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quinta-feira, janeiro 9, 2025

Mudanças da Meta sobre conteúdo em redes sociais libera discurso de ódio contra migrantes

Alterações anunciadas pela big tech sobre moderação de conteúdo geram preocupações quanto à disseminação de preconceitos e outras manifestações de ódio contra grupos em situação vulnerável, entre eles migrantes

A Meta – empresa do tipo “big tech” responsável pelas redes sociais Facebook, Instagram e Threads – decidiu afrouxar suas políticas de moderação de conteúdo que visam coibir a disseminação de desinformação. E um dos pontos alterados por essa nova diretriz deve ter impacto direto sobre as populações migrantes.

Conforme anunciado na última terça-feira (7) pelo CEO da Meta, Mark Zuckerberg, o mecanismo de checagem de informações em vigor desde 2016, feito por agências independentes, será trocado por um sistema de “notas da comunidade”, a exemplo do que ocorre com o X (antigo Twitter). E entre as mudanças estão a eliminação de “várias restrições em tópicos como imigração e gênero”.

Com a mudança na política de moderação de conteúdo, a Meta se aproxima do presidente eleito dos Estados Unidos, Donald Trump, e de sua narrativa que usa a liberdade de expressão como licença para divulgação de conteúdo discriminatório contra grupos que não dialogam com a agenda defenidida pelo republicano e aliados/admiradores. O futuro ocupante da Casa Branca tem entre suas principais bandeiras o rechaço à migração, inclusive a que ocorre por vias documentais.

Ao jornal O Globo, a Meta confirmou que as diretrizes se aplicam a todos os países onde as redes sociais da big tech operam, entre eles o Brasil. O Ministério Público Federal, por exemplo, notificou a big tech na quarta-feira (8) a prestar esclarecimentos dentro de 30 dias sobre a nova política de moderação de conteúdo em suas plataformas.

Procurada pela Agência Brasil, a Meta disse que não vai comentar a manifestação do MPF.

Embora também seja parte da Meta, as mudanças anunciadas para redes sociais não se aplicam ao WhatsApp, aplicativo de mensagens popular no Brasil.

“Desconexão do discurso dominante”

Segundo o anúncio feito pelo CEO da Meta, “é hora de voltar às nossas raízes sobre a liberdade de expressão” porque o sistema anterior “tinha muitos erros e censura”. Em relação à imigração, em específico, as restrições estavam “desconectados do discurso dominante” e por isso serão removidas.

Pelo menos em teoria, as novas diretrizes da big tech ainda proibem:

  • ataques de “Nível 1” ou “mais severos”, contra migrantes, imigrantes e solicitantes de asilo
  • chamar imigrantes, bem como pessoas pertencentes a grupos de “características protegidas,” de insetos, animais, patógenos ou “outras formas de vida sub-humanas”
  • afirmar que imigrantes são criminosos ou imorais

A troca das equipes de checagem pelas “notas da comunidade”, no entanto, abrem espaço para que toda essa avaliação seja feita de uma forma bem menos criteriosa, o que deixa a porta aberta para que até tais restrições ainda vigentes sejam relativizadas.

Outra restrição eliminada da nova política é a que proibia alegações de que determinados grupos (seja por raça, etnia ou gênero) espalhavam o vírus causador da Covid-19. Por ter sido identificada primeiro na China, a doença foi por bastante tempo associada ao país asiático, levando a ações de discriminação contra os chineses.

Em 31 de junho de 2021, a OMS (Organização Mundial de Saúde) mudou a nomenclatura das variantes da Covid-19, até então associadas ao local onde as cepas eram identificadas, passando a utilizar letras do alfabeto grego. A medida, segundo a entidade, foi evitar que a pandemia fosse associada e servisse de pretexto para xenofobia e outras formas de preconceito contra determinadas nacionalidades.

Na prática, esse tipo de associação volta a ser liberada nas redes sociais do conglomerado de Zuckerberg.

Desde a mudança nas regras de moderação entrou em vigor, na terça-feira, a empresa deixou de excluir de forma proativa posts homofóbicos, transfóbicos e xenófobos.

Preocupações

As mudanças anunciadas pela Meta são vistas com grande preocupação por meios de comunicação, juristas e pesquisadores.

“Especialmente no caso dos migrantes, a circulação irrestrita de conteúdos, sem moderação, pode levar ao aumento da desinformação sobre um tema sensível e já bastante polêmico, além do acirramento de discursos de ódio que levam a situações de violência já observadas no cotidiano”, aponta Liliane Dutra Brignol, professora do Departamento de Ciências da Comunicação da Universidade Federal de Santa Maria (UFSM).

Ao MigraMundo, a pesquisadora ressalta ainda que tal efeito é ampliado ainda pelo posicionamento da Meta em comunhão com a agenda de Donald Trump e de outros líderes locais e globais que apostam nas hostilidades contra migrantes como bandeira política. E que o cenário, já difícil, tende a piorar daqui em diante.

“Em sociedades hostis à presença migrante, com o reforço de posicionamento de extrema-direita e com políticas mais restritivas, como defendidas na campanha eleitoral vitoriosa de Donald Trump, a expectativa, infelizmente, é de que as condições de vida dessas populações sejam ainda mais difíceis nos próximos anos”.

O anúncio da Meta também teve manifestações no meio político brasileiro. “Não podemos aceitar que o ódio e a intolerância sejam disfarçados de ‘debate cultural ou político’. É papel de todos nós, especialmente de grandes empresas como a Meta, garantir que os ambientes digitais sejam locais de inclusão e respeito — não de violência e exclusão”, diz a senadora Mara Gabrilli (PSD-SP), que integra a Comissão Mista do Congresso para Migrantes Internacionais e Refugiados (CMMIR), em entrevista à revista Veja.

Além disso, mais de 60 entidades, centros de pesquisas universitários e coletivos ao redor do mundo assinaram uma carta aberta contra o fim da checagem de fatos nas plataformas da Meta. No documento, os signatários reforçam a necessidade de uma regulação nas redes sociais que “priorize os direitos humanos e a segurança digital”.

“Sob o pretexto de ‘restaurar a liberdade de expressão’, as propostas delineadas não apenas colocam em risco grupos vulnerabilizados que usam esses serviços, mas também enfraquecem anos de esforços globais para promover um espaço digital um pouco mais seguro, inclusivo e democrático”, diz trecho do documento, disponivel na íntegra em publicação do jornal O Estado de S. Paulo.


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