Por Danyel Andre Margarido*
Fala-se muito, e que bom que isso acontece, sobre a cultura da empresa. “A Cultura come a Estratégia no café da manhã”, já dizia Peter Drucker, o pai da Administração. Por outro lado, o primeiro corte nas análises de custos de Mobilidade Global geralmente é na parte da Cultura. É incrivelmente perigoso cortar um dos pilares que sustentam a Mobilidade Global, mas muitas empresas têm dificuldades em entender o grande impacto que a questão cultural tem em toda a jornada da expatriação.
A adaptação de uma pessoa em outro país é parte inerente da Mobilidade Global, mas por que é comum deixar esta parte como algo secundário? Quando se fala em Adaptação Cultural, é possível transmitir ao Negócio sua importância? Ou acaba-se por subscrever a estereótipos (“No Brasil, se come feijoada. Na França, as pessoas se cumprimentam com um beijo na bochecha.”)?
Um dos grandes desafios da área de Mobilidade Global está em usar as ferramentas e o conceito base de adaptação cultural de maneira efetiva e visível para o negócio, e não só como fatos curiosos em meio a conversas da área.
Dentro da Mobilidade Global
A adaptação cultural se destaca como um elemento essencial para o sucesso pessoal e profissional dos expatriados. Desde o impacto inicial de onde a pessoa vai morar com sua família (ou mesmo sozinha), até o novo dia a dia a ser absorvido, compreendido e replicado para uma experiência local nova.
Assim, as políticas que norteiam as decisões da área precisam estar prontas para, não só traduzir a estratégia da empresa em relação à mobilidade, mas também direcionar como os pilares da Mobilidade Global serão estruturados de modo que o profissional (e dependentes) possa ter uma boa experiência, e consequentemente, possam trazer o resultado esperado para o Negócio.
E todo esse processo vai além da simples gestão de fornecedores que tocam as áreas de adaptação cultural.
Mas soma-se a isso o cuidado com a pessoa sendo expatriada, com seus familiares, com os times que estão recebendo o novo profissional, os líderes de origem e destino… E os dados e resultados da jornada. (O que auxilia no debate do Retorno do Investimento feito em mobilidade global, o famoso ROI de Mobilidade Global.). Ainda é necessário equilibrar o alcance do cuidado com o expatriado e sua família — o excesso de cuidado por parte do Advisor e da Empresa pode acabar gerando profissionais míopes em suas funções. A “Babá de Expatriados” cuidando de profissionais mimados, o que requer o equilíbrio e o senso de estratégia que devem ser os maiores amigos do profissional da área.
Assim é mais do que necessário buscar meios que facilitem a adaptação de uma pessoa em outro país, não aprovando exceções ou indo além das estimativas de custo. Entender quem é o expatriado, seu momento de vida, facilitará questões de base — onde prefere morar, já domina a língua do país de destino, está com sua família… — além de dar insights mais profundos da pessoa que está na jornada — quanto tempo de treinamento intercultural poderá ajudar, o que a pessoa espera durante e ao final do processo…
Processos de adaptação
Mas ainda fica a questão: qual o impacto dos processos de adaptação cultural no mundo da Mobilidade Global?
Quem trabalha na área há tempo suficiente vai dizer que é essencial que seus expatriados, e as pessoas que acompanham o profissional, tenham um acompanhamento especializado para a adaptação cultural — o famoso, não tão famoso fora da bolha, treinamento intercultural. A maioria dos profissionais de Mobilidade Global verá o impacto positivo do treinamento durante o assignment do expatriado — mas há um grande abismo entre a visão do profissional da área e o business, responsável pelas entregas do profissional expatriado — e por isso o corte costumeiro vem para essa área.
A melhor navegação do expatriado e da família em situações cotidianas do novo país é vista pelo advisor que guia a jornada da expatriação — facilidade nas relações no país de destino, o dia a dia se tornando mais simples para cada um dos membros da família. Mas essa visão tende a ficar dentro do army-of-one que é a área de Mobilidade Global.
E como traduzir esse impacto, nítido para poucos, em larga escala — até alcançar a visão do negócio?
Talvez seja chegada a hora de mudar o ponto de vista na adaptação cultural. Não é deixar de fazer o que está sendo feito, abandonar tudo que vem sendo feito até agora — principalmente porque está dando certo.
A proposta, dessa forma, é olhar para o lado mais corporativo de uma adaptação cultural. E, não, não é somente um brasileiro chegar no horário em uma reunião com alemães. Mas sim de como a cultura pesa sobre o mundo corporativo no local onde há mais pressão: pessoas. Onde a Mobilidade Global trabalha, e onde pode usar da experiência para se consolidar como estratégico.
Mas sim, como a cultura muda em situações que já são complexas por si só. Como dar um feedback para um funcionário de outra cultura. Como mostrar seus resultados, para uma possível promoção. Como receber um funcionário de outra cultura. Como trabalhar de maneira assíncrona… Perguntas que fazem parte de qualquer carreira — de qualquer área de talentos — mas com o tempero pungente da Mobilidade Global.
Qualificação
Pode ser um pouco desafiador para pessoas que olham para a questão da Cultura de um ponto de vista de entrega, onde o conhecimento cultural é compartilhado de forma que o profissional possa ter uma fácil adaptação, após o horário de trabalho e aos finais de semana. É necessário parametrar o profissional para as questões culturais dentro da empresa — lidar com pessoas, em ambientes estressantes, imersos em culturas e línguas diferentes.
Se todos os profissionais carecem de conhecimento sobre como liderar, como liderar suas próprias carreiras, sobre como balancear vida profissional e pessoal, e tantos outros temas e questões que trazem um peso quase desproporcional nos resultados de qualquer empresa, só que para uma expatriada ou um expatriado em uma nova atmosfera cultural “a brincadeira fica mais séria”.
Importante lembrar: muitas pessoas deixam seus países de origem, e criam raízes em outros países sem o apoio de um especialista, aos trancos e barrancos de uma adaptação cultural baseada em “o que você compra com 10 Euros no mercado aqui em Portugal” e a esperança da qualidade de vida — e ainda assim, alcançam sucesso. Se adaptam, na medida do possível, ao novo país. O ganho de ter um profissional que foque na adaptação cultural está na rapidez em que o expatriado se adapta ao novo cenário.
Assim, não basta somente garantir que o profissional e a família possam se adaptar nas outras partes da vida, que não a corporativa — mas que a pessoa expatriada possa ter uma adaptação cultural completa, holística, e, para tanto, a abordagem de um advisor de Mobilidade Global deve ser completa, atuando, dentro do possível, em todas as facetas da pessoa — não só profissional — expatriada.
Sobre o autor
Danyel Andre Margarido possui mais de dez anos de experiência em Mobilidade Global e Expatriados, atuando como consultor de Global Mobility na EMDOC, e fundador da Altiore Experience. Atualmente no setor de Global Mobility do Prysmian Group, já realizou a movimentação de mais de 2.000 famílias pelo mundo. É formado em Relações Internacionais pela UniFMU, com especialização em Direito Internacional pela Escola Paulista de Direito. Tem MBA em Recursos Humanos, pela Anhembi Morumbi, e um mestrado profissional em Recursos Humanos Internacionais, pela Rome Business School.