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sexta-feira, junho 13, 2025

Mães haitianas enfrentam insegurança jurídica no Brasil e esperam há mais de um ano por visto para reunião familiar

Por Coletivo Cio da Terra

Mesmo com pedidos de reunião familiar deferidos pelo governo federal, mulheres haitianas seguem sem respostas da Embaixada do Brasil no Haiti. Coletivos denunciam violência institucional e apontam a urgência de soluções diante da crise humanitária no país caribenho.

O Coletivo de Mulheres Migrantes Cio da Terra denuncia a situação de dezenas de mães haitianas que vivem no Brasil com residência regular e enfrentam a morosidade e a ausência de respostas do Estado brasileiro para concretizar o direito à reunião familiar com filhos e filhas que permanecem no Haiti.

Esse é o caso de Marie Odette Jules, mulher negra, haitiana e mãe solo, residente no Brasil desde 2018. Ela tenta desde 2020, sem sucesso, trazer seu filho adolescente para viver ao seu lado em Belo Horizonte (MG). Mesmo com a autorização de residência para reunião familiar deferida pelas autoridades brasileiras desde novembro de 2023, após anos de trâmites administrativos e judiciais, o Estado brasileiro ainda não autorizou o reencontro dessa família.

O caso de Marie Odette evidencia uma violência institucional grave e persistente, que afeta outras várias famílias haitianas. A Embaixada do Brasil em Porto Príncipe, Haiti, onde o visto deve ser solicitado, está fechada desde 2023 por razões de segurança, e o setor consular informa que há mais de 10 mil pedidos de visto na fila, com previsão de atendimento para 2026 — no caso de Marie Odette, três anos após o pedido ser aceito oficialmente.

A situação é agravada pelo colapso institucional no Haiti, país que enfrenta uma grave crise humanitária marcada por fome, deslocamentos forçados, controle territorial por milícias armadas e o esfacelamento dos serviços públicos. Trata-se de um cenário reconhecido por organismos internacionais como um dos mais críticos do continente americano.

“A fila na Embaixada do Brasil no Haiti permanece estagnada, sem qualquer plano de contingência para agilizar a emissão de vistos a crianças e adolescentes haitianos em situação de extrema vulnerabilidade e afastados de suas mães. O caso de Marie Odette segue judicializado em Belo Horizonte, atualmente aguardando decisão em segunda instância no TRF6, mesmo com parecer favorável do Ministério Público. A morosidade do Judiciário, somada ao hermetismo do Itamaraty e à burocracia federal, impede a efetivação do direito à convivência familiar. Um Brasil que se diz acolhedor, mas não acolhe os filhos das mães haitianas”, comenta Catalina León Amaya, ativista colombiana e integrante do coletivo de mulheres migrantes Cio da Terra e da Coletiva de Mulheres em Migração pela Paz – MeMiPaz.

Judicialização

Em meio a esse contexto, a Defensoria Pública da União (DPU) acionou o Judiciário solicitando a dispensa da exigência de visto para haitianos que já tiveram o pedido de reunião familiar deferido pelo Ministério da Justiça, com base na Portaria nº 38/2023. A medida visa garantir o direito à convivência familiar, conforme previsto na Constituição Federal e em tratados internacionais dos quais o Brasil é signatário, como a Convenção sobre os Direitos da Criança e o Pacto de San José da Costa Rica.

Como explicado pela advogada, professora e pesquisadora Juliana Cesario Alvim, quem coordena a Clínica de Direitos Humanos da Universidade Federal de Minas Gerais (CDH/UFMG), recentemente o Supremo Tribunal Federal (STF) autorizou a entrada no Brasil, sem necessidade de visto, de uma adolescente haitiana cujos pais já moram legalmente no país. A decisão reconheceu que a demora da administração pública em analisar o pedido de entrada não pode impedir a reunião familiar, especialmente diante da situação de extrema calamidade no Haiti.

Nesse contexto, coletivos e organizações de migrantes denunciam que, na prática, o Estado brasileiro tem falhado em garantir esse direito a famílias negras, migrantes e pobres, reiterando padrões históricos de racismo institucional, xenofobia e seletividade no acesso à cidadania plena.

“Que maternidade o Estado brasileiro está disposto a proteger? O caso em questão não é isolado. Estamos diante de uma política migratória que, na prática, falha sistematicamente em atender mulheres migrantes, negras e pobres. O que está em jogo é o reconhecimento do direito à maternidade para essas mulheres. Elas têm seus laços familiares desfeitos pela burocracia e pela negligência institucional”, afirma Laura Queslloya, coordenadora do coletivo Cio da Terra e ativista peruana.


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