Por Rodrigo Borges Delfim
Com colaboração de Géssica Brandino e Eva Bella
São Paulo deve à migração grande parte de seu dinamismo cultural e social. E esses elementos apareceram mais uma vez no aniversário de 462 anos da cidade, na última segunda (25), com um festival protagonizado por imigrantes e refugiados.
São Paulo Sem Fronteiras foi o tema da nona edição do Conexão Cultural, evento promovido anualmente no MIS (Museu da Imagem e do Som) e que desta vez foi organizado em conjunto com o GRIST (Grupo de Refugiados e Imigrantes Sem Teto), BibliASPA (Biblioteca e Centro de Pesquisa América do Sul-Países Árabes), MSTC (Movimento dos Sem Teto do Centro de São Paulo) e Associação Raso da Catarina.
“São Paulo não podia comemorar seu aniversário sem um grande evento com imigrantes e refugiados. Nada mais incrível aqui do que essa presença e que nos dá força para praticar a diversidade e perceber o quão belo é isso”, lembrou Paulo Farah, diretor da BibliASPA.
Mesmo sob forte calor, o festival lotou o MIS durante toda a tarde e se estendeu até as 22h com uma série de atrações musicais, de dança, arte e gastronomia de países como Haiti, Congo, Senegal, Togo, Palestina, Síria, entre outros. Em meio ao público, estimado em 2.500 pessoas pelo MIS, era possível ouvir tanto português como inglês, árabe, francês, espanhol e outros idiomas.
“Quando o refugiado sai do seu país ele deixa tudo por lá, mas traz consigo sua cultural. E nosso objetivo aqui é compartilhar essa cultura com vocês”, resumiu o congolês Pitchou Luambo, coordenador do GRIST.
A renda obtida com o festival será totalmente revertida para os próprios imigrantes que integraram o evento. E em breve deverão ser organizados novos festivais promovidos por imigrantes e refugiados na capital paulista.
Oficinas diversas
Quem participou do evento também pode conferir painéis artesanais que retratam a história de mulheres refugiadas que vivem na Casa de Passagem Terra Nova, mantida no centro de São Paulo pelo governo estadual. A mostra “Refugiadas e arpilleras” foi desenvolvida com base na técnica têxtil surgida no Chile na década de 70 e que permitiu às mulheres retratar cenas do cotidiano em meio à ditadura militar.
Confeccionadas com juta, lã e pedaços de tecido durante oficinas sob orientação da arte-educadora Adriana Nalin. Um dos painéis levou quatro meses para ser produzido por quinze mulheres, que juntas elaboraram o retrato da união de pessoas de diferentes nacionalidades em torno da Terra. Em outro, mulheres sírias e africanas retrataram seus locais de origem. Em uma das imagens, o letreiro escrito em árabe dizia: “Damasco no coração de São Paulo”.
Também ocorreram oficinas de caligrafia árabe, turbantes e dança africana e também de animação. Nessa última, o refugiado sírio Salim Mhanna ensinou os participantes do workshop a produzirem um projeto de animação no After Effects. Auxiliado pela tradução de um voluntário da BibliASPA, o professor Salim deu instruções sobre os comandos necessários e explicou os princípios básicos da animação.
Hoje refugiado, Salim é formado em antropologia visual pela Faculdade de Belas Artes de Damasco e tem 15 anos de experiência na produção audiovisual. Na terra natal, ele ajudava refugiados que viviam no país. No Brasil, ele busca uma oportunidade de trabalho que permita exercer a formação que tem e, dessa forma, manter a família, agora integrada pelo filho brasileiro Carlos, nascido há poucos meses.
Impressões do público
Para o estudante de filosofia José Alves, que trabalha com educação para prevenção ao câncer de mama, o festival mostra um lado da questão migratória que costuma ficar longe da cobertura dos grandes meios de comunicação. “A partir do momento que a gente passa a ver essas pessoas marcando presença aqui em São Paulo, ajuda a desmistificar as visões que temos sobre locais como a África, sobre nossa própria cultura”.
Já as figurinistas Alice Alves e Andréia Santana se queixaram de desorganização nas barracas de alimentos e esperavam um pouco mais da oficina de turbantes, oferecida durante o festival: “Faltou dizer de onde era, de que região era cada um dos turbantes, explicar melhor como funciona”, concordaram ambas.
O casal Cícero (33) e Míriam (29), que levou a filha Sophia (1) no evento, teve opinião diversa e elogiou a atividade como um todo. “Foi bem organizado, com ótimas apresentações musicais, só lamentamos não poder ter chegado mais cedo”.
Exposição fotográfica até dia 31
Além das atrações musicais, gastronômicas e das oficinas ao longo do dia 25, o MIS mantém até o dia 31 a mostra fotográfica Refugiados Eu Me Importo, feita a partir da convocatória feita nas redes sociais pelo Conexão Cultural e pelo GRIST.
Usando a hashtag #conexaomis, o público foi convidado a compartilhar fotos nas redes sociais que expressassem apoio aos refugiados e imigrantes que vivem no Brasil. As melhores imagens foram expostas no espaço Foyer do museu.
Este não foi o primeiro evento ligado à temática migratória que aconteceu recentemente no MIS. Em novembro passado o museu recebeu a exposição “Somos Todos Imigrantes“, do fotógrafo Chico Max, que depois passou por outros locais de São Paulo e atualmente está na estação Luz do metrô – até dia 31 de janeiro.
Parabéns a todos pela programação e união de tantas pessoas, equacionando a distinção, diversidade e igualdade cultural!