A comunidade migrante de São Paulo foi às ruas no centro de São Paulo na tarde desta quinta-feira (25). O motivo foi a morte do senegalês Serigne Mourballa Mbaye na noite de terça-feira (23), após uma ação da Polícia Militar em um prédio na região central.
O protesto teve concentração na Praça da República, ponto tradicional de atuação de imigrantes – especialmente de países africanos – que trabalham como vendedores ambulantes. De lá, o grupo saiu em caminhada até o edifício-sede da Secretaria de Segurança Pública de São Paulo, onde dois representantes foram recebidos pelas autoridades.
A manifestação reuniu pouco mais de cem pessoas, de acordo com cobertura do jornal Folha de S. Paulo. Já os participantes estimam uma adesão de cerca de mil pessoas.
Durante a reunião, de acordo com a Ponte Jornalismo, foi cobrada investigação sobre a morte de Talla e uma postura menos hostil da PM com a comunidade africana em São Paulo. Há relatos recorrentes de abusos cometidos pelas forças policiais contra os imigrantes que trabalham na região central.
“Falamos para ele que sofremos violência policial no Brás e na Guaianases quando estamos trabalhando. Agora, esperamos uma resposta”, disse Mame Balla Niang à Ponte.
“Há muito tempo nossos direitos são violados em São Paulo e outras regiões do Brasil. A polícia nos prende injustamente, nos criminaliza e nos trata de forma desumana. Seguiremos lutando por justiça e para que o direito à vida, ao trabalho e ao bem viver seja uma política nacional para os povos imigrantes”, disse o artista senegalês Kara Modou, amigo de Talla. Ele esteve na manifestação e compartilhou fotos e vídeos diversos em suas redes sociais, incluindo este relato.
Além de representantes da comunidade senegalesa, participaram da manifestação imigrantes de outras nacionalidades, representantes do Conselho Municipal de Imigrantes (CMI) de São Paulo e movimentos sociais, além do deputado estadual Eduardo Suplicy (PT).
O caso também está sendo acompanhado pelos mandatos da vereadora Luana Alves (PSOL) na Câmara Municipal de São Paulo e da Bancada Feminista na Assembleia Legislativa paulista.
“Ambulantes de várias regiões do Centro, brasileiros e estrangeiros, estão há meses denunciando o terror da repressão policial e o racismo. Como vice-presidente da Comissão de Direitos Humanos da Câmara, acionei a Corregedoria da PM e o Ministério Público. Vamos até o fim defender os trabalhadores da repressão”, afirmou a vereadora, por meio das redes sociais.
Quem era Serigne Mourballa Mbaye
Também conhecido como Talla Mbaye, o senegalês morava no Brasil desde 2013. Segundo um amigo, ele morou na região sul por cerca de dois anos antes de se mudar para a capital paulista. Talla tinha dois filhos, frutos do casamento com uma imigrante de Cabo Verde.
Tanto a mulher quanto as crianças migraram para os Estados Unidos, para onde Talla enviava dinheiro fruto de seu trabalho como vendedor de roupas.
Reportagem do portal Metrópoles destacou que que Talla era uma pessoa bem conhecida do local onde morava, além de ser calmo e dedicado, e que tinha medo da polícia. Ele também tinha o costume de ir às sextas-feiras à mesquita localizada no bairro de Campos Elíseos distribuir pães para pessoas em situação de rua e demais imigrantes.
Ao portal Ponte Jornalismo, o também senegalês Junior Diop, amigo de Talla, recordou que o vendedor gostava de apreciar a música e a culinária da terra natal, além de ficar junto aos compatriotas aos fins de semana.
Além da busca por justiça, os amigos de Talla também se unem para conseguir o translado do corpo para ser sepultado no Senegal.
Entenda o caso
Na noite de terça-feira, policiais militares entraram em um apartamento no sexto andar do edifício Japurá, na rua Guaianases. Segundo informações da Polícia Civil, o local já apareceu em investigações como um local de receptação de celulares roubados e furtados. Durante a ação, os policiais prenderam um outro homem, de 32 anos, que foi detido no 6º andar com 44 aparelhos.
Segundo a versão dos PMs, diante da presença policial no prédio, o senegalês teria pulando pela marquise em uma tentativa de fuga. Ao jornal Folha de S. Paulo, a SSP afirmou por meio de nota que os policiais militares foram acionados para atender a uma ocorrência de uma pessoa que caiu de um prédio e, durante o socorro prestado pelo Corpo de Bombeiros, houve um tumulto após algumas pessoas investirem contra os agentes.
Já os moradores do local negam que Talla estivesse envolvido com essa prática. A versão da polícia também é contestada pelos imigrantes, que suspeitam que o senegalês tenha sido jogado pela janela. Moradores relataram ter ouvido o som de um corpo caindo no chão, seguido por comentários de PMs, como “o lixo caiu” e “o lixo foi jogado”.
A morte de Mbaye revoltou residentes locais e outros migrantes, que lançaram objetos contra os policiais. Em resposta, os agentes utilizaram balas de borracha e gás lacrimogênio. Os PMs entraram no local sem mandado judicial.
Repercussão
Além do protesto no centro de São Paulo, a morte de Talla motivou manifestações de repúdio à ação da Polícia Militar, tanto de movimentos sociais quanto de outras pessoas e grupos envolvidos com a temática migratória.
“Tomei conhecimento sobre o trágico falecimento do jovem imigrante senegalês Talla Mbaye, ocorrido nesta terça-feira, após cair de um prédio na região central de São Paulo. Manifesto minha profunda solidariedade aos familiates, amigos e `\ comunidade senegalesa neste momento de dor. É fundamental que as cirrcunstâncias desse acidente sejam investigadas e esclarecidas com todo o rigor da lei”, disse o coordenador-geral de Política Migratória do Ministério da Justiça e Segurança Pública (MSJP), Paulo Illes.
A Embaixada Solidária, organização de apoio a imigrantes que fica em Toledo (PR), também se manifestou. “A Embaixada Solidária manifesta seu luto e repúdio pela morte de Mourtalla Mbaye. Ele morreu ao ser jogado de um prédio em São Paulo. Com família e amigos na Região Oeste [do Paraná, onde fica Toledo], sua morte representa a brutalidade e a crueldade da xenofobia. Declaramos luto oficial e nos unimos à comunidade senegalesa que vive no Brasil”.
Também pelas redes sociais, a influenciadora senegalesa-brasileira Fatou Ndiaye também clamou por justiça. “A violência policial contra os africanos em geral e os senegaleses em particular tornou-se recorrente em SP.
A nossa comunidade repudia com todas as forças e todas energias a violência da polícia de Tarcísio. Quremos Justiça por Talla!”
Com informações de Ponte Jornalismo, Metrópoles e Folha de S. Paulo