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segunda-feira, novembro 25, 2024

A migração e as exigências da democracia

O combate incansável ao autoritarismo de extrema direita, revestido de nacionalismo popular, é desafio que se impõe com urgência

Por Pe. Alfredo J. Gonçalves
No Rio de Janeiro

Primeira notícia. Caminhão com 39 cadáveres é encontrado num parque industrial na região de Essex, Reino Unido. Infelizmente, não se trata daqueles filmes de suspense, próprios do diretor britânico Alfred Hitchcock. Em lugar de ficção, trata-se da mais pura realidade: são 38 adultos e um adolescente, de nacionalidade vietnamita, que haviam saído da Bulgária. Por via alternativa, o caminhão cruzou o Canal da Mancha, chegando à costa da Inglaterra. O primeiro-ministro inglês se disse “horrorizado com esse trágico fim”. A polícia trabalha com a hipótese de tráfico de pessoas. (G1, 27.out).

Segunda notícia. “Os ministros do Interior da União Europeia chegaram a um consenso na passada segunda-feira sobre um novo mecanismo para ‘distribuir’ os migrantes que chegam em embarcações clandestinas na costa italiana ou maltesa. O ‘princípio de acordo’ foi discutido em Malta e será apresentado no dia 8 de outubro aos ministros do Interior de 28 estados membros” (UOL, 29.set).

Terceira notícia. De acordo com a Revista do Cepam/Caracas, “a crise migratória venezuelana é talvez o fenômeno regional mais ignorado pela comunidade internacional. Em escassos quatro meses, o ritmo acelerado de imigrantes e refugiados venezuelanos que fogem de seu país aumentou de 4 milhões para 4,6 milhões, e as projeções esperam que para o final do ano alcance a cifra de 5 milhões de ‘desplazados’. Com referência à população da Venezuela, representa uma fuga de quase 15% dos cidadãos” (Revista Acontecer Migratorio, Vol. 42, nº 10, outubro de 2019, pág. 12).

Estendendo o olhar para além dessas três notícias contam-se hoje aos milhões os migrantes, prófugos e refugiados que estão sendo represados em países de passagem ou de fronteira, tais como Líbia e Marrocos (rota mediterrânea entre África e Europa), Turquia e Grécia (rota balcânica entre Oriente Médio e Europa) Itália e Espanha (sul da Europa), Guatemala e México (rota entre América Central e América do Norte). Constituem um retrato vivo da política migratória (ou da falta dela) desenvolvida atualmente por todo o planeta, em maior ou menor grau.

Na contramão da economia globalizada, do aumento da atividade turística, do pluralismo cultural, étnico e religioso, da circulação de mercadorias, informações e capital – as esperanças dos migrantes acabam sendo brutalmente varridas por ventos fortes e adversos.

Sonhos longamente acalentados e laboriosamente alinhavados convertem-se em pesadelos, interrompidos no meio da travessia. Não raro terminam em tragédias, as quais, de tão frequentes parecem já nem sequer assombrar a sociedade e as autoridades internacionais. Com razão o Papa Francisco vem alertando para a Terceira Guerra Mundial “aos pedaços”.

As estimativas mais recentes apontam para 272 milhões o número de pessoas que residem fora do país em que nasceram. Dezenas e dezenas delas podem ser consideradas refugiados, seja das tensões e conflitos que terminam em guerras abertas, seja da pobreza e da miséria da subnutrição e da fome, seja, enfim, das catástrofes climáticas.

São “os condenados da terra”, na crua expressão da obra de Frantz Fanon. Faz-se necessário um imperativo de ordem ética, no sentido de regular as exigências da democracia. Ao lado desse apelo de caráter moral, outro desafio se impõe com a máxima urgência: o combate incansável ao autoritarismo de extrema direita, revestido com as roupas enganosas do nacionalismo popular. E, ao mesmo tempo, desmascarar a hipocrisia do fanatismo e fundamentalismo religiosos, os quais, em nome de Deus, acabam perpetrando um retorno pernicioso a formas retrógradas e ultrapassadas de visão de mundo e de forma de governo.

Em outras palavras, como defender os canais, os instrumentos e os mecanismos da democracia, regime que, não obstante tantos avanços e recuos, permite maior participação popular?

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