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quarta-feira, março 19, 2025

Oscar 2025 traz recados ao mundo sobre migração, democracia e Palestina

Cerimônia de entrega do maior prêmio do cinema manteve tendência de anos anteriores, com o discurso de vitória seervindo para posicionamento sobre temas da atualidade

A cerimônia de entrega do Oscar 2025, ocorrida na noite de domingo (2) foi especial para o Brasil, por render ao país sua primeira estatueta com o reconhecimento de Melhor Filme Internacional para “Ainda Estou Aqui”. Além disso, o evento trouxe também outros recados em discursos e premiações, inclusive na pauta migratória, mantendo uma tendência verificada já em edições anteriores.

Em 2023, por exemplo, a vitória de “Tudo em Todo Lugar ao Mesmo Tempo” trouxe a questão migratória de forma direta, tanto no enredo quanto junto aos atores premiados. Na edição de 2015, o cineasta mexicano Alejandro Gonzáles Iñárritu, que recebeu quatro prêmios pelo filme “Birdman”, aproveitou a imensa visibilidade do evento e dedicou o seu discurso em favor dos direitos dos seus compatriotas, que vivem em condições precárias nos Estados Unidos.

Abaixo, o MigraMundo recorda momentos da cerimônia nos quais o entretenimento esteve lado a lado com questões políticas da atualidade, com atores e diretores se posicionando abertamente em relação a esses assuntos.

Discurso em defesa dos migrantes

Premiada como melhor atriz coadjuvante pela atuação em “Emilia Perez”, Zoe Saldaña usou o discurso de agradecimento para defender os migrantes. Nascida nos Estados Unidos, ela é filha de imigrantes dominicanos.

“Minha avó veio para este país em 1961. Tenho orgulho de ser filha de imigrantes! Com sonhos, dignidade e mãos trabalhadoras. E eu sou a primeira dominicana-americano a receber um Oscar. E sei que não serei a última.”

O discurso de Saldaña ganha força diante da política migratória empreendida nos Estados Unidos pelo atual presidente, Donald Trump. Tendo o rechaço à migração como uma de suas bandeiras políticas, o republicano apresenta uma postura ainda dura que em seu mandato anterior (2017-2021). Sob a atual gestão, programas de acesso humanitário ao país foram encerrados, agentes de imigração ganharam ainda mais poder para realizar operações e prisões de pessoas em situação documental irregular, entre outras medidas.

Trump quer ainda rever o entendimento em vigor atualmente sobre a 14ª Emenda da Constituição dos Estados Unidos, que garante o direito à cidadania a qualquer pessoa nascida em território estadunidense, incluindo filhos de migrantes indocumentados ou sem status permanente no país. Essa ação, no entanto, vem encontrando obstáculos junto à Justiça.

Defesa da Palestina

Vencedor na categoria Melhor Documentário, a produção “Sem Chão” (no inglês No Other Land), dirigido por quatro ativistas palestinos e israelenses (Yuval Abraham, Basel Adra, Rachel Szor e Hamdan Ballal) leva para o cinema a ocupação ilegal de Israel sobre a Cisjordânia.

No longa, os habitantes de uma aldeia palestina na Cisjordânia tentam combater um plano de transformar o local em um campo de treinamento militar israelense.

“Que a injustiça e a limpeza étnica sejam paradas”, disse o palestino Basel Adra, ao receber o prêmio. Ele dividiu o palco com o israelense Yuval Abraham, que enfatizou a colaboração entre israelenses e palestinos na realização do documentário. “Fizemos esse filme juntos. Juntos, palestinos e israelenses, nossas vozes são mais fortes”.

O documentário ganha conotação especial diante do conflito iniciado em outubro de 2023 sobre Gaza, em resposta a um ataque terrorista sofrido por Israel. A guerra atualmente encontra-se suspensa oficialmente por um frágil acordo de cessar-fogo entre o grupo Hamas e o governo israelense.

A fragilidade ficou ainda maior por conta da proposta de Trump de assumir o controle de Gaza e de deslocar de forma permamente os palestinos que vivem no território para outros países da região, como Egito e Jordânia. Essa proposta, condenada por grande parte da comunidade internacional, também foi criticada por Abraham no discurso

“Existe uma situação política, um caminho diferente, sem supremacia, com direitos nacionais para os dois povos. E a política estrangeira deste país [EUA] está ajudando a impedir que esse caminho seja tomado. E por quê? Não dá para ver que nós dois somos unidos? O meu povo só vai ficar seguro se o povo do Basel estiver livre e seguro. Existe uma outra forma de fazer as coisas. Não está tarde demais”, expressou ele.

Com Sem Chão, a Palestina também conquistou seu primeiro Oscar, a exemplo do Brasil. Outro país a estrear no rol de contemplados com uma estatueta foi a Letônia, com a animação Flow.

Defesa da democracia e brasileiros exilados

O próprio “Aqui Estou Aqui”, que entrou para a história como o primeiro filme a ser agraciado com um Oscar, também traz consigo uma mensagem ao mesmo tempo local e global, de defesa da demcoracia.

O longa brasileiro narra a trajetória de Eunice Paiva em busca da verdade sobre a morte de seu marido, Rubens Paiva, além de seu processo de reinvenção para traçar um futuro melhor para si e seus filhos. Além de falar do período mais repressivo da ditadura militar brasileira, no começo da década de 1970, o filme ainda fala de forma mais discreta da questão do exílio, usado por brasileiros opositores ao regime como forma de fugir da repressão estatal e até mesmo de se organizar contra ela.

“Em nome do cinema brasileiro, é uma honra tão grande receber isso de um grupo tão extraordinário. Isso vai para uma mulher que, depois de uma perda tão grande em um regime tão autoritário, decidiu não se dobrar e resistir”, afirmou o diretor Walter Salles em seu discurso de agradecimento pelo prêmio, dedicando-o a Eunice Paiva e às duas atrizes que deram vida a ela no cinema: Fernanda Torres e Fernanda Montenegro.

Salles também criticou ações de questionamento à democracia em curso mundo afora, incluindo os próprios Estados Unidos e o Brasil (onde há movimentação para anistia de pessoas condenadas pela tentativa de golpe de Estado em 8 de janeiro de 2023).

“Vivemos um momento em que a memória está sendo apagada como um projeto de poder, então criar memória é extremamente importante”, disse. “A democracia está se tornando frágil em todos os lugares do mundo. Nunca pensei que seria tão frágil mesmo nos Estados Unidos. Portanto, o que aconteceu no Brasil no passado parece muito próximo do nosso presente hoje em dia.”


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