No apagar das luzes de 2021, o governo federal renovou até 30 de abril de 2022 a portaria que prevê acolhimento humanitário para haitianos no Brasil. A normativa anterior vencia em 31 de dezembro e a medida que formaliza o novo prazo foi publicada no Diário Oficial da União do mesmo dia.
A normativa está em vigor desde 2018 e sua renovação era uma demanda tanto da sociedade civil organizada em torno da temática migratória quanto da comunidade haitiana.
Em meados de dezembro, a Defensoria Pública da União e o Ministério Público Federal já haviam recomendado ao governo brasileiro a renovação da medida por pelo menos mais um ano.
A prorrogação do prazo de vigência da acolhida humanitária, por um lado, foi comemorada pela sociedade civil. No entanto, chamou a atenção o prazo mais curto que o das portarias semelhantes anteriores, que ampliavam a vigência por pelo menos um ano.
“Isso é algo que deverá ser alvo de incidência da sociedade civil para questionar o porquê desse prazo ser tão curto. Não entendi qual foi o critério usado pelo governo”, apontou Adriano Pistorelo, advogado do Centro de Atendimento ao Migrante de Caxias do Sul (RS).
Consenso internacional
Na recomendação enviada ao governo federal, os defensores partiram dos princípios presentes na legislação migratória brasileira, que prevê a acolhida humanitária para pessoas procedentes de países em situação de grave ou iminente instabilidade institucional, de conflito armados, de calamidade de grande proporção, entre outros elementos. O Haiti, no caso, conta com alguns desses fatores ativos ao mesmo tempo.
Os defensores apontaram ainda a existência de um consenso internacional sobre a instabilidade generalizada no Haiti, como a disputa entre gangues, o assassinato do presidente Jovenel Moïse e um novo terremoto. E que essa situação precária justificaria a prorrogação da acolhida por pelo menos mais um ano — ao contrário do que ocorreu na prática.
Caso a portaria não fosse renovada, os defensores públicos afirmaram que isso pioraria um cenário que já se agravou nos últimos dois anos, com as portarias que restringiram o acesso ao país de pessoas que chegam do exterior em razão da pandemia de Covid.
Haitianos no Brasil
Ao lado dos venezuelanos, os haitianos protagonizaram os principais fluxos migratórios em direção ao Brasil ao longo dos últimos anos.
Dados do Observatório de Migrações Internacionais (OBMigra) indicam que, entre 2010 e 2015, cerca de 70 mil haitianos vieram para o Brasil. O país, que por 13 anos chefiou a missão das Nações Unidas criada para atuar no Haiti, se tornou uma espécie de referência e uma opção para haitianos que buscavam melhores condições de vida – especialmente após o terremoto de janeiro de 2010.
A chegada dos haitianos se dava por via aérea, mas sobretudo por uma rota que passava por outros países da América Central e do Sul antes do ingresso no território brasileiro, por meio da tríplice fronteira do Estado do Acre com Peru e Bolívia.
A tentativa de gerenciar esse fluxo levou à criação do visto humanitário, em 2012, mais tarde incorporado à Lei de Migração, que substituiu o Estatuto do Estrangeiro e entrou em vigor no final de 2017. Em abril de 2018 foi publicada a Portaria Interministerial Nº 10, sobre a concessão de visto temporário e de autorização de residência para fins de acolhida humanitária para cidadãos haitianos e apátridas residentes no Haiti – que é justamente o que a DPU pede a renovação.
Por outro lado, o cenário de estagnação econômica no Brasil, agravado pela pandemia de Covid-19, levou parte dos haitianos que chegaram ao Brasil a migrar novamente para outros países do continente, inclusive para os Estados Unidos.
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