V Seminário Vozes e Olhares Cruzados trouxe relatos de migrantes sobre o mercado de trabalho e foi palco do lançamento de campanha internacional
Por Rodrigo Borges Delfim
Colaboração de Amanda Rossa
Em São Paulo (SP)
Além de barreiras físicas, os migrantes rompem outros tipos de fronteira – culturais, sociais, preconceitos, entre outras – quando se deslocam em busca de melhores condições de vida.
Essas transformações que ocorrem para cada migrante – e para as sociedades onde vivem – foram o tema do V Seminário Vozes e Olhares Cruzados – Rompendo Fronteiras, Trabalhando pela Vida, que aconteceu na última terça-feira (10) no auditório da Missão Paz, em São Paulo. O evento teve como ponto de partida os testemunhos dos próprios migrantes sobre como cada um tem enfrentado as dificuldades no mercado de trabalho.
“Quando pensamos no lema do evento, procuramos pensar nas diversas fronteiras que os migrantes cruzam, não apenas as barreiras físicas”, conta o padre Paolo Parise, um dos diretores da Missão Paz.
O seminário, organizado pela instituição desde 2012, contou neste ano com o apoio da Fundación Avina e do MigraMundo. Além dos relatos dos migrantes, o evento foi palco de lançamento da campanha Migração – Movimento que Transforma, organizada pela Avina e que fala das transformações positivas que a migração gera em meio à sociedade, além de rebater uma série de estereótipos associados à temática migratória (veja mais a seguir).
O evento também teve transmissão online o vídeo está disponível abaixo e também no perfil da Missão Paz no Facebook.
“Estar aberto a coisas novas”
O seminário começou com uma mesa formada por seis migrantes de cinco países – Haiti (2), Venezuela, Angola, Togo e Síria – que falaram sobre as barreiras já rompidas ou que ainda tentam superar no Brasil, do idioma ao preconceito, passando pela reinvenção profissional em meio à dificuldade para exercer sua atividade original no país.
“Em qualquer país do mundo, se você se fecha, é muito mais difícil. Devemos estar abertos a fazer e aprender coisas novas” relata Carlos Escalona, da Venezuela, apesar de admitir a frustração de não conseguir ainda exercer sua profissão no Brasil. Jornalista de formação e também músico, chegou no ano passado ao país e atualmente trabalha como ajudante de cozinha em um hotel próximo à avenida Paulista. Para o futuro, pensa em ter um negócio próprio.
A reinvenção profissional também é uma realidade para a síria Razan Suliman, que além de participar da mesa de abertura também foi responsável pelo coffee break do evento. Dona de casa na Síria, começou a cozinhar para os vizinhos do prédio onde mora em São Paulo e conseguiu abrir uma microempresa (Razan Comida Árabe) pela qual comercializa pratos e petiscos árabes. Sobre os planos para o futuro, ela é direta. “Quero abrir meu restaurante”.
Já a angolana Cristina Dipa, que fez curso de cuidadora e hoje trabalha como balconista, conseguiu a vaga com ajuda da Missão Paz, através do programa de mediação que a instituição faz entre empregadores e migrantes. “Fui escolhida entre 50 pessoas”, comemora Cristina, que relatou ter sofrido com racismo no Brasil e se emocionou ao fazer seu relato.
Ao final da mesa, os participantes posaram com braços abertos em apoio à campanha mundial Compartilhe a Viagem (#compartilheaviagem ou #sharejourney ), lançada recentemente pela Cáritas (saiba mais aqui).
Encarar os preconceitos de frente
Em sintonia com o objetivo de romper barreiras que impedem um melhor entendimento das migrações, a segunda parte do seminário abrigou o lançamento oficial da campanha internacional Migração – Movimento que Transforma. Focada no contexto sul-americano, ela busca esclarecer e desmistificar os preconceitos e pós-verdades que envolvem a temática migratória no continente, ao mesmo tempo que mostra as transformações e benefícios que a migração é capaz de trazer para a sociedade como um todo.
Clique aqui para acessar a página da campanha
A campanha, disponível em português e espanhol, é conduzida no Brasil pela Fundación Avina em parceria com a Missão Paz e conta também com o apoio formal do MigraMundo. O material foi produzido em conjunto pelas agências Social Docs e Espiral Interativa.
Assim como o Vozes e Olhares Cruzados, a campanha é baseada em relatos de migrantes sobre suas realizações, dificuldades e sonhos. “Assim como o Vozes, esta é uma campanha de rostos. Partimos do mesmo princípio. É uma campanha aberta para ser compartilhada. Deixamos uma semente que a gente espera que se multiplique”, conta Ofélia Ferreira, coordenadora do programa de migrações para América do Sul da Fundación Avina.
A campanha tem ainda uma seção de mitos e verdades, destinada justamente a derrubar estereótipos em geral associados às migrações e aos migrantes. “Precisamos olhar de frente esse fenômeno e desconstruir essa xenofobia”, complementa Ofélia.
A campanha deve ser lançada no Chile ainda em novembro e a expectativa é que aos poucos ela possa ser levada a outros países sul-americanos.