobre coroa inca criada por ele próprio como forma de retratar sua identidade.
Crédito: Eva Bella/MigraMundo

Falando em identidade, o artista deixa um recado direto aos migrantes em relação à cultura. “Não esqueçam suas raízes. Tentar copiar outras coisas de outras culturas é uma falta de respeito por vocês mesmos, não tenham vergonha! As pessoas gostam de conhecer outras culturas, os artistas imigrantes. Sejam orgulhosos de vocês mesmos, a América Latina está aberta a todos vocês”.

De Lima a São Paulo

Na cidade natal, Lima, Ilave desenvolveu muitos trabalhos artísticos de grande porte, como decoração de hotéis e pinturas em murais. Desde que chegou ao Brasil, vem criando murais para restaurantes peruanos. Além disso, produz e cria capas para a Revista Paila, periódico online produzido no Brasil por peruanos e brasileiros que buscam dar destaque para a cultura peruana.

Ilave diz que São Paulo o cativou por ser a Meca da América Latina. “Há essa mistura de culturas, muita arte para curtir e experimentar, uma cidade incrível, que reúne as raças, costumes e é acolhedora”.

Em se tratando de literatura, Adrián cita Guamán Poma de Ayala como cronista, o que ajuda a compreender melhor a sua obra artística.
Crédito: Eva Bella/MigraMundo

Por esse apego à cidade que agora lhe serve de morada e inspiração, Ilave também se posicionou sobre um tema polêmico: os murais de graffiti que foram apagados recentemente pela Prefeitura de São Paulo. Ele demonstra tristeza ao lembrar que já aconteceu algo parecido em Lima e espera que isso seja reparado de alguma forma.

“Deletar o graffiti é apagar a história! O graffiti vem da Antiguidade, conta coisas interessantes do cotidiano. Só mudou o material”.

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