Mais uma vez o mundo apresentou aumento no número de pessoas forçadas a se deslocar de seus locais de origem, incluindo aquelas que buscaram abrigo em outro país. Ao final de 2021, eram 89,3 milhões de pessoas nessa condição, sendo 27,1 milhões como refugiadas e 53,2 milhões como deslocadas internas.
Esses dados estão na edição 2021 do relatório Tendências Globais, veiculado na noite de quarta-feira (15) pelo ACNUR (Alto Comissariado da ONU para Refugiados) e disponível no portal da instituição. O número, que representa um crescimento de 8% em relação a 2020, é o maior já registrado pela agência das Nações Unidas dedicada ao tema. O documento é tradicionalmente divulgado nas proximidades de 20 de junho, quando é lembrado o Dia Internacional do Refugiado.
Por considerar apenas o balanço de 2021, esses dados não incluem o impacto gerado pela guerra na Ucrânia, em curso desde fevereiro. Mas uma estimativa feita pelo ACNUR e divulgada em maio aponta que o deslocamento forçado global esteja, atualmente, na casa das 100 milhões de pessoas,projetando um cenário ainda mais sombrio para o final de 2022 e, por consequência, para o próximo relatório.
Além do país europeu, crises humanitárias em países como Afeganistão, Iêmen, Myanmar e Etiópia também contribuem para esse resultado.
Os conflitos armados não são os únicos motivadores do deslocamento forçado interno e da busca por refúgio em outros países. Entre outras causas estão a escassez de alimentos, a crise climática e a inflação, que não raramente incidem ao mesmo tempo sobre diferentes países e regiões inteiras.
De onde vem os refugiados e deslocados
Segundo o relatório do ACNUR, das 89,3 milhões de pessoas em deslocamento forçado no mundo ao final de 2021:
- 27,1 milhões são refugiadas, sendo 21,3 milhões de pessoas refugiadas sob o mandato do ACNUR e 5,8 milhões de pessoas refugiadas da Palestina sob o mandato da UNRWA, uma outra agência da ONU;
- 53,2 milhões de pessoas deslocadas internamente
- 4,6 milhões de solicitantes do reconhecimento da condição de refugiado
- 4,4 milhões de pessoas da Venezuela deslocadas fora do seu país
Em 2019, o MigraMundo destacou os motivos que levaram o ACNUR a incluir a Venezuela em uma categoria diferenciada em seus relatórios sobre deslocamento forçado, apesar da própria agência encorajar a comunidade internacional a reconhecer como refugiados aqueles que deixam o país sul-americano.
Mais de dois terços (69%) das pessoas refugiadas no mundo ao final de 2021 eram procedentes de apenas cinco países: Síria (6,8 milhões), Venezuela (4,6 milhões), Afeganistão (2,7 milhões), Sudão do Sul (2,4 milhões) e Mianmar (1,2 milhão). Neste ano, com o conflito na Ucrânia, cerca de 6 milhões de nacionais do país europeu cruzaram as fronteiras em direção a outras nações e outros 8 milhões de pessoas estão deslocadas internamente.
A Turquia segue sendo o país que abriga a maior população refugiada no mundo, de 3,8 milhões de pessoas refugiadas (basicamente procedentes da vizinha Síria). Ela é seguida por Uganda (1,5 milhão), Paquistão (1,5 milhão) e Alemanha (1,3 milhão). Essa dado reforça outra constante, que 72% das pessoas refugiadas estão em países vizinhos aos seus países de origem.
Também vizinho à Síria, o Líbano abrigava ao final de 2021 a maior população de pessoas refugiadas per capita (em relação aos habitantes do país): uma para cada oito habitantes. Em seguida, vem a Jordânia (uma para cada 14) e a Turquia (uma para cada 23).
Respostas insuficientes
Essa tendência de aumento no deslocamento forçado no mundo, segundo o ACNUR, só será revertida caso a comunidade internacional se mobilize de forma coordenada e decisiva nessa direção.
“Os números subiram em todos os anos da última década. Ou a comunidade internacional se une para enfrentar esta tragédia humana, resolver conflitos e encontrar soluções duráveis, ou esta tendência terrível continuará”, disse o Alto Comissário da ONU para Refugiados, Filippo Grandi, em comunicado à imprensa.
Por outro lado, a despeito de esforços coletivos como o Pacto Global para a Migração, assinado no final de 2018, ações unilaterais de caráter restritivo e discriminatório continuam a ganhar destaque no cenário internacional. Um exemplo é a tentativa do Reino Unido de enviar solicitantes de refúgio para Ruanda, país no sudeste da África, que ao menos por enquanto foi barrada pelo Tribunal Europeu de Direitos Humanos.
Mesmo assim, segundo a agência da ONU, o relatório deste ano traz situações que apontam para caminhos a serem seguidos em direção a uma solução conjunta para lidar com desocados internos e refugiados.
“Enquanto testemunhamos novas e terríveis situações de refugiados simultâneas às já existentes que permanecem ativas e sem solução, também verificamos exemplos de países e comunidades trabalhando juntos para encontrar soluções às pessoas deslocadas”, adicionou Grandi. “Isto tem acontecido em lugares específicos – como a cooperação regional para a repatriação de costa-marfinenses – e essas importantes decisões precisam se replicadas e aumentadas em todos os lugares”, completou o Alto Comissário.